Um professor de Cambridge, refugiado curdo que vive no Reino Unido, ganhou um dos prêmios mais prestigiosos do mundo da matemática. Em poucos minutos, porém, teve sua medalha de ouro 14 quilates roubada – no Brasil, onde foi realizada a cerimônia de entrega.
Segundo o jornal O Globo, ele deixou a medalha, sua carteira e celular em uma pasta sobre uma mesa na sala de convenções onde o evento acontecia. Quando percebeu que a medalha não estava mais lá, alertou seguranças. A pasta foi encontrada, mas dentro dela só havia o celular.
Birkar, de 40 anos, nasceu em uma fazenda no Curdistão, uma província do Irã perto da fronteira com o Iraque. Era o terceiro de seis filhos que cresceram em Marivan, de cerca de 200 mil habitantes, em meio à guerra de oito anos entre os dois países que começou em 1980.
Seu pai, segundo a revista Quanta, estudou na escola por apenas alguns anos; sua mãe não teve educação formal alguma. Ele e os irmãos tiveram aulas na escola de seu bairro.
“Meu período na escola foi caótico com a guerra entre Irã e Iraque e a economia muito ruim”, disse ele ao jornal britânico Guardian. “Meus pais são fazendeiros, então passei grande parte do tempo trabalhando na fazenda. Não era um lugar ideal para crianças que estavam interessadas em matemática.”
Quando estava na quinta série, Birkar começou a notar que gostava de matemática: “Eu sentia algo. Nada sério, era só uma sensação de que eu era bom em matemática”, disse.
Segundo ele, foi seu irmão quem lhe apresentou para técnicas mais avançadas de matemática.
À Quanta, ele disse que, já mais velho, admirava os ganhadores da medalha Fields – fotos deles cobriam as paredes do clube de matemática onde Birkar treinava, depois de ter mudado para Teerã.
“Olhava para elas e me perguntava: ‘Será que um dia vou conhecer essas pessoas?’ Naquela época, no Irã, não sabia que ir para o Ocidente seria possível”, afirmou.
Depois de concluir a graduação da Universidade de Teerã, em 2000, viajou para o Reino Unido e pediu asilo político ali por causa de sua identidade curda, minoria étnica que sofreu repressão no Irã. Concluiu seu doutorado na Universidade de Nottingham em 2004, com a tese Topics in modern algebraic geometry (Tópicos na geometria algébrica moderna, em tradução livre).
Seu orientador de doutorado, Ivan Fesenko, contou ao Guardian que, quando ele chegou para estudar com ele, Birkar falava pouco inglês. O governo britânico ainda estava processando seu pedido de asilo.
“Eu tive uma ideia: ‘Vou lhe dar um problema para resolver, e esse será o tema de seu doutorado”, disse Fesenko. “Um doutorado normalmente dura três ou quatro anos. Passei um problema a ele e ele o resolveu em três meses“, disse Fesenko.
Birkar estabeleceu uma reputação na academia com seu trabalho sobre geometria birracional.
Em publicações de 2016, ele demonstrou como um número infinito de funções polinomiais podem ser definidas por um número finito de características.
Hoje, Birkar vive em Cambourne, no Reino Unido, uma comunidade a 15 quilômetros de Cambridge, na Inglaterra. É professor da Universidade de Cambridge, uma das mais prestigiosas do mundo.
Em um dia típico, trabalha em seu escritório – há dias em que escreve apenas uma página -, levanta e caminha para refletir, faz chá e escuta música clássica ou contemporânea curda, segundo a Quanta. Gosta de andar de bicicleta pelo bairro. É descrito por colegas como focado e tímido.
A medalha que ganhou e lhe foi roubada, a Fields, é entregue a cada quatro anos – em uma cidade diferente – para os matemáticos “mais promissores” com menos de 40 anos.
Cada ganhador recebe cerca de R$ 42 mil.
Ciberia // BBC