O presidente Jair Bolsonaro foi alvo de duras críticas após discursar durante um ato em Brasília pró-intervenção militar. Políticos e organizações se posicionaram veementemente contra qualquer hipótese de uma intervenção militar no país e criticaram a presença do presidente na manifestação.
A cúpula militar, por sua vez, estaria tentando minimizar a participação de Bolsonaro no ato e descartando um risco à democracia.
O protesto, realizado neste domingo (19/04) em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília, reuniu dezenas de defensores do governo que se aglomeraram para ouvir o presidente, contrariando as orientações de distanciamento social da Organização Mundial da Saúde (OMS) por conta da covid-19. O novo ministro da Saúde, Nelson Teich, não se pronunciou sobre o assunto – diferente de seu antecessor, Luiz Henrique Mandetta, que chegou a repreender Bolsonaro por sair às ruas.
Antes da fala de Bolsonaro, manifestantes entoaram gritos como “AI-5”, “fecha o Congresso” e “fecha o STF”. Muitos dos manifestantes carregavam faixas com a frase “intervenção militar já com Bolsonaro”, contrariando a Constituição brasileira.
Nesta segunda-feira, aparentemente incomodado com as críticas à sua participação, o presidente disse ser contra o fim da democracia e o fechamento do Supremo Tribunal Federal (STF). “No que depender do presidente Jair Bolsonaro, democracia e liberdade acima de tudo”, disse ele a jornalistas em Brasília. “O pessoal geralmente conspira para chegar no poder. Eu já estou no poder. Eu já sou o presidente da República. […] Eu sou realmente a Constituição.”
Um dos mais visados pelos manifestantes no domingo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou ser uma “crueldade imperdoável” pregar uma ruptura democrática em meio às mortes em decorrência da pandemia de covid-19, a doença respiratória causada pelo novo coronavírus.
“O mundo inteiro está unido contra o coronavírus. No Brasil, temos de lutar contra o corona e o vírus do autoritarismo. É mais trabalhoso, mas venceremos. Em nome da Câmara dos Deputados, repudio todo e qualquer ato que defenda a ditadura, atentando contra a Constituição”, escreveu Maia em sua conta no Twitter.
“São, ao todo, 2.462 mortes registradas no Brasil. Pregar uma ruptura democrática diante dessas mortes é uma crueldade imperdoável com as famílias das vítimas e um desprezo com doentes e desempregados”, prosseguiu Maia. “Não temos tempo a perder com retóricas golpistas.”
Além da indisposição com o presidente da Câmara, Bolsonaro tem se envolvido em atritos com governadores e o Supremo Tribunal Federal (STF). “Tempos estranhos! Não há espaços para retrocesso. Os ares são democráticos e assim continuarão. Visão totalitária merece a excomunhão maior. Saudosistas inoportunos. As instituições estão funcionando”, disse Marco Aurélio Mello, ministro do STF.
“É assustador ver manifestações pela volta do regime militar, após 30 anos de democracia. Defender a Constituição e as instituições democráticas faz parte do meu papel e do meu dever”, disse Luís Roberto Barroso, também ministro do Supremo.”Só pode desejar intervenção militar quem perdeu a fé no futuro e sonha com um passado que nunca houve.”
“Lamentável que o presidente da República apoie um ato antidemocrático, que afronta a democracia e exalta o AI-5. Repudio também os ataques ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal. O Brasil precisa vencer a pandemia e deve preservar sua democracia”, disse o governador de São Paulo, João Doria (PSDB).
“Em vez de o presidente incitar a população contra os governadores e comandar uma grande rede de fake news para tentar assassinar nossas reputações, deveria cuidar da saúde dos brasileiros. Seguimos na missão de enfrentamento da covid-19“, escreveu o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC).
“Democracia não é o que o presidente Bolsonaro pratica: mandar o povo brasileiro para as ruas, correndo riscos de se contaminar, de tornar o nosso Brasil um país doente, em meio a uma grave crise de saúde mundial”, seguiu Witzel. “Democracia é ter responsabilidade com o que se fala. Democracia é respeitar o Congresso, as instituições e ter uma postura condizente com o cargo que se ocupa.”
Joice Hasselmann, deputada e líder do PSL (ex-partido de Bolsonaro) na Câmara, também repudiou a atitude do presidente. “Depois diz que o Congresso é que provoca o caos. @jairbolsonaro não respeita a democracia, as instituições e as liberdades. Você é a favor da democracia ou do AI-5?”, escreveu no Twitter.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso classificou a participação de Bolsonaro no ato de “lamentável“. “É hora de união ao redor da Constituição contra toda ameaça à democracia. Ideal que deve unir civis e militares; ricos e pobres. Juntos pela liberdade e pelo Brasil”, disse.