Um tratamento inovador, com recurso a neurotecnologia, permitiu que três pacientes com paralisia total nas pernas voltassem a andar. O recurso a um implante wireless que estimulou eletricamente suas medulas espinhais possibilitou o “milagre”.
Os cientistas suíços Grégoire Courtine e Jocelyne Bloch, do Hospital Universitário de Lausanne (CHUV) e da Escola Politécnica Federal de Lausanne (EPFL), divulgaram os resultados desse tratamento inovador em um artigo científico publicado na Nature.
Depois de alguns meses de treino, os três pacientes que apresentavam lesões crônicas da medula espinhal há mais de quatro anos, com “deficits motores permanentes ou paralisia completa” dos membros inferiores, conseguiram andar e controlar os músculos voluntariamente, mesmo sem a presença da estimulação elétrica.
O procedimento, intitulado STIMO – Stimulation Movement Overground, revelou resultados sem precedentes, com efeitos positivos logo desde os primeiros tratamentos, recorrendo a “neurotecnologias específicas para estimulação da medula espinhal”.
Através de “um gerador de impulsos implantado, com capacidades de disparo em tempo real”, os pacientes receberam explosões elétricas de “estimulação espacialmente seletiva”, visando regiões específicas, ligadas ao cérebro, conforme os movimentos musculares desejados, explicam os autores da pesquisa.
Sebastian Tobler, de 48 anos, vítima de um acidente com um buggy, David, de 28 anos, que sofreu um acidente desportivo, e Gert-Jan, de 35 anos, atropelado quando seguia de bicicleta para casa, tiveram implantados cirurgicamente uma série de 16 eletrodos na região lombar.
Cada eletrodo estava configurado para estimular áreas específicas da medula espinhal, associadas a certos grupos musculares, de modo a imitar os sinais que o cérebro efetuaria com o mesmo fim.
Os eletrodos estavam conectados a um gerador de impulsos implantável, usado para a estimulação cerebral em pacientes com o mal de Parkinson, mas que foi adaptado para as lesões na coluna.
Em apenas uma semana, após o início do tratamento, a “estimulação espaço-temporal tinha restabelecido o controle adaptativo dos músculos paralisados durante a caminhada no subsolo”, aponta o artigo científico.
“Depois de alguns meses, os participantes recuperaram o controle voluntário sobre músculos anteriormente paralisados sem estimulação, e podiam caminhar ou andar de bicicleta em ambientes ecológicos, durante a estimulação espaço-temporal”, notam os autores da pesquisa.
“Conseguimos comprovar o que já sabemos que ocorre nos animais, que o cérebro pode chegar a ativar de forma natural a medula espinhal“, explica Grégoire Courtine.
O maior desafio dos três participantes foi aprender a coordenar as mensagens do cérebro com os movimentos dos músculos. Mas passado esse obstáculo, “conseguiram caminhar com suporte de peso corporal [muletas ou andador] em tão somente uma semana. Em cinco meses conseguiram uma melhoria enorme do controle voluntário dos músculos”, constata Grégoire Courtine.
Com a eletroestimulação clássica, os pacientes voltavam ao estado de paralisia depois de ela ser desligada. Mas com o tratamento inovador, mesmo quando a eletroestimulação é desligada, o paciente consegue controlar os músculos voluntariamente.
“Cinco meses depois de começar o treino com estimulação elétrica dirigida, o sistema nervoso humano respondeu ainda mais profundamente do que esperávamos”, salienta Grégoire Courtine.
O próximo passo do estudo é consolidar os resultados em mais pacientes, para depois desenvolver uma neurotecnologia que possa ser utilizada em tratamentos hospitalares.
Ciberia // ZAP