Oito votos a favor e seis contra. Foi com esse “placar” que, na semana passada, os colegas de curso da jovem cubana Karla María Pérez González decidiram que a estudante do primeiro ano de jornalismo deveria ser expulsa da Universidade Central de las Villas (UCLV), na província de Villa Clara.
Eles acusam Pérez de não estar alinhada com a Revolução Cubana e ter publicado artigos críticos ao governo de Cuba em um blog com o pseudônimo de Oriana. A decisão da “brigada do primeiro ano” foi ratificada de imediato pelo conselho da Federação Estudantil Universitária (FEU) da UCLV e pela reitoria.
Por meio de um comunicado, a FEU informou que Pérez é “integrante de uma organização ilegal e contrarrevolucionária“, contrária aos princípios, objetivos e valores da Revolução Cubana. Raramente as expulsões de universidades em Cuba por motivos políticos são tornadas públicas.
“O colegiado universitário não aceitará jamais a contrarrevolução dentro de nossas universidades”, diz um trecho da nota divulgada na semana passada.
“Junto ao nosso indiscutível, invicto e eterno Comandante em chefe reafirmaremos sempre: …dentro da Revolução, tudo; contra a Revolução, nada“, afirmou a organização, no comunicado publicado no site da Universidade Central de das Villas.
Razões
Pérez, que cursava o segundo semestre de jornalismo na universidade, garante que sua expulsão foi discutida e aprovada em reuniões a portas fechadas. Segundo ela, a decisão teve cunho político.
“Fui expulsa por não compactuar com as ideias comunistas e não comungar com o sistema socialista cubano – pelo qual ainda não estou convencida por todos esses anos”, disse ela à BBC.
Karla Maria Pérez faz parte da Somos+, uma organização civil cubana que defende o pluripartidarismo, as eleições abertas e a imprensa independente. A organização é considerada ilegal e dissidente pelo regime cubano.
“Já sabia os prós e contras ao me afiliar a Somos+; imaginava as consequências e a repressão que isso poderia trazer”, explicou. Pérez acrescentou que foi o reitor da Universidade Central de las Villas, Andrés Castro, que comunicou sua expulsão aos estudantes de jornalismo.
Na terça-feira, o centro acadêmico da universidade respaldou a decisão de expulsar Pérez por meio de uma nota. Segundo o comunicado da universidade, “a estudante Karla Perez não apoia o projeto social cubano“.
“Karla pode estudar em uma instituição revolucionária que tem como principal objetivo a formação integral dos estudantes como profissionais competentes, comprometidos com a Revolução e portadores dos mais eminentes valores do ser humano?”, questiona o comunicado da universidade, intitulado “Nossas razões“.
A BBC Mundo entrou em contato com a universidade, mas ninguém foi encontrado para comentar o caso.
Apelação
Enquanto aguarda a notificação oficial da expulsão, Pérez já planeja quais serão seus próximos passos.
“Vou fazer uma reclamação formal e apelar da decisão. Recorrerei a todas as instâncias e aos mecanismos legais e burocráticos possíveis. Ou seja, vou apelar na universidade, escrever uma carta ao ministro, e se nada disso der certo, vou começar a bater nas portas”, enumerou a estudante.
Ela acrescenta que não quer permanecer apenas com seu diploma do Ensino Médio. “Quero ter um diploma universitário. Quero estudar jornalismo e, se não puder fazer isso em Cuba, será em outro lugar do mundo“, afirmou ela.
‘Não aprendemos’
O caso repercutiu no próprio país. “Somos brutos, covardes, passam-se décadas e não aprendemos”, escreveu em seu blog oficial, “Segunda Cita”, o conhecido compositor cubano Silvio Rodríguez.
Expoente da Nova Trova Cubana – movimento musical de grande influência que surgiu no final da década de 60 – classificou a decisão como uma “injustiça” e um ato “torpe e obtuso”. Como Rodríguez, muitos cubanos expressaram indignação e surpresa pelo que ocorreu com a jovem de 18 anos.
O caso de Pérez não é o primeiro em que um estudante ou professor é afastado de uma universidade por pensar diferente do regime.
// BBC