Quando era apenas líder do PT, o deputado Lula cunhou uma frase que atravessou governos — o dele, inclusive: “No Brasil, quando um pobre rouba vai pra cadeia, mas quando um rico rouba vira ministro”.
De lá para cá, a estrutura social e os governos mudaram pouco, mas um fato é inegável: nunca antes na história desse país houve tantos ricos e famosos atrás das grades.
O último a ir parar na prisão foi Eike Batista, que, segundo estimativas, ainda teria patrimônio de cerca de R$ 200 milhões (em 2011, eram R$ 100 bilhões). Em Bangu, é vizinho de Sérgio Cabral, cuja fortuna é difícil de estimar (fala-se em US$ 10 milhões em ativos, inclusive ouro e diamantes depositados na Suíça, mas isso é só uma parte).
Quem também esteve brevemente em Bangu foi André Esteves, que ainda hoje desfruta de um patrimônio em torno de R$ 6,5 bilhões. Mas o presidiário mais rico do Brasil é Marcelo Odebrecht, cuja família tem patrimônio estimado em R$ 12, 9 bilhões.
Será que essas prisões todas significam que a lei, finalmente, tem alcançado ricos e pobres com o mesmo peso? “Não tenho dúvidas que esses são marcos que serão lembrados”, diz Adriano Ferreira, doutor em Sociologia do Direito. Para ele, o perfil do Judicário está mudando.
“Hoje, temos uma maioria de mulheres ingressando nas funções de juiz. E esse é só um recorte. E mais pessoas de classe social mais baixa apelando à Justiça em busca da defesa de seus direitos”.
O índice de confiança do Judiciário é baixo (29%), segundo uma pesquisa do Conselho Nacional de Justiça, mas muitíssimo maior do que o da Presidência (11%) e o do Legislativo (10%).
Para Ferreira, a falta de credibilidade de outros poderes redireciona o foco para o Judiciário. “Os juízes estão respondendo a isso com uma atuação mais severa em relação a casos de corrupção e outros crimes praticados por pessoas de posses”, diz Ferreira.
“Mas ainda há um longo caminho. O juiz vem da classe média e se identifica com quem vem desse mundo. O negro, o favelado, é um estranho. É mais difícl ter empatia”, diz ele.
André Augusto Salvador Bezerra, presidente da Associação Juízes para a Democracia, discorda. “Os casos desses ricaços são exceções que confirmam a regra. Para perceber isso, basta ver quem está nas imagens das rebeliões de presídios”.
Membro da Comissão Nacional dos Direitos Sociais da Ordem dos Advogados do Brasil, Sergio Batalha admite que há “a quebra de uma regra não escrita” com a ida de ricos para a cadeia. “Mas essas prisões envolvem alguns interesses políticos”, ressalta.
E não deu em nada mesmo
Christiane Ferraz Magarinos foi condenada, em maio de 2015, a pagar R$ 52 mil e cumprir pena de três anos e 25 dias de prisão pelos crimes de resistência, desobediência, desacato e corrupção ativa.
Christiane tinha sido presa, dois anos antes, após furar uma blitz da Lei Seca na Praia do Flamengo. Perseguida pela polícia, ela teria tentado subornar os policiais e dito que o caso não daria em nada “porque ela tinha dinheiro e influência” e que “nesse país só pobre ou favelado fica preso”.
Na terça-feira passada, a profecia de Christiane se confirmou. Após apelar, ela foi absolvida por unanimidade pelos desembargadores do Tribunal de Justiça. Segundo o advogado da comerciante, Márcio Feijó, ficaram comprovadas contradições no depoimento de um dos policiais. “A gente sabe como nessas blitz, os policiais crescem”, disse.
André Bezerra, da Associação Juízes pela Democracia, diz que “a desigualdade do país se reflete na Justiça”.
“O problema não é o rico ter acesso a recursos; a questão é o pobre não poder usufruir desse direito. Essa realidade está longe de mudar, mesmo com esses milionários presos”.
// Agência BR