O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) aprovou moção de apoio à resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que estabelece como os profissionais da área devem atuar nos casos que envolvam a orientação sexual de pacientes e que é objeto de uma disputa na Justiça.
Formado por 11 representantes da sociedade civil e pelo mesmo número de indicados pelo poder público, o CNDH é o mais antigo colegiado do país, sendo responsável por monitorar e cobrar de órgãos públicos e entes privados o respeito aos direitos e liberdades básicas. O apoio à Resolução nº 1 foi decidido no final da tarde desta quinta-feira (28)
Para os membros do conselho, a resolução do CFP – que três psicólogos tentam derrubar na Justiça – vem “orientando corretamente a prática profissional no campo das sexualidades do ponto de vista ético, técnico e científico” desde que entrou em vigor, há 18 anos
Publicada em março de 1999, a Resolução nº 1 proíbe os psicólogos de exercerem qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, bem como de colaborarem com eventos ou serviços que proponham o tratamento e a cura da homossexualidade.
Segundo o CFP, a determinação baseia-se no entendimento da Organização Mundial de Saúde (OMS) de que a homossexualidade não é uma doença, um distúrbio, nem uma perversão. Assim, na avaliação do conselho, a forma como cada um vive sua sexualidade faz parte da identidade do sujeito, cabendo aos profissionais de psicologia única e exclusivamente contribuir para a superação dos preconceitos e das discriminações.
O CNDH também cita a decisão da OMS, de 1990, mas lembra que esta decisão remonta a outras anteriores, como a da Associação Americana de Psiquiatria, que, em 1973, retirou a homossexualidade do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM).
Além disso, ainda de acordo com o CNDH, desde 1984 a Associação Brasileira de Psiquiatria aprovou uma resolução que “proíbe qualquer discriminação e preconceito contra os homossexuais”.
Para o CNDH, na prática, a decisão liminar (provisória) do juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, da Seção Judiciária do Distrito Federal, autorizando os psicólogos a estudar e oferecer reorientação sexual clínica aos pacientes que os procurarem voluntariamente garante a utilização da chamada “cura gay”.
Psicólogos que questionam a norma do CFP alegam que ela impede os profissionais não só de atender eventuais pacientes que procurem ajuda para tentar reverter sentimentos ou comportamentos que lhes causem desconfortos ou transtornos, como de desenvolver estudos científicos sobre a possível reversibilidade de práticas homoeróticas, restringido a liberdade de pesquisa dos profissionais.
Em entrevista à Agência Brasil, Adriano José Lima, um dos três autores da ação penal movida contra o CFP negou veemente que a intenção do grupo seja propor a cura da homossexualidade.
“Não acredito nem em cura gay, nem que homossexualidade é doença. Não queremos patologizar ninguém”, disse Lima.
“Acreditamos que existe uma perspectiva teórica que trata da homossexualidade distônica – que é quando o indivíduo não se sente bem por sentir atração por alguém do mesmo sexo. Este indivíduo deve ter a liberdade de procurar acolhimento”, que, nas redes sociais, costuma usar a expressão “mortificação do desejo” ao se referir ao que entende como “reorientação sexual”, acrescentou.
“Refiro-me a trabalhar a capacidade de autonomia do paciente em mortificar esse desejo que tanto o desorganiza. Significa trabalharmos na perspectiva de [o paciente] não alimentar mais esse desejo [por pessoas do mesmo sexo], de [o paciente] aprender a lidar com esse desejo”, completa.
Para o CNDH, se confirmada, a decisão liminar do juiz federal abrirá uma brecha perigosa. “O uso da cura gay se configura como uma prática que reforça estigmas e aumenta o sofrimento dos que a ela são submetidos, afrontando aos direitos humanos“, afirma a entidade.
Queixas contra a decisão judicial do último dia 15 motivaram a instauração de três processos contra o juiz Waldemar Cláudio de Carvalho, no âmbito da Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Basicamente, os reclamantes questionam a decisão do magistrado, que, ao mesmo tempo que apontou a constitucionalidade da resolução do CFP, sugere como o texto deve ser interpretado de forma a não ferir princípios constitucionais, como a liberdade de pesquisa.
Ainda não há previsão de quando o corregedor do CNJ, ministro João Otávio de Noronha, se manifestará sobre o tema. A expectativa, no entanto, é que as queixas deem em nada, pois os recursos contra a decisão devem ser apresentados a instâncias superiores, como fez o Conselho Federal de Psicologia, que, no último dia 21, recorreu ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF).