As cidades de Brasília e São Paulo registraram essa quarta-feira (14) violentos protestos horas depois de o Senado brasileiro ter aprovado a PEC do Teto dos Gastos, lei que limita os gastos públicos durante 20 anos.
Em Brasília, um grupo de manifestantes entrou em confrontos com a polícia e danificou prédios onde existem apartamentos de deputados federais, na região central da cidade, estourando também foguetes nas ruas. Na Esplanada dos Ministérios, também se registraram confrontos entre policiais e manifestantes.
Segundo a comunicação social, os manifestantes atiraram garrafas de vidro, pedras e bombas artesanais contra os policiais, que reagiram usando “bombas de efeito moral” (petardos), sprays de gás pimenta e lacrimogéneo.
A Secretaria de Segurança de Brasília informou que cerca de duas mil pessoas aderiram aos protestos, que resultaram em 15 detidos e seis policiais feridos.
Em São Paulo, a maior cidade do país, os manifestantes ocuparam a Avenida Paulista, na região central e houve atos de destruição na sede da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), depois de um grupo forçar os portões do local.
Proposta com uma mudança na Constituição do país, a norma aprovada hoje pelo Congresso, a PEC 55, determina que a partir de 2017 os gastos públicos do Governo Federal só poderão ser reajustados pela inflação do ano anterior, por um período de 20 anos.
A PEC do Teto é considerada um dos três pontos fundamentais do pacote de ajustes fiscais proposto pela equipe econômica do Presidente Michel Temer para fortalecer a economia, juntamente com alterações à lei da Previdência e das regras laborais, que ainda estão sendo analisadas.
A lei tem gerado polémica e forte rejeição dos partidos da oposição e de movimentos sociais, já que limita também gastos com a saúde e a educação, duas áreas que antes tinham regimes especiais.
“Teto de 20 anos para gasto público no Brasil viola direitos humanos”
Um especialista da ONU afirmou na sexta-feira (9) que os planos do governo do Brasil de congelar o gasto público por 20 anos “são totalmente incompatíveis com as obrigações de direitos humanos do país”.
Philip Alston é relator para extrema pobreza e direitos humanos. Para ele, ao aprovar a PEC 55, quem levará o prejuízo “serão os mais pobres, já que a emenda irá bloquear gastos na saúde, na educação e na previdência social”.
O relator da ONU recomenda ao governo que promova um debate público adequado sobre a chamada PEC 55 e que identifique “alternativas para atingir objetivos de austeridade”.
Na opinião de Alston, a medida “é radical, sem qualquer nuance ou compaixão”, porque atingirá “os brasileiros mais pobres e frágeis”, aumentando as desigualdades sociais.
Para o especialista, o congelamento é inapropriado e, se for adotada, a emenda colocará o “Brasil em uma categoria única de retrocesso social”.
Philip Alston também avalia que o atual “governo chegou ao poder depois de um impeachment e nunca apresentou seu programa“, o que para o relator, levanta maiores preocupações sobre “a proposta de amarrar as mãos de futuros governantes”.
Em sua nota, o relator da ONU lembra que o governo alega que o congelamento de gastos poderá aumentar a confiança dos investidores e reduzir a dívida pública, mas Alston destaca que o Brasil é a maior economia da América Latina e está sofrendo a pior recessão em décadas.
Alston explica um dos impactos na educação: pelo atual plano, o governo precisa investir R$ 37 bilhões por ano no setor. Mas se a PEC 55 for aprovada, o gasto será reduzido para R$ 47 bilhões nos próximos oito anos. Segundo o relator, 3,8 milhões de pessoas já estão fora da escola no país.
Na avaliação de Philip Alston, o debate sobre a PEC 55 foi feito às pressas no Congresso e um estudo recente mostrou que 43% dos brasileiros não conhecem a emenda.
O relator está em contato com o governo brasileiro para entender melhor o processo e afirmou que “mostrar prudência econômica e fiscal e respeitar as normas internacionais de direitos humanos” são objetivos que precisam caminhar juntos.