O nome dele era Mohammed Shohayet e o bebê é hoje o rosto da tragédia humana que persegue todo o mundo. Este bebê de 16 meses morreu afogado num rio quando tentava fugir com os pais da violência que assola a etnia a que pertence, os rohingya, na Birmânia.
A foto do pequeno Mohammed morto, com a cara na lama, na margem de um rio no Bangladesh – onde se afogou com a mãe, o irmão de três anos e um tio – preenche vários jornais em todo o mundo.
É uma imagem “chocante”, que traz à memória a famigerada foto de Aylan Kurdi, a criança síria que morreu afogada em 2015, quando viajava com os pais para tentar chegar ao porto seguro da Europa.
Esta nova foto trágica foi divulgada pela CNN, que teve acesso a ela através do pai de Mohammed, Zafor Alam, que conta que o filho de 16 meses morreu afogado, com a mãe e o irmão, quando tentavam chegar ao Bangladesh, fugindo das perseguições que os rohingya, uma minoria étnica muçulmana, sofrem no estado de Rakhine, na Birmânia.
“Na nossa aldeia, os helicópteros dispararam armas contra nós e os soldados de Myanmar [nome oficial da Birmânia atualmente] também abriram fogo sobre nós. Não podíamos ficar nas nossas casas. Fugimos e fomos esconder-nos na selva”, conta Zafor Alam na CNN.
“O meu avô e a minha avó foram queimados até à morte. A nossa aldeia inteira foi queimada pelos militares. Nada restou”, queixa-se ainda este rohingya que está refugiado num campo de migrantes no Bangladesh.
“Chocar os leitores” para alertar consciências
É perante este cenário de terror que o jornal português Diário de Notícias justifica a publicação da foto na capa, assumindo a “opção consciente de chocar os leitores”. “Porque nos sentimos obrigados a não ter a desculpa de poder dizer que não sabíamos“, sublinha o diretor do jornal, Paulo Baldaia, no editorial desta quinta-feira.
Realçando que “ninguém nos pode garantir que [a foto] seja verdadeira”, Paulo Baldaia sustenta que, mesmo assim, o jornal decidiu publicá-la porque não tem “a mínima dúvida da perseguição de que são vítimas os muçulmanos rohingya na Birmânia”.
A imagem “revela que o terrorismo religioso não tem fronteiras, nem escolhe zonas do globo para estar em destaque”, frisa ainda o diretor do jornal.
Governo nega abusos
Há poucos dias, surgiu nas redes sociais um vídeo com policiais agredindo elementos desta minoria muçulmana.
No entanto, uma comissão do governo que investiga a violência em Rakhine, onde vivem mais de um milhão de rohingya, negou que as forças de segurança tenham cometido quaisquer abusos.
A Birmânia tem sido criticada pelos alegados abusos do exército contra esta minoria e organizações internacionais acusaram os militares de execuções, violações e queima de casas em aldeias da comunidade rohingya, avança a agência Lusa.
A agência de notícias portuguesa refere de um relatório interno, divulgado pela comissão governamental birmanesa, que rejeita as alegações de que as forças de segurança tenham cometido abusos ou se tenham envolvido numa campanha para expulsar os rohingya.
A dimensão da população “bengalesa”, mesquitas e edifícios religiosos na área atingida pela agitação “são a prova de que não houve casos de genocídio ou perseguição religiosa”, afiança a comissão num comunicado difundido nos meios de comunicação social estatais, conforme cita a Lusa.
Este comunicado surge após o governo ter procedido à detenção de quatro policiais, no seguimento do vídeo reproduzido acima, filmado por um polícia, e que mostra imagens dos agentes a baterem e a darem pontapés em elementos da etnia rohingya.
A ONU considera que os rohingya são uma das minorias mais perseguidas em todo o mundo. O governo da Birmânia não lhes reconhece a cidadania, considerando-os imigrantes bengaleses e lhes impondo restrições, nomeadamente a privação de movimentos, aponta a Lusa.
SV, Ciberia // ZAP