Tradicionalmente vistos como brutos e selvagens, os neandertais foram, na verdade, os primeiros artistas do mundo, criando pinturas em cavernas cerca de 20 mil anos antes da chegada da nossa espécie humana à Europa.
A conclusão é de um estudo publicado na Science que sugere que esses hominídeos fizeram pinturas em cavernas espanholas há cerca de 66 mil anos, ou seja, 20 mil anos antes da chegada do Homo sapiens à Europa.
Os neandertais seriam, assim, responsáveis pelas pinturas mais antigas do mundo em cavernas, o que muda a percepção que tínhamos até agora destes hominídeos.
Acreditava-se, até esse achado, que a produção artística era um comportamento único da espécie humana (a Homo sapiens) e que estava muito distante das habilidades dos nossos “primos” na linha evolutiva.
“Essa é uma descoberta incrível e empolgante que sugere que os neandertais eram muito mais sofisticados do que popularmente se acreditava”, refere o autor que liderou o estudo, Chris Standish, arqueólogo da Universidade de Southampton, no Reino Unido, em declarações divulgadas pelo Science Daily.
Mãos, padrões geométricos e círculos
Essas pinturas foram descobertas em três áreas arqueológicas, em diferentes partes da Espanha, em La Pasiega, Maltravieso e Ardales, localidades situadas até 700 quilômetros de distância entre si. Incluem impressões de mãos, padrões geométricos e círculos vermelhos.
A equipe de pesquisadores do Reino Unido, Alemanha, Espanha e França que as analisou usou uma técnica de medição chamada urânio-tório, que é utilizada para identificar com precisão a data de itens arqueológicos. A técnica se baseia na medição da degradação radioativa do urânio que é incorporado nas camadas minerais que cobrem as pinturas, explica a BBