STF deixa caminho livre para Janot, mas futuro de nova denúncia contra Temer fica incerto

Beto Barata / PR

Michel Temer

O Supremo Tribunal Federal deixou o caminho livre para o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentar nova denúncia contra o presidente Michel Temer nesta semana, antes de deixar o cargo no domingo (17). No entanto, devido aos questionamentos sobre a legalidade da delação da JBS, persiste a insegurança jurídica sobre o futuro de uma eventual denúncia.

Nesta quarta-feira (13), a Corte recusou por unanimidade o pedido da defesa de Temer para declarar Janot suspeito e, portanto, impedido de processar o presidente.

Porém, o STF não se pronunciou sobre outra solicitação dos advogados, uma questão de ordem para que a PGR ficasse impedida de apresentar denúncia com base na delação da JBS até que as investigações sobre sua legalidade fossem concluídas.

Pouco depois das 18h desta quarta, a presidente do STF, Cármen Lúcia, decidiu adiar para a próxima quarta-feira (20) esse julgamento, sob a justificativa de que estava tarde e que nesta quinta a Corte já tinha outras ações em pauta.

Como não houve decisão do STF, o decano da Corte, ministro Celso de Mello, disse que não há impedimento para que Janot denuncie Temer. Não está claro, no entanto, se o Supremo pode na semana que vem derrubar essa eventual denúncia, ao julgar o segundo pedido da defesa de Temer.

De acordo com juristas ouvidos pela BBC, o STF pode tanto suspender o andamento de uma eventual denúncia até o fim das investigações, quanto decidir encaminhar a denúncia direto para análise da Câmara dos Deputados.

Nesse caso, a decisão sobre a validade do uso da delação com as investigações ainda em curso passaria para o momento de análise do recebimento da denúncia. Segundo a Constituição, o Supremo só pode avaliar o recebimento da denúncia para abertura de um processo contra o presidente caso obtenha a autorização de 342 dos 513 deputados.

Em agosto, a Câmara rejeitou uma primeira denúncia contra Temer que acusava o presidente de corrupção passiva com base na delação da JBS.

Agora, a expectativa é que Janot use a delação de Lúcio Funaro, tido como operador de propina do PMDB, para reforçar as acusações contra o presidente levantadas na delação da JBS, e o acuse de obstrução de Justiça e formação de quadrilha.

O presidente nega qualquer ilegalidade e acusa o procurador-geral de perseguição política.

Caminho para a Câmara

Para a professora de processo penal da PUC-Minas Flaviane Barros parece mais provável que o STF encaminhe uma segunda denúncia diretamente para a Câmara.

“Na primeira denúncia, o Supremo não analisou sua regularidade e mandou direto à casa legislativa. Se eles seguirem o mesmo processamento, se forem manter a coerência, me parece que ao Supremo não caberá analisar isso (a regularidade da segunda denúncia)”, afirmou.

Se Janot de fato apresentar a denúncia nesta semana, o advogado criminalista Juliano Breta, ex-presidente da OAB do Paraná, acredita que o STF pode entender que o pedido de Temer para impedir seu oferecimento está “prejudicado”.

Nesse caso, ressalta ele, a defesa do presidente pode apresentar um “aditamento” da questão de ordem solicitando que o STF suspenda o andamento da denúncia – ou seja, que não a encaminhe para a Câmara – até o fim das investigações sobre a delação da JBS.

As acusações da defesa de Temer contra o procurador-geral ganharam novo fôlego após a divulgação na semana passada de um “autogrampo” entre Joesley Batista, dono da JBS, e Ricardo Saud, um dos diretores do grupo.

Na conversa, há indícios de que a delação premiada teria sido discutida com a PGR, por meio do ex-procurador da República Marcello Miller, antes mesmo da gravação da conversa entre Batista e Temer, o que seria ilegal.

Para Breta, Janot ficou muito fragilizado e o ideal seria deixar que sua sucessora, Raquel Dodge, decidisse sobre a apresentação ou não de nova denúncia contra Temer. Dodge assume o comando do Ministério Público Federal (MPF) na segunda-feira (18).

“Não há dúvida de que a fragilização do atual procurador é gigantesca. Diante de toda essa crise que se abateu sobre ele, teria motivo para oferecer um denúncia no apagar das luzes contra o presidente da República? Não é uma denúncia qualquer, disse.

“O ideal seria que ficasse para o crivo da próxima procuradora-geral. A PGR renova sua credibilidade na próxima semana porque assume uma pessoa que está fora desse foco das críticas a respeito da participação e da aceitação do acordo da JBS”, acrescentou.

Para o coordenador do curso de direito da FGV-Rio, Thiago Bottino, o “normal” seria Janot esperar o fim das investigações para apresentar uma denúncia.

“Se o Janot ainda tivesse um ano de mandato, ele esperaria, para estar numa posição mais confortável ao apresentar a denúncia. Caso fique comprovado ao fim da investigação alguma ilicitude na delação, o Supremo pode anular esse ato (a eventual segunda denúncia), como sempre acontece no Judiciário”, ressaltou.

