Uma morte misteriosa em plena luz do dia, em um aeroporto movimentado. Foi desta forma, com suspeitos desconhecidos e diversas versões para um suposto envenenamento, que Kim Jong-nam, meio-irmão exilado do ditador norte-coreano, Kim Jong-un, foi assassinado, na segunda-feira, em Kuala Lumpur.
Pouco antes de morrer, Kim Jong-nam, que já havia criticado o regime do irmão, teria dito que fora atacado por duas mulheres enquanto esperava um voo para Macau, onde estava radicado desde a década passada.
Sua morte, porém, está envolta numa aura de mistério com diversas versões — o que fez a Coreia do Sul decidir realizar na quarta-feira uma reunião do Conselho de Segurança Nacional.
A rede de TV YTN, citando fontes do governo malaio, diz que Kim Jong-Nam teria sido atingido com uma agulha envenenada. No entanto, a agência de notícias Bernama cita policiais que alegam que uma mulher cobriu o rosto de Kim Jong-nam com um pano embebido num líquido que fez seus olhos queimarem.
Já o diário malaio “Star” cita um policial, Fadzil Ahmat, segundo o qual o irmão do líder da Coreia do Norte disse ter sido agarrado por trás por uma mulher que derramara um líquido sobre seu rosto. Um outro relato fala ainda num ataque com spray. A polícia malaia não se manifestou oficialmente.
Embora não tenha apresentado qualquer evidência que sustente sua tese, o deputado sul-coreano Kim Young-woo acredita que o líder norte-coreano Kim Jong-un esteja por trás do assassinato.
“Não se remove alguém que está há tanto tempo longe de seu país natal, sem fazer nada de importante, de uma hora para outra”, afirmou Kim Young-woo”. “Há indícios de que Kim Jong-nam tinha seguidores, e que seu irmão se sentia inseguro com sua popularidade”.
Fontes americanas também indicaram à Reuters, sob anonimato, a crença de que o líder norte-coreano Kim Jong-un seja culpado do assassinato.
Nascido em 1971, Kim Jong-nam era filho da atriz Song Hye-rim, forçada a abandonar o marido para viver com o então ditador norte-coreano, Kim Jong-il. Por esse motivo, de acordo com Cheong Seoeng-chang, analista de lideranças norte-coreanas do Instituto Sejong, na Coreia do Sul, ele era considerado um filho ilegítimo, e cresceu isolado.
Embora tenha sido matriculado numa escola de Genebra em 1980, sua avó o levou de volta a Pyongyang no fim da adolescência, já que o jovem desenvolvera sinais de alcoolismo, diz Cheong.
No fim da década de 1990, o filho mais velho do ditador norte-coreano passou a trabalhar no Ministério de Segurança Pública. Kim Jong-nam, no entanto, caiu em desgraça anos mais tarde, depois de ser detido, ao lado do filho, tentando entrar no Japão com um passaporte falso da República Dominicana.
Embora tenha afirmado que queria apenas conhecer a versão japonesa da Disneylândia, em Tóquio, Kim Jong-nam foi deportado para a capital norte-coreana, e o incidente, somado ao exílio de sua mãe, que fugiu para a Rússia e morreu no ano seguinte, fez com que seu pai se afastasse dele e nomeasse sucessor seu irmão mais novo, Kim Jong-un.
Após o incidente, Kim Jong-nam se radicou em Macau, onde ganhou notoriedade por jogar intensamente nos cassinos locais e pela constante embriaguez.
Rumores que indicavam uma transferência planejada para lavar dinheiro do regime norte-coreano em bancos e cassinos levaram a instituição financeira Delta Asia a cortar todos os laços com a Coreia do Norte em 2007, depois de o Tesouro americano acusá-la de agir em conluio com Pyongyang.
Em entrevista de 2010 à rede de TV japonesa Asahi, Kim Jong-nam disse estar disposto a ajudar Kim Jong-un quando ele “precisasse de apoio do exterior”, deixando claro o desinteresse em se tornar o próximo líder da Coreia do Norte.
Porém, em outra entrevista ao diário “Tokyo Shimbun”, Kim Jong-nam afirmou que a educação ocidental o levou a questionar o regime, fazendo com que passasse a ser visto com desconfiança.
Ao contrário de diversos membros da família, Kim Jong-nam não tinha título oficial nem qualquer participação no governo norte-coreano. Com a chegada de Kim Jong-un ao poder, ele voltou a criticar a transferência hereditária de poder no país, e descreveu o regime como “uma piada para o mundo”.
Na Coreia do Norte, execuções de parentes do Querido Líder — que assumiu o título do pai — não são novidade.
O Instituto de Segurança Nacional da Coreia do Sul afirma que Kim Jong-un mandou executar 340 pessoas desde que chegou ao poder em 2011, entre as quais o próprio tio, Jang Song-thaek, em 2013. Segundo o “Daily Mail”, um agente norte-coreano tentou assassinar Kim Jong-nam em Macau, em 2011, mas foi baleado por guarda-costas.
“Kim Jong-nam estava exilado há anos, mas continuava sendo o filho mais velho de Kim Jong-il”, afirmou Namkoong Young, da Universidade Hankuk, em Seul. “Caso houvesse algum plano da elite para remover Kim Jong-un, seu irmão deveria ser eliminado“.
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