Recebido por centenas de apoiantes com gritos de “mito”, “o capitão chegou”, “WhatsApp” e “Facebook” em frente ao Palácio do Planalto, em Brasília, o novo presidente Jair Bolsonaro fez um discurso com referências a Deus, à família e ao “direito à propriedade”.
O recém-eleito presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, tomou posse nesta terça-feira, 1º de janeiro, em uma cerimônia marcada pelo mal-estar com jornalistas, muitos dos quais estrangeiros, que chegaram a deixar a sala de imprensa pelas “más condições” de trabalho reservadas à imprensa.
Quebrando o protocolo habitual, a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, fez um discurso antes do marido, o presidente recém-empossado, usando linguagem de sinal. A nova primeira-dama do Brasil é defensora da causa dos surdos e mudos, sendo ela própria intérprete de Libras.
Durante o discurso, Michelle Bolsonaro agradeceu a oportunidade de “trabalhar pelos mais necessitados” e fez um agradecimento especial ao “enteado Carlos Bolsonaro”, pelos “23 dias passados no hospital”, após o episódio do ataque à facada ao então candidato Jair Bolsonaro, durante a campanha eleitoral, em Juiz de Fora.
Após receber a faixa presidencial do presidente Michel Temer, Jair Bolsonaro pronunciou um discurso ultraconservador, cheio de frases de forte efeito e com alvos bem-definidos.
Em um dos pontos marcantes do seu discurso, o novo presidente do Brasil citou um “momento que não tem preço”. “Deus preservou a minha vida e vocês acreditaram em mim. Esse é o dia em que o povo começou se libertar do socialismo, do politicamente correto e do gigantismo estatal”, declarou Bolsonaro.
O novo chefe de Estado afirmou que “a voz das ruas e das urnas foi muito clara. Essa foi a campanha mais barata da história. Juntamente com vocês, vamos acabar com ideologias nefastas que destroem a família, alicerce de nossa sociedade”, disse.
Jair Bolsonaro apostou ainda na retórica anticorrupção que marcou sua campanha e defendeu os “interesses brasileiros em primeiro lugar”, em uma possível versão brasileira do “America First” de Donald Trump.
O discurso não deixou de lado a habitual referência à meritocracia, e combateu o que chama de “ideologização das nossas crianças“.
Discursou ainda contra a “ideologia que defende bandidos e criminaliza policiais” e defendeu a “garantia de direito da propriedade e da legítima defesa“. O novo presidente deu também o tom da nova orientação da diplomacia brasileira, sobre a qual disse querer “retirar o viés ideológico das relações internacionais”.
No fim do discurso, brandindo uma bandeira brasileira, declarou, em tom dramático, que “essa é a nossa bandeira, que jamais será vermelha, só será vermelha se for do nosso sangue derramado para a manter verde e amarela”.
Mal-estar com a imprensa
Pela primeira vez em uma posse presidencial no Brasil, os jornalistas não puderam transitar livremente pela Esplanada dos Ministérios e não puderam realizar entrevistas junto à população.
Com acesso restrito a uma sala, de onde não puderam sair, alguns repórteres decidiram abandonar a posse de Bolsonaro, entre os quais três jornalistas do canal de TV francês France24 e um profissional da agência de notícias chinesa Xinhua.
Na coluna no jornal Folha de S. Paulo, a jornalista Mónica Bergamo se referiu à posse como “um dia de cão” e contou que os fotógrafos foram aconselhados a não erguer suas máquinas. “Qualquer movimento suspeito pode levar um sniper a abater o alvo”, conta Bergamo, citando instruções do gabinete de comunicação de Bolsonaro.
De acordo com Raquel Miura, correspondente da RFI em Brasília, “não foi fácil a cobertura para a imprensa”. Segundo conta a repórter, os jornalistas passaram por detectores de metais e tiveram que se desfazer de frutas, que só era permitido levar fatiadas. Em nenhum local era possível entrar com garrafas de água.
Ainda nesta terça, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo emitiu uma nota sobre as condições impostas a jornalistas que cobriram a posse presidencial. O texto do documento criticou as condições de trabalho reservadas aos jornalistas.
“Confinados desde as 7h, alguns com acesso limitado a água e a instalações sanitárias, os jornalistas não puderam interagir com autoridades e fontes – algo comum em todas as cerimônias de início de governo desde a redemocratização do país”, diz a nota.
“A Abraji protesta contra esse tratamento desrespeitoso para com os profissionais que estavam no local fazendo o registro desse momento histórico“, completa o comunicado.
Ciberia // ZAP