É possível que estejamos dentro de uma grande bolha dentro do cosmos, de acordo com um pesquisador que tenta esclarecer os mistérios da constante de Hubble, um número que indica a velocidade atual da expansão do universo.
E pode ser que nossa bolha – que teria um diâmetro de até 250 milhões de anos-luz – não seja a única, mas apenas uma de muitas bolhas cósmicas espalhadas por aí.
Não é uma novidade para os astrônomos que o universo está em constante expansão, mas ainda é um desafio saber com que velocidade as coisas estão se afastando uma da outra. Existem diferentes abordagens para calcular a taxa de expansão, todas bastante precisas na teoria, mas cada uma apresenta diferentes resultados.
Por exemplo, cientistas da ESA (a agência espacial europeia) usaram dados do telescópio espacial Planck e estimaram que a taxa hoje seja de 67,4 km/s para 1 megaparsec. Já cálculos usando as estrelas pulsantes Cefeidas sugerem que o valor é de 73.4 km/s para 1 megaparsec. E essas não são as únicas abordagens teoricamente eficazes com resultados diferentes. Então, fica a pergunta: o que está acontecendo?
Até agora, os cientistas têm buscado novos métodos que ofereça o resultado definitivo, mas talvez a resposta não esteja nos diferentes números obtidos, e sim na compreensão do que cada um deles está nos dizendo.
Lucas Lombriser, físico teórico da Universidade de Genebra, sugere que talvez estejamos vivendo em uma “bolha Hubble” local, uma área gigantesca no espaço que é comparativamente menos densa que o resto do universo. Essa hipótese não é nova – está entre nós há mais de duas décadas. Lombriser se baseou em pesquisas anteriores, delimitando as possíveis dimensões e características dessa suposta bolha, em um artigo para tentar responder o mistério da Constante de Hubble.
Em outras palavras, a diferença entre os resultados das medições de velocidade da expansão pode ser o resultado de não se considerar a densidade da região onde estamos localizados no universo em relação à densidade média da matéria no cosmos. “Sabemos que o universo próximo é altamente não homogêneo“, explicou Lombriser. “As densidades de partículas no solo, na atmosfera ou no espaço entre a Terra e a Lua/Sol são muito diferentes”.
Isso não se limita às densidades do Sistema Solar. Em escalas muito maiores, como o espaço intergalático, essas variações ainda podem ocorrer. Em seu novo artigo, Lombriser propõe que a Terra pode estar em uma região relativamente “vazia”, ou seja, de baixa densidade, que se estende ao longo de um raio de aproximadamente 125 milhões de anos-luz, ou um diâmetro total de 250 milhões de anos-luz.
Lombriser ainda alega que não é preciso nada especial para a formação de tais bolhas sub-densas. “Tais regiões são relativamente frequentes no cosmos na teoria cosmológica padrão”, afirma. Se a nossa bolha local, por exemplo, tiver cerca da metade da matéria que existe na média cósmica, talvez seja por isso que continuamos obtendo resultados diferentes para a constante de Hubble.
Alguns cientistas calcularam as distâncias das supernovas para estimar a taxa de expansão do universo, mas se a ideia de Lombriser estiver correta, os resultados dessa abordagem podem ficar ligeiramente distorcidos se não for considerada a quantidade de matéria em nossa vizinhança. Como o valor fornecido pelo satélite Planck é baseado em observações da radiação cósmica de fundo em micro-ondas, uma fonte de radiação muitíssimo antiga, essa medição deve fornecer um resultado mais confiável.
Tudo isso, no entanto, é apenas uma hipótese. Para colocá-la à prova, serão necessários modelos e observações para determinar se distribuições desiguais de matéria em todo o universo podem explicar as discrepâncias entre as diferentes taxas de expansão encontradas até agora. Lombriser espera que novos campos, como a astronomia das ondas gravitacionais, que mede ondulações no tecido do espaço-tempo, possam ajudar a resolver o problema.
Uma onda gravitacional, criada por uma colisão de estrelas de nêutrons, foi detectada em 8 de agosto de 2017. Os cientistas rastrearam o sinal dela em volta a uma galáxia chamada NGC 4993, juntamente com a luz do fenômeno. “Isso nos permitiu saber não apenas a distância do evento, mas também o desvio para o vermelho, o que significa que podemos usá-lo como uma ‘sirene padrão’ que mede a taxa de expansão do cosmos“, disse Lombriser.
Até agora, esse evento, conhecido como GW170817, é a nossa única “sirene padrão”, “A galáxia NGC 4993 está em nossa bolha local, portanto, a taxa de expansão deve concordar com a medição local, e não com a global”, explica. Em outras palavras, as ondas gravitacionais que acontecem dentro do raio de 125 milhões de anos-luz vão nos fornecer uma constante de Hubble semelhante à que obtemos a partir de supernovas.
Resolver as discrepâncias nos resultados é essencial para entender as forças por trás da expansão cada vez mais rápida do universo. “Com mais eventos de ondas gravitacionais, devemos ser capazes de reduzir essa incerteza e obter uma melhor medição de nossa densidade local”, disse Lombriser.
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