“Atuação responsável, legítima e independente”

Janot recebeu algum alento com a decisão unânime do STF de rejeitar o pedido da defesa de Temer para declarar sua suspeição. Os ministros entenderam não haver qualquer comprovação de que Janot aja motivado por “inimizade capital” com Temer. O resultado era esperado, já que a Corte têm jurisprudência bem rigorosa ao analisar esse tipo de pedido.

Ao votar, o ministro Celso de Mello, decano da corte, fez uma espécie de desagravo ao procurador-geral. “Não posso deixar de reconhecer a atuação responsável, legítima e independente do eminente procurador-geral da República, doutor Rodrigo Janot, que tem exercido a chefia do Ministério Público da União com grande seriedade”, afirmou.

Ao acusar Janot de “parcialidade”, a defesa de Temer sustentou que procuradores subordinados a Janot orientaram a atuação de delatores da JBS, como Joesley Batista, hoje preso. Ministros consideraram, porém, que Janot não pode ser dado como suspeito por eventuais ações de outras pessoas.

O relator do caso, Edson Fachin, disse ainda que não analisaria a legalidade das provas coletadas na delação da JBS, já que a Câmara dos Deputados, ao rejeitar o andamento da primeira denúncia contra o presidente, não autorizou o STF a julgar o caso.

Outro elemento que na visão da defesa indicaria suspeição do procurador-geral seria a decisão de “fatiar” as denúncias contra Temer em vez de apresentar uma única peça de acusação.

Fachin, porém, considerou que Janot tem “independência funcional” para formular acusações e que o fatiamento das denúncias não poderia ser motivo para suspeição “na medida em que cada apuração é marcada por amadurecimento em lapso temporal próprio”.

Seu voto foi acompanhado por todos os presentes. Não participaram do julgamento os ministros Roberto Barroso, que está em viagem fora do Brasil, e Gilmar Mendes, este último o maior crítico de Janot no STF e alvo de um pedido de suspeição do procurador-geral.

A assessoria de Mendes informou que o ministro “acompanhou o julgamento do seu gabinete e, por não haver controvérsia, continuou despachando”.

O ministro depois compareceu para a segunda parte da sessão, quando teve início o debate sobre o pedido para suspender a possibilidade de denúncia contra Temer. O julgamento, porém, foi encerrado antes de os ministros votarem.

Ciberia // BBC

COMPARTILHAR

DEIXE UM COMENTÁRIO:

Como é feito o café descafeinado? A bebida é realmente livre de cafeína?

O café é uma das bebidas mais populares do mundo, e seus altos níveis de cafeína estão entre os principais motivos. É um estimulante natural e muito popular que dá energia. No entanto, algumas pessoas preferem …

“Carros elétricos não são a solução para a transição energética”, diz pesquisador

Peter Norton, autor do livro “Autonorama”, questiona marketing das montadoras e a idealização da tecnologia. Em viagem ao Brasil para o lançamento de seu livro “Autonorama: uma história sobre carros inteligentes, ilusões tecnológicas e outras trapaças …

Método baseado em imagens de satélite se mostra eficaz no mapeamento de áreas agrícolas

Modelo criado no Inpe usa dados da missão Sentinel-2 – par de satélites lançado pela Agência Espacial Europeia para o monitoramento da vegetação, solos e áreas costeiras. Resultados da pesquisa podem subsidiar políticas agroambientais Usadas frequentemente …

Como o Brasil ajudou a criar o Estado de Israel

Ao presidir sessão da Assembleia Geral da ONU que culminou no acordo pela partilha da Palestina em dois Estados, Oswaldo Aranha precisou usar experiência política para aprovar resolução. O Brasil teve um importante papel no episódio …

O que são os 'círculos de fadas', formações em zonas áridas que ainda intrigam cientistas

Os membros da tribo himba, da Namíbia, contam há várias gerações que a forte respiração de um dragão deixou marcas sobre a terra. São marcas semicirculares, onde a vegetação nunca mais cresceu. Ficou apenas a terra …

Mosquitos modificados podem reduzir casos de dengue

Mosquitos infectados com a bactéria Wolbachia podem estar associados a uma queda de 97% nas infecções de dengue em três cidade do vale de Aburra, na Colômbia, segundo o resultado de um estudo realizado pelo …

Chile, passado e presente, ainda deve às vítimas de violações de direitos humanos

50 anos após a ditadura chilena, ainda há questões de direitos humanos pendentes. No último 11 de setembro, durante a véspera do 50° aniversário do golpe de estado contra o presidente socialista Salvador Allende, milhares de …

Astrônomos da NASA revelam caraterísticas curiosas de sistema de exoplanetas

Os dados da missão do telescópio espacial Kepler continuam desvendando mistérios espaciais, com sete exoplanetas de um sistema estelar tendo órbitas diferentes dos que giram em torno do Sol. Cientistas identificaram sete planetas, todos eles suportando …

Em tempos de guerra, como lidar com o luto coletivo

As dores das guerras e de tantas tragédias chegam pelas TV, pelas janelinhas dos celulares, pela conversa do grupo, pelos gritos ou pelo silêncio diante do que é difícil assimilar e traduzir. Complicado de falar …

Pesquisa do Google pode resolver problemas complexos de matemática

O Google anunciou uma série de novidades para melhorar o uso educativo da busca por estudantes e professores. A ferramenta de pesquisa agora tem recursos nativos para resolver problemas mais complexos de matemática e física, inclusive …