Foi uma falha sem precedentes. Do nada, em meados de 1982, um grupo de cientistas confirmou o primeiro terremoto na Antártida, mas não seria o último. Centenas de tremores ocultos podem estar enterrados sob o gelo da Antártida, aponta um novo estudo.
Com o passar das décadas, os pesquisadores detectam mais oito eventos sísmicos na Antártida Oriental. E lá, um inferno: os sensores captaram 27 terremotos só em 2009, triplicando o número total de eventos sísmicos registrado em apenas um ano.
Mas não foi a catástrofe planetária ou a ira divina por trás dos tremores de terra nunca antes registrados por aquelas bandas – foi apenas o método científico em ação.
“Em última análise, a falta de sismicidade registrada não foi devido à falta de eventos, mas à falta de instrumentos perto o suficiente para serem capazes de registrá-los”, explicou a sismóloga Amanda Lough, da Universidade de Drexel, nos EUA.
Enquanto o estranho silêncio da Antártica relativamente à atividade sísmica era alvo de inúmeras hipóteses científicas, Lough mostrou que não se tratava apenas de uma peculiaridade tectônica manter intacta a infinita paisagem branca – era apenas uma questão de falta de dados.
Em 2007, a sismóloga começou uma tarefa épica que levaria muitos anos para completar: instalar o GAMSEIS/AGAP, um conjunto de sismógrafos de banda larga na Antártida Oriental, dando aos cientistas uma visão sem precedentes sobre a atividade sísmica da região.
Como demonstram os dados de 2009, a Antártida sofre sua parte de terremotos e movimentos sísmicos assim como todo o resto do planeta, mas só agora os cientistas conseguiram registrar observações para provar isso.
“Não é mais uma anomalia“, explicou, observando que os resultados obtidos em 2009 levaram a equipe de pesquisa a retornar ao local, com “um pouco mais de verificação para garantir que os eventos fossem mesmo reais e que a equipe fosse capaz de localizá-los com precisão“.
No novo estudo, publicado na semana passada na Nature, os pesquisadores explicam que a Antártida Oriental é um cratão – um grande e estável pedaço de rocha na crosta terrestre subjacente aos continentes.
Apesar de alguns cientistas terem argumentado que a atividade sísmica da Antártida pudesse ser suprimida pelo imenso peso da camada de gelo continental, as novas pesquisas mostram que esse não é o caso.
A maioria dos 27 terremotos registrados em 2009 foram resultado de fendas – regiões na crosta terrestre onde a rocha é dilacerada.
“As fendas proporcionam zonas de fraqueza que permitem que as falhas ocorram mais facilmente, e pode ser que a situação na Antártida seja tal que a atividade sísmica esteja ocorrendo preferencialmente ao longo dessas áreas de fraqueza pré-existentes”, explicou Lough em comunicado à imprensa.
A pesquisadora notou ainda que as novas descobertas são baseadas em dados de apenas um ano e, por isso, é necessário que se façam mais pesquisas para obter uma visão completa sobre o fenômeno.
Mas isso mostra apenas como os cientistas, sem as ferramentas certas para registrar e detectar fenômenos físicos, ficam cegos – e, portanto, todos nós.
E enquanto em retrospectiva o ponto cego do leste da Antártida parece incrível, a verdade é que ainda há muita coisa que não estamos registrando adequadamente em termos de atividade sísmica global.
“A Antártida é o continente do qual menos recolhemos dados analíticos, mas também existem outras áreas do planeta de que temos“, disse Lough.
“O oceano cobre 71% do planeta, mas é caro e muito difícil conseguir dados de lá. Precisamos pensar em melhorar a cobertura e depois melhorar sua densidade”, concluiu.
Ciberia // ZAP