O cientista Miguel Pais Vieira é o primeiro autor de um estudo que mostra como os cérebros de dois ou mais animais podem trabalhar em conjunto, como parte de um sistema computacional – uma espécie de Internet Cerebral.
Em dois estudos separados, assinados com colegas da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, Miguel Pais Vieira explora o conceito de ‘brainet’, ou Internet cerebral, numa tradução livre para o português.
Nestes estudos, grupos de dois a quatro animais foram capazes de combinar parte da atividade dos seus cérebros para controlar os movimentos de um braço virtual ou para realizar operações computacionais, como reconhecimento de padrões, recuperação de memórias tácteis e uma forma simplificada de previsão do tempo.
Os resultados destes estudos, publicados esta quinta-feira na revista Scientific Reports, abrem espaço para desenvolver redes de cérebros de animais, verdadeiros computadores orgânicos que utilizam tecnologia analógica e digital.
“A nossa expectativa foi atingida de forma surpreendente, o que sugere que, no futuro, os seres humanos vão ter menos dificuldades para combinar, de forma não invasiva, a atividade elétrica de um ou mais cérebros para uma tarefa motora, por exemplo”, explicou o diretor da equipa, o brasileiro Miguel Nicolelis, investigador da equipa de Pais Vieira.
Num dos estudos publicados, dois macacos em ambientes diferentes tinham que movimentar apenas com o pensamento um braço virtual, apresentado no ecrã do computador.
Cada macaco tinha que realizar um movimento para receber uma recompensa; os movimentos eram diferentes um do outro, mas no seu conjunto faziam o braço virtual mexer.
Num segundo estudo, que mostrou a conexão feita entre cérebros de ratos, foi possível combinar a atividade elétrica de três ou quatro roedores para a realização de tarefas computacionais lógicas.
Uma das possibilidades que estes estudos abrem é o trabalho com pessoas que tenham sofrido acidentes.
Em teoria, quem perdeu os seus movimentos poderá ser auxiliada por uma ou mais pessoas a sentir novamente os seus membros, o que facilitaria o seu processo de reabilitação.
Essa teoria vai agora ser testada com seres humanos, no Brasil e nos Estados Unidos, ainda este ano, estando os primeiros resultados previstos para 2016.
Estes estudos foram realizados nos últimos quatro anos, enquanto Nicolelis e a sua equipa trabalham no projeto Walk Again (Andar de Novo), que tem como objetivo utilizar as atividades neurais para controlar de maneira direta um equipamento externo ao corpo humano.
O trabalho ficou conhecido pelo desenvolvimento de um exoesqueleto que permitiu a um paraplégico brasileiro dar um pontapé durante a cerimónia de abertura do Campeonato do Mundo de Futebol, em São Paulo, em junho do ano passado.
Miguel Pais Vieira, de 35 anos, fez o seu doutoramento em neurociência na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, e chegou aos Estados Unidos em 2009 para trabalhar com o professor Miguel Nicolelis, líder desta área de investigação.