Portugal quer acabar com a isenção fiscal para os aposentados estrangeiros que se mudarem para o país.
O governo socialista do primeiro-ministro António Costa propôs nesta segunda-feira (27) uma emenda que altera as atuais regras, aumentando de 0 para 10% o imposto de renda dos aposentados que têm o status de “residentes não habituais” (RNH). Cécile Gonçalves, diretora da Casa em Portugal e especialista do setor imobiliário, acredita que, apesar do aumento, o país vai continuar sendo atrativo.
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A proposta de alteração elevando para 10% o imposto dos aposentados RNH integra o Orçamento do Estado para 2020, que será votado em 6 de fevereiro. Ela passará a valer somente para os novos pretendentes. Cécile Gonçalves avalia que essa foi uma boa solução encontrada pelo governo para satisfazer a ala mais à esquerda da coalizão no poder. O Bloco de esquerda queria o fim do RNH.
“Não é o fim do eldorado fiscal. A taxa proposta é muito mais baixa do que a maioria dos países europeus. Eu diria que é um bom sinal de que o status do RNH vai perdurar. Ao propor 10%, permite acalmar os países europeus que criticavam a medida e agradar parcialmente alguns parceiros da coligação”, afirma.
O regime fiscal atual beneficia 30 mil RNH, entre eles quase 3.000 brasileiros, mas também portugueses que moraram fora do país por mais de cinco anos. Os atuais beneficiários não serão atingidos pela mudança.
O sistema foi instituído em 2009 para atrair investimentos para o país, que atravessava uma grave crise econômica. Ele propõe, além do visto de residência, isenção fiscal para aposentados e 20% de imposto de renda a empreendedores de alta qualificação que passassem a viver em Portugal pelo menos seis meses ao ano. O benefício é temporário, vale por no máximo dez anos, a partir da data de obtenção.
Desde 2009, o regime atraiu principalmente europeus. Os franceses lideram, com 10 mil RNH. Mas o paraíso fiscal português também foi, desde o início, contestado por alguns países europeus, como a Finlândia e a Suécia, que reclamam dos impostos que deixam de recolher com a concorrência portuguesa.
Especulação imobiliária
Além disso, o regime é considerado por muitos portugueses discriminatório em relação aos aposentados nacionais que continuam a pagar normalmente o imposto de renda no país, com alíquotas progressivas de até 48%.
Outra crítica é que ele teria provocado a especulação imobiliária ao incitar os estrangeiros a adquirir bens no país. Os preços dos imóveis subiram tanto que ficaram proibitivos para os portugueses.
“Os preços subiram, mas não por causa dos estrangeiros”, garante Cécile Gonçalves. Segundo ela, o investimento estrangeiro em Portugal representa apenas 27% do total. A diretora da Casa em Portugal ressalta ainda que os estrangeiros ajudaram a “revitalizar os centros históricos de Lisboa e Porto”, por exemplo, que perdiam habitantes. “Lisboa não difere das outras capitais. É um dado novo (para o país), mas é a lógica do mercado e das capitais europeias”, diz.
Esse regime fiscal é apenas um dos instrumentos baixados por Portugal para atrair investimentos e aumentar a competitividade. Um outro incentivo é o chamado Gold Visa, em vigor desde 2012. Também procurado por brasileiros, ele oferece visto de residência para quem investe no país. Mas a grande maioria dos 105 mil brasileiros que moram legalmente em Portugal, segundo dados oficiais, e que representam a maior comunidade estrangeira do país, tem outros tipos de visto (estudante, trabalhador, cidadão europeu, dupla-nacionalidade, etc).
Cécile Gonçalves ressalta que todos estes instrumentos colocaram Portugal na rota dos investidores. “O país passou a ser um destino privilegiado. E isso não vai mudar! Além da questão fiscal, que se mantém competitiva, o custo de vida em Portugal é muito baixo comparado com muitos países da União europeia. Tem o aumento da qualidade de vida e também a questão da segurança. Portugal é o terceiro país mais seguro do mundo”, lembra.
A escolha de um casal de professores universitários franco-brasileiro, que preferiu não ser identificado, confirma a opinião de Cécile Gonçalves. No ano passado, depois de se aposentarem, eles decidiram se instalar na região de Lisboa, independentemente da questão fiscal. Como são funcionários públicos, continuam tendo o imposto de renda descontado na fonte na França.
// RFI