O socialismo, o partido único e a eleição indireta permanecem, mas algumas estruturas mudam: Cuba inaugurou nesta quinta-feira um sistema de poder repartido em várias mãos.
Miguel Díaz-Canel, que atuava como presidente dos Conselhos de Estado e Ministros desde 2018, foi eleito presidente da República pela Assembleia Nacional (Parlamento), posição restaurada pela nova Constituição após 43 anos.
Salvador Valdés, de 74 anos, é o vice-presidente, enquanto Esteban Lazo, de 75, foi ratificado como chefe do Parlamento e também liderará o Conselho de Estado. Dois revolucionários históricos que compunham o Conselho de Estado, os comandantes Ramiro Valdés, de 87 anos, e Guillermo García, de 91, foram deixados de fora desse órgão. Valdés permanecerá no seleto Escritório Político do único Partido Comunista de Cuba (PCC), até 2021.
O Conselho de Estado, até agora com 31 membros, incluindo seis vice-presidentes, foi reduzido para 21, com quatro novos membros.
Presidente com mandato e reeleição
Até agora, a principal figura era o presidente dos Conselhos de Estado e Ministros, posto ocupado por Fidel (1976-2008) e Raúl Castro (2008-2018), simultaneamente com cargo de primeiro-secretário do PCC.
Díaz-Canel sucedeu Raúl, de 88 anos, em 2018, embora o irmão de Fidel mantenha a liderança do PCC até 2021, quando espera se aposentar, perto dos 90 anos. Díaz-Canel passa a ser o presidente da República com um mandato de cinco anos, com opção de reeleição, e deve contar com o apoio de seus contemporâneos, sempre sob o olhar atento dos líderes históricos do partido.
O governante tem a tarefa de estimular a lenta reforma econômica da ilha, em um contexto adverso. Washington reforça o bloqueio que desde 1962 aplica contra a ilha e acusa Cuba de apoiar militarmente o governo de Nicolás Maduro na Venezuela. Agora, aplica sanções aos barcos que transportam petróleo de Caracas, o que provocou uma escassez de combustível.
Efeitos do bloqueio
Na quarta-feira, em uma sessão do Parlamento, Díaz-Canel comentou que, devido às hostilidades de Washington, “os países irmãos não conseguiram cumprir seus compromissos de fornecimento e pagamento de petróleo“, o que dificulta a liquidez. “Eles estão nos perseguindo navio a navio”.
A nova Constituição, aprovada no começo do ano, foi criticada pelo chefe da diplomacia americana Mike Pompeo. Para o secretário de Estado dos EUA, com ela, Cuba consolida seu sistema socialista sem “garantir ao povo cubano liberdades fundamentais”.
“As prioridades (do governo são) combustível, comida, (pagamento de) dívida”, acrescentou Diaz-Canel. Outra questão importante é a defesa, disse ele, porque “há toda uma ameaça, toda uma escalada”, afirmou.
Nova geração com Internet
“Uma nova geração de líderes chega ao poder, com uma estrutura institucional mais coletiva e um mandato de reforma” da economia, disse à AFP o acadêmico cubano Arturo López-Levy, da Universidade Holy Names, da Califórnia. Mas “a seleção de pessoal passou pelos antigos líderes partidários, que agiram com importantes poderes de veto”, acrescentou.
A lista foi elaborada por uma comissão de candidatos, após consulta aos deputados, e foi divulgada apenas no momento da eleição. Os 605 deputados foram eleitos pela população em 2018, em uma votação fechada, com o mesmo número de assentos e de candidatos. Os parlamentares escolhem os altos cargos do país.
Na véspera, “não sabemos quem são os candidatos”, acrescentou Fernández Estrada. “Há uma faixa da população de entre 16 e 30 anos que expressa sua discordância com a eleição indireta nas redes sociais“, prevista na Constituição aprovada em abril, afirmou Estrada.
Em dezembro, a rede 3G chegou a Cuba, abrindo espaço para uma sociedade civil crítica, mas não necessariamente uma oposição. O presidente da República será o chefe de Estado e, em dezembro, nomeará um primeiro-ministro, outra figura que retorna à estrutura política.
“O país será governado pelas mesmas pessoas, mas, talvez em alguns assuntos, o fará de maneira mais contemporânea com o presente e menos ligado a preconceitos que agem como limitações autoimpostas”, afirmou o cientista político Jorge Gómez Barata.
// RFI