Em uma primeira impressão, um adolescente vidrado na televisão jogando videogame não tem nada demais. No entanto, este hábito está se tornando um dos vilões da poluição digital, um conceito que permanece abstrato para a maioria das pessoas, mas que já responde por quase 3,8% das emissões mundiais de gases de efeito estufa.
As conclusões foram publicadas em um estudo inédito da consultoria ambiental francesa GreenIT, especialista na questão.
O impacto ambiental da esfera digital consome 6,8 mil TWh (terawatts/hora) de energia e emite 1,4 milhão de toneladas de gases causadores do aquecimento global por ano. Vistos assim, os dados podem não significar muito. Por isso, a pesquisa coloca os números em perspectiva: representam o mesmo que 82 milhões de aquecedores elétricos ligados sem parar, ou a poluição gerada por 116 milhões de voltas ao mundo de carro.
Telefones, computadores, telas com tamanhos e definições cada vez maiores. Os equipamentos em si ainda são a parte mais grave do problema.
“É preciso que os aparelhos durem mais tempo, sejam menos impactantes. Precisamos acabar com o problema de obsolescência programada. Mas o principal é que a duração dos nossos equipamentos é cada vez mais ligada ao fato de que softwares e os sistemas operacionais deles ficam rapidamente desatualizados”, explica Frédéric Bordage, um dos autores do estudo.
“Todas essas atualizações pesadas que somos obrigados a acrescentar nos telefones, computadores ou videogames, cotidianamente, consomem cada vez mais memória e capacidade do microprocessador. Até que ele fica tão pesado que não consegue mais funcionar: vira um ‘obesofone’.”
Os aparelhos digitais possuem baterias e componentes, como metais raros, cuja reciclagem ainda é um desafio para o mundo da tecnologia. Quando descartados de maneira inapropriada, são tóxicos ao meio ambiente. Sem falar de toda a infraestrutura necessária para a transmissão e estocagem de dados. É nesse contexto que os videogames se tornam protagonistas da poluição digital.
“Quanto mais alta é a definição e quanto mais móvel estivermos, maior é o impacto ambiental. O pior cenário é jogar na sala, com um console conectado em uma tela grande, conectado em 4G e jogando em streaming”, resume Bordage. “Os estudos sobre como vamos nos conectar no futuro mostram que, em 2025, cada vez menos vamos nos preocupar em instalar fibra ótica para ter wifi em casa. Haverá mais antenas de 4G e as pessoas se conectarão desta maneira.”
Esteban Giner é pesquisador do Centro de Pesquisas sobre as Mediações, da Universidade de Lorraine, onde estuda formas de diminuir o impacto ambiental dos games. Ele explica que, quando um utilizador baixa no próprio computador ou telefone um jogos triplo AAA, de altíssima definição, vai utilizar cerca de 80 a 150 gigabits. Mas se decide jogar em streaming, como é cada vez mais o caso graças a plataformas como Netflix ou Google, esse “peso” digital pode se multiplicar por quatro.
“Acabamos pensando que o mundo digital é algo imaterial, e é muito importante deixar clara a materialidade da informática e dos nossos meios de comunicação hoje, nos quais estão integrados os videogames. Estamos falando de toneladas e toneladas de cabos, que viabilizam a uma ligação telefônica e o funcionamento de um jogo em rede”, ressalta Giner.
O pesquisador nota que a conscientização dos jovens sobre o problema está aumentando, na medida em que compreendem o impacto ambiental das plataformas digitais. No entanto, dois tipos de jogadores resistem a enfrentar a questão: os que apreciam jogos cada vez mais próximos à realidade e os que buscam a competição com outros gamers.
“Quanto mais sobem de nível no jogo, mais precisam de qualidade de imagem e rapidez. Os jogadores competitivos precisam de máquinas superpotentes, que não vão deixar o jogo lento. Por exemplo: um jogador que joga com 30 imagens por segundo fica em desvantagem em relação a outro que está a 60 imagens por segundo”, sublinha o pesquisador.
Giner sugere algumas alternativas para combater o problema, como jogos menos complexos, fabricados em escala local, e não global, por produtores independentes. Também imagina a criação de um selo ambiental, para os fabricantes que se esforçam em poluir menos, e prega a durabilidade da experiência, no que ele chama de slowplay.
Em vez de experimentar a cada dia uma opção diferente, o melhor seria aproveitar cada jogo por um período maior. O ideal ainda seria limitar o número de horas de jogo, numa mudança de hábitos que se insere em uma filosofia de vida mais ecológica. “É tão importante de apagar as luzes de casa antes de sair e não deixar o chuveiro correndo à toa”, compara.
// RFI