Pesquisadores sabem há muito tempo que, além do sustento geral, o leite materno fornece aos bebês nutrientes vitais para construir e fortalecer seus sistemas imunológicos. Agora, descobriu-se um novo mecanismo por trás desse incremento antibacteriano, presente nos açúcares do leite materno.
Ao contrário do entendimento de que as defesas antibacterianas são passadas de modo hereditário, sendo transmitida das mães para seus bebês unicamente através de proteínas no leite materno, uma equipe da Vanderbilt University afirmou que açúcares – ou carboidratos – também demonstram propriedades que podem oferecer proteção contra infecções bacterianas. O estudo foi publicado na Infectious Diseases.
“Este é o primeiro exemplo de atividade antimicrobiana generalizada com protagonismo dos carboidratos no leite humano. Uma das propriedades notáveis desses compostos é que eles são claramente não-tóxicos, ao contrário da maioria dos antibióticos”, explica o químico Steven Townsend.
Combater as bactérias
A infecção mais proeminente que afeta os recém-nascidos é chamada de Streptococcus do Grupo B (GBS), que pode levar os bebês a desenvolver pneumonia antes que seus sistemas imunológicos estejam suficientemente fortes para combater a bactéria.
Felizmente, enquanto a GBS pode ser mortal para os bebês, a maioria dos recém-nascidos não é infectada por ela. A equipe queria investigar se esses bebês poderiam obter uma proteção de cortesia a partir do leite de suas mães.
“Nós nos perguntamos se o hospedeiro comum de [GBS] – as mulheres grávidas – produz compostos que podem enfraquecer ou matar o estreptococo, que é a principal causa de infecção em recém-nascidos em todo o mundo”, explica Townsend.
Para perseguir a resposta, os pesquisadores retiraram carboidratos de leite materno humano de cinco doadores e açúcares complexos isolados a partir deles (chamados de oligossacarídeos), antes de introduzir os oligossacarídeos nas culturas de estreptococos em laboratório.
Analisando a interação sob o microscópio, a equipe descobriu que o carboidrato poderia matar as bactérias e enfraquecer suas defesas naturais, impedindo que elas formassem um biofilme protetor contra ameaças. “Quando as bactérias querem nos prejudicar, elas produzem essa substância protetora pegajosa, o que lhes permite enganar nossos mecanismos de defesa”, explica Townsend.
Em uma das amostras, os açúcares eliminaram completamente o estreptococo. Em outro, eles foram moderadamente eficazes ao matar o estreptococo, enquanto nas três amostras restantes os carboidratos não foram muito efetivos.
Para ajudar a explicar o que aconteceu, a equipe deu início a outro conjunto de testes.
Em novas pesquisas ainda não publicadas, mas apresentadas nesta semana em um encontro da American Chemical Society em Washington, DC, o grupo da Townsend voltou a encontrar resultados mistos.
Estes incluem dois casos em que os açúcares do leite materno quebraram o biofilme e mataram a bactéria; quatro em que o biofilme estava quebrado, mas as bactérias sobreviveram; e dois nos quais as bactérias morreram, mas o biofilme persistiu.
A investigação está no início, e é claro que mais pesquisas serão necessárias para descobrir o espectro desses resultados. Mas se a equipe puder resolver o quebra-cabeça, isso pode levar ao início de uma nova classe de antibióticos, agora que sabemos como esses carboidratos atuam na presença de bactérias.
“Os açúcares seguem dois processos. Primeiro, eles sensibilizam as bactérias e depois as eliminam. Os biólogos costumam chamar isso de ‘letalidade sintética’. Surge aqui um grande incentivo para que possamos desenvolver novos medicamentos antimicrobianos com essa capacidade”, disse Townsend.
Além disso, a equipe diz que seus dados preliminares, ainda em andamento, indicam que os açúcares do leite podem tornar as bactérias mais suscetíveis a antibióticos comuns – como a penicilina e eritromicina.
Se esses resultados forem confirmados, é possível que os carboidratos possam reduzir, algum dia, a nossa confiança em tipos de antibióticos comuns e, ao fazê-lo, ajudar a desvendar uma grande parte do problema de resistência.
“Se conseguirmos descobrir como os açúcares atuam, então será possível justificar a tentativa de recriá-los em grandes quantidades e depois introduzi-los em pessoas adultas”, conclui Townsend.
Ciberia // HypeScience