Orquestra se transforma em refúgio de imigrantes no Brasil

Com a música como linguagem comum, a Orquestra Mundana Refugi, composta por artistas brasileiros e imigrantes de diferentes partes do mundo, entoa os acordes da diversidade cultural com um repertório que busca conscientizar sobre a imigração e a convivência entre povos.

A orquestra de São Paulo esconde histórias assustadoras de Irã, Síria, Palestina, Guiné e República Democrática do Congo, nas quais seus protagonistas, que fugiram dos seus países para realizar seus sonhos ou simplesmente sobreviver, conhecem de perto o significado da superação e do sacrifico.

O compositor Carlinhos Antunes, mentor do projeto, lidera um grupo com 19 integrantes de idiomas e dramas diferentes, imigrantes, alguns em situação de refúgio, chegados de Síria, Palestina, Guiné, Congo, França e outras cidades do Brasil.

Todos podem cantar nos seus idiomas e em idiomas que não são seus. Os congoleses, por exemplo, cantam em português e suajili e os iranianos fazem o mesmo em espanhol e português, ou seja, o interessante é que, além de comunicar-se em outros idiomas, possam fixar-se em outras culturas”, declarou Antunes à EFE.

Para alguns membros do grupo, a orquestra representa um prezado “refúgio” perante a falta de liberdade de expressão nos seus países, como a iraniana Mah Mooni, que, apesar de ter perdido uma perna em um acidente de ônibus, tem forças de sobra para perseguir no Brasil o sonho de ser cantora.

As mulheres no Irã não podem cantar sozinhas em público. Eu sempre quis ser cantora, esse foi o principal motivo para vir ao Brasil”, disse Mooni, que “voltou a nascer” quando conheceu Carlinhos Antunes.

Mooni reúne-se com seus demais companheiros em um estúdio de música em um bairro da capital paulista para ensaiar as últimas peças antes do concerto que estava previsto para o domingo, onde, entre outras canções, apresentariam um novo tema de composição própria e “As Caravanas”, composta e cedida por Chico Buarque.

No entanto, a apresentação teve que ser cancelada devido aos casos de febre amarela registrados no local do show.

Na sala de ensaios, cada um deles outorga um significado diferente à versão de “As Caravanas”, uma canção com múltiplos sentidos, mas que também fala sobre os que migram e são julgados.

A letra da canção – “têm que matar, têm que bater, engrossa a gritaria” – ganha força à medida que é repetida pelos membros da orquestra, que sentem cada palavra como se fosse sua.

“Para mim a canção é um grito, o que estamos cantando aqui está acontecendo agora no meu país”, contou Mariama Camara, uma dançarina, cantora e percussionista guineana que chegou a São Paulo como refugiada há uma década deixando suas filhas para trás.

Para Carlinhos Antunes, “As Caravanas” é um reflexo da história dos componentes do grupo, mas ao mesmo tempo “fala da situação atual (de crise de segurança) do Rio de Janeiro”.

“A letra de Chico pode ser encarada como uma revelação, algo que cantou está acontecendo agora”, comentou Leonardo Matumona, congolês de 22 anos que chegou ao Brasil quando era menor para escapar da complicada situação política de Angola, onde vivia antes de chegar ao país.

Com os olhos fechados, os integrantes da orquestra escutam a primeira versão que gravaram de “As Caravanas”, na qual se misturam os sentimentos, enquanto alguns lembram o passado, muitas vezes doloroso, que deixaram para trás.

Para Mariama, a banda representa um abrigo contra a dor. Para Leonardo, cantar é um modo de agradecer por aquelas pessoas que lhe “acolheram” após deixar a Angola. “Cantar me dá muita força, me faz esquecer muitas coisas que vivi no meu país até vir aqui e me faz sentir melhor”, destacou Mariama.

Ciberia // EFE

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