Decisão foi comunicada pela AGU no dia em que o Supremo Tribunal Federal votaria se o presidente teria o direito de depor por escrito no inquérito que apura sua suposta interferência na Polícia Federal.
O Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou nesta quarta-feira (06/10), em plenário, que o presidente Jair Bolsonaro manifestou interesse em depor presencialmente no inquérito que apura sua suposta interferência na Polícia Federal (PF).
A decisão foi comunicada ao STF pela Advocacia-Geral da União (AGU) no dia em que o Supremo poderia decidir se Bolsonaro seria autorizado a depor por escrito. Com isso, a pedido do ministro Alexandre de Moraes, relator do inquérito, foi retirado da pauta do STF o julgamento de um recurso que havia sido apresentado pela AGU contra o depoimento presencial.
O ministro Luiz Fux, presidente do Supremo, chegou a colocar o tema em pauta nesta quarta, antes de Moraes anunciar o novo posicionamento de Bolsonaro e afirmar que deve avaliar se o recurso da AGU ainda pode ser julgado. A decisão do STF sobre o formato do depoimento poderá ser eventualmente aplicada em outros inquéritos.
Bolsonaro também pediu para decidir local, dia e hora em que será ouvido. Segundo a AGU, essa prerrogativa é compatível com o exercício das funções de chefe de Estado e o seu direito de defesa.
Acusações de Moro
Em julho, Moraes determinou que a Polícia Federal retomasse o inquérito que apura a suspeita de interferência de Bolsonaro na PF. As investigações foram abertas em 2020,a partir de acusações do ex-ministro da Justiça Sergio Moro.
No despacho, Moraes ressaltou que a retomada do inquérito não precisava aguardar uma definição do plenário do STF sobre a forma como o depoimento de Bolsonaro no caso deveria ocorrer.
O inquérito estava paralisado desde 17 de setembro de 2020, devido à indefinição sobre o depoimento de Bolsonaro. Na ocasião, o ministro Marco Aurélio Mello suspendeu a investigação até que o plenário do STF decidisse se Bolsonaro teria ou não o direito de depor por escrito, em vez de presencialmente.
Em dezembro de 2020, Moraes decidiu que o presidente Bolsonaro não pode desistir de prestar depoimento. Na mesma decisão, o ministro do STF também negou um pedido da AGU para encerrar as investigações contra o presidente.
A relatoria do inquérito passou para Moraes após aposentadoria do ministro Celso de Mello, em outubro de 2020. Moraes também é relator de outros dois inquéritos que têm figuras do círculo de Bolsonaro como alvo. Um envolve os atos antidemocráticos organizados e estimulados por aliados do presidente no ano passado. O outro é o chamado inquérito das “fake news”, que investiga uma rede de propagação de ataques contra ministros do STF e adversários do bolsonarismo.
O caso
O inquérito sobre a suposta interferência de Bolsonaro na PF foi aberto em abril de 2020, após Moro pedir demissão do Ministério da Justiça e lançar acusações contra o presidente. Segundo o ex-juiz, Bolsonaro decidiu trocar a chefia da Polícia Federal, à época comandada por Maurício Valeixo, para ter acesso a informações de inquéritos sobre a família dele.
Valeixo foi exonerado da chefia da PF em 24 de abril. Na véspera, Moro havia dito a Bolsonaro que não ficaria no ministério se o diretor-geral fosse afastado, e acabou pedindo demissão na mesma data. À época, o ex-ministro afirmou que não assinou a exoneração de Valeixo e que ficou sabendo dela pelo Diário Oficial. Ele também já havia declarado que Valeixo não pediu para deixar o cargo, como Bolsonaro chegou a alegar.
Ao anunciar sua renúncia, o ex-juiz acusou o presidente de tentar interferir na Polícia Federal ao cobrar a troca da direção-geral, bem como a do comando da Superintendência no Rio de Janeiro. As declarações acabaram levando à abertura da investigação pelo Supremo em 28 de abril. Bolsonaro nega as acusações.
Tanto o presidente quanto Moro são investigados na ação, que apura se Bolsonaro de fato tentou interferir na PF, ou se o ex-ministro da Justiça mentiu em suas alegações.
Em depoimento ao Supremo, Moro apontou que uma reunião ministerial realizada em 22 de abril serviria de prova contra Bolsonaro no caso, e Celso de Mello acabou tornando pública a gravação do encontro em maio de 2020, gerando fortes repercussões no meio político pelo teor das conversas.
As imagens mostraram que o presidente estava insatisfeito com a Polícia Federal e revelaram desejos de Bolsonaro de proteger seus filhos, irmãos e amigos. Bolsonaro afirma que estava apenas preocupado com a segurança física de seus familiares, mas as imagens do encontro enfraquecem a versão do presidente.
“Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro oficialmente e não consegui. Isso acabou. Eu não vou esperar f… minha família toda de sacanagem, ou amigo meu, porque eu não posso trocar alguém da segurança na ponta da linha que pertence à estrutura. Vai trocar, se não puder trocar, troca o chefe dele; não pode trocar o chefe, troca o ministro. E ponto final. Não estamos aqui para brincadeira“, disse Bolsonaro na reunião.