Além da criação da escravidão e de um triângulo comercial entre continentes, o Colonialismo também foi responsável por mudar a própria geologia da Terra, defendem dois cientistas britânicos.
O Colonialismo trouxe muita riqueza a países como Portugal, Espanha e Grã-Bretanha, desempenhou um forte papel na escravidão de mais de 10 milhões de africanos e criou os primeiros mercados globais de algodão, tabaco e açúcar. Mas, agora, o Colonialismo também é “acusado” de outra coisa: mudar a geologia da Terra.
De acordo com o The Guardian, esta é a visão de dois cientistas britânicos que acreditam: o impacto do Colonialismo foi tão profundo que pode ser detectado no ar e nas rochas da Terra. Uma ideia sustentada no livro “O Planeta Humano: Como Criamos o Antropoceno”, escrito por Simon Lewis e Mark Maslin e publicado na semana passada.
Os dois cientistas da University College London descrevem a colonização do continente americano e de outros territórios como uma “experiência evolutiva de base planetária baseada no Homem”, que começou no século XVI e que “vai continuar indefinidamente”.
A maioria dos cientistas aceita que, ainda hoje, a Humanidade influencia a vida do planeta, traduzindo-se em mudanças como os movimentos das placas tectônicas, a acidificação dos oceanos e a exterminação de muitas espécies.
As consequências de todas estas ações vão continuar sendo detectáveis durante milhões de anos. Como recorda o jornal britânico, essa nova época é chamada de Antropoceno.
Porém, os cientistas discordam sobre a data em que o período começou. Alguns dizem que se iniciou com as explosões das primeiras bombas atômicas, eventos que provocaram uma revolução tecnológica e que deixaram registros radioativos nas rochas da Terra.
Outros consideram que é ainda mais recente e apontam o plástico como o principal culpado que, misturado com as rochas, tem formado uma camada geológica distinta. De qualquer forma, as origens do Antropoceno são vistas como relativamente recentes.
É aí que Lewis e Maslin discordam da comunidade científica. A dupla de cientistas acredita que tudo começou durante a Colonização desencadeada no século XVI.
O Antropoceno começou durante a Colonização?
“A chegada dos europeus teve um impacto profundo na América Central e do Sul”, afirma Maslin ao Observer.
“Levaram consigo germes como a varíola, sarampo, gripe, febre tifoide e muitas outras doenças que provocaram a morte de mais de 50 milhões de americanos, que não tinham exposição prévia a esses patógenos, em poucas décadas. O povo americano entrou em colapso e a agricultura de subsistência foi destruída”, explica.
“Podemos detectar isso nos núcleos de gelo da Antártida. Eles fornecem uma história da atmosfera por milhares de anos e mostram que os níveis de dióxido de carbono atingiram um mínimo distinto por volta de 1610 porque as florestas, que são muito melhores do que as culturas agrícolas para absorver o dióxido de carbono, cobriam agora vastas áreas da paisagem americana – graças à erradicação das pessoas que já tinham cultivado lá. Esse efeito persistiu durante décadas até a população na América ter sido outra vez restaurada”.
Esta é a marca – o ano de 1610 – que realmente define o Antropoceno, consideram os cientistas. Além disso, os dois acreditam que os movimentos colonialistas não afetaram só os povos, mas também os animais e as plantas.
Durante as décadas em que exploraram o continente americano, os europeus se alimentavam das suas batatas e tomates, enquanto que na China e na Índia se consumiam suas especiarias.
Estas importações também tiveram um profundo impacto. “Na China, por exemplo, a chegada do milho permitiu a criação de terras mais secas, gerando novas ondas de desflorestação e um grande aumento populacional”, dizem.
A colonização da América resultou assim em um triângulo comercial: os produtos europeus foram vendidos para a África em troca de escravos, que foram transportados para a América para cultivar algodão e tabaco para a Europa. Pela primeira vez, o mundo estava ligado a um único sistema econômico global.
A globalização tinha começado e seu impacto no planeta tem sido vasto desde então. Um dos resultados foi a homogeneização da vida na Terra. Ratos e outras pragas transportados nos navios invadiram os habitats de espécies isoladas, ao mesmo tempo que mais terras foram sendo destinadas à agricultura.
“Um bom exemplo disso é a minhoca”, declara Maslin. “Nos EUA, a maioria das minhocas que encontramos são, na verdade, de origem europeia. São melhores em competir por nutrientes, então tomaram conta do solo na América do Norte desde que os europeus as trouxeram através do Atlântico no século XVI. Esta é uma coisa que ninguém consegue reverter. Vão ficar lá para sempre”, explica.
“O Antropoceno começou com a difusão do Colonialismo e da escravidão. É uma história de como as pessoas tratam o meio ambiente e de como se tratam entre si”.
“Nos tornamos uma nova força da natureza, ditando o que vive e o que é extinto. Embora, em um aspecto importante, somos diferentes de qualquer outra força da natureza: nosso poder, ao contrário das placas tectônicas ou erupções vulcânicas, é reflexivo, ou seja, pode ser usado, modificado ou mesmo retirado”, concluem os autores.
Ciberia // ZAP