Queimadas associadas ao desmatamento florestal estão intoxicando o ar que milhões de pessoas respiram e afetando a saúde na Amazônia brasileira, afirmam as ONGs Human Rights Watch, Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e Instituto de Estudos para Políticas de Saúde (Ieps) em relatório publicado nesta quarta-feira (26/08).
O estudo O Ar é Insuportável: Os impactos das queimadas associadas ao desmatamento da Amazônia brasileira na saúde estima que 2.195 internações hospitalares por doenças respiratórias em 2019 são atribuíveis às queimadas.
Quase 500 internações envolveram crianças com menos de um ano, e mais de mil foram de pessoas com mais de 60 anos. Elas duraram, em média, três dias, e totalizaram quase 7 mil dias nos hospitais. Essas internações representam apenas uma fração do impacto total das queimadas na área da saúde, afirmam as entidades, considerando que milhões de pessoas foram expostas em 2019 a níveis nocivos de poluição do ar decorrentes das queimadas associadas ao desmatamento na Amazônia.
As organizações descobriram que, em agosto de 2019, quase 3 milhões de pessoas em 90 municípios da região amazônica foram expostas a níveis de poluição atmosférica nocivos, acima do limite recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). Em setembro, o número aumentou para 4,5 milhões de pessoas em 168 municípios.
“Até que o Brasil efetivamente controle o desmatamento, podemos esperar que as queimadas continuem a cada ano, impulsionando a destruição da Amazônia e intoxicando o ar que milhões de brasileiros respiram”, diz Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil. “O fracasso do governo Bolsonaro em lidar com esta crise ambiental tem consequências imediatas para a saúde da população na Amazônia, e consequências de longo prazo para a mudança climática global.”
A avaliação das organizações sobre os impactos das queimadas na saúde inclui uma análise estatística de dados oficiais sobre internações hospitalares, desmatamento, focos de calor e qualidade do ar, particularmente pela presença de poluentes fortemente associados às queimadas na região amazônica. O levantamento se baseia ainda em entrevistas com 67 profissionais de saúde, autoridades e especialistas.
Segundo o estudo, o impacto das queimadas se estende muito além das internações porque muitas pessoas que adoeceram pela fumaça sequer chegaram a acessar os serviços de saúde, e muitas outras tiveram problemas respiratórios que, embora graves, não exigiram internação.
Desde que Bolsonaro assumiu a Presidência em janeiro de 2019, o governo enfraqueceu as agências ambientais brasileiras e buscou reduzir restrições a áreas protegidas e terras indígenas. O desmatamento aumentou 85% durante seu primeiro ano no cargo, de acordo com uma estimativa conservadora do Deter, sistema brasileiro de alerta por satélite. A destruição permanece no mesmo ritmo no segundo ano de governo.
Diversos fatores indicam que as queimadas na Amazônia serão mais intensas em 2020. Em abril deste ano, as áreas recém-desmatadas combinadas com as áreas desmatadas que não foram queimadas em 2019 na Amazônia já totalizavam 4.509 quilômetros quadrados de possíveis alvos de queimadas durante esta estação seca. Em julho, foram detectados 28% mais focos de calor do que em julho do ano passado.
As queimadas não ocorrem de forma natural na Floresta Amazônica. São provocadas após a derrubada de árvores, geralmente de forma ilegal, a fim de preparar o terreno para agricultura, pastagem ou especulação de terras. As queimadas geralmente atingem seu pico em agosto e setembro.
A fumaça é rica em material particulado fino, um poluente ligado a doenças respiratórias e cardiovasculares, bem como a mortes prematuras. Crianças, idosos, gestantes e pessoas com doenças pulmonares ou cardíacas preexistentes são especialmente vulneráveis.
Autoridades e profissionais de saúde temem maior sobrecarga no sistema de saúde, que já enfrenta a pandemia de covid-19, com a chegada de pacientes afetados pelas queimadas em 2020, podendo causar o colapso do sistema de saúde em partes da região amazônica. Além disso, a fumaça pode agravar os sintomas do vírus, resultando em mais casos graves e mortes.
“As autoridades deveriam fazer mais para enfrentar esta crise crônica e evitável de saúde pública”, afirma Miguel Lago, diretor do Ieps.
“Elas deveriam implementar um mecanismo eficaz de monitoramento da qualidade do ar e implementar padrões que protejam a saúde por meio de políticas preventivas e responsivas, com atenção especial aos grupos vulneráveis.”
// DW