Entidades de imprensa, jornalistas e políticos repudiaram nesta quarta-feira (12/02) as acusações feitas contra a repórter Patrícia Campos Mello, do jornal Folha de S. Paulo, durante a comissão parlamentar mista de inquérito (CPMI) das fake news no Congresso.
Em depoimento prestado aos parlamentares da comissão na terça-feira, Hans River do Rio Nascimento, ex-funcionário da empresa de marketing digital Yacows, proferiu insultos contra a jornalista e fez uma série de declarações logo desmentidas pela Folha.
River foi convocado à CPMI para esclarecer o envio em massa de mensagens pelo Whatsapp durante a campanha eleitoral de 2018. O caso foi revelado pelo jornal paulista em reportagens publicadas em dezembro daquele ano, sendo Campos Mello uma de suas autoras.
Segundo a Folha, a Yacows, agência em que River trabalhava, é uma das empresas que recorreu ao uso fraudulento de dados pessoais de idosos para registrar chips de celular e, com isso, disparar mensagens em massa para beneficiar certos políticos.
Ao apurar a história, Campos Mello entrou em contato com River diversas vezes para saber sobre os disparos. À época, ele movia uma ação trabalhista contra a Yacows.
River chegou a responder a perguntas feitas pela reportagem, em novembro de 2018, até mudar de ideia após fazer um acordo trabalhista com sua antiga empresa. “Pensei melhor, estou pedindo pra você retirar tudo que falei até agora, não contem mais comigo”, disse ele em mensagem à jornalista, segundo capturas de tela publicadas pela Folha.
Nesta terça-feira, em depoimento à CPMI das fake news, que apura disseminação de notícias falsas durante a eleição, River afirmou, entre outras acusações, que Campos Mello teria se insinuado sexualmente para ele em troca de informações para a reportagem.
“Quando eu cheguei na Folha de S. Paulo, quando ela [repórter] escutou a negativa, o distrato que eu dei e deixei claro que não fazia parte do meu interesse, a pessoa querer um determinado tipo de matéria a troco de sexo, que não era a minha intenção, que a minha intenção era ser ouvido a respeito do meu livro, entendeu?”, disse River.
O jornal afirma, porém, que Campos Mello nunca se insinuou ao entrevistado e, na verdade, foi ele quem a convidou para ir a um show, mas ela não respondeu à mensagem e não foi ao evento. A declaração de River foi mais tarde reforçada pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), que aproveitou para disparar uma série de ataques contra a jornalista no plenário da Câmara e nas redes sociais.
“Eu fiquei aqui perplexo de ver, mas eu não duvido, que a senhora Patrícia Campos Mello, jornalista da Folha, possa ter se insinuado sexualmente, como disse o senhor Hans, em troca de informações para tentar prejudicar a campanha do presidente Jair Bolsonaro”, disse o filho do presidente.
Em nota, a Folha de S. Paulo disse repudiar os ataques proferidos por River e por Eduardo e, em um artigo extenso publicado em seu site, rebateu cada uma das acusações contra seu jornalismo, bem como desmentiu algumas afirmações feitas pelo depoente durante a CPMI.
“O jornal está publicando documentos que mais uma vez comprovam a correção das reportagens sobre o uso ilegal de disparos de redes sociais na campanha de 2018. Causam estupefação, ainda, o Congresso Nacional servir de palco ao baixo nível e as insinuações ultrajantes do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP)”, escreveu o jornal.
“A ilação de que a jornalista teria sugerido a troca de matéria por sexo causa danos a ela, não apenas porque se trataria de um desvio de natureza ética da profissão como também por atingir sua condição feminina”, afirmou Taís Gasparian, advogada da Folha.
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) também se manifestou, chamando de “machistas e misóginas” as ofensas proferidas contra Campos Mello que, segundo a entidade, “é uma das mais respeitadas jornalistas do país”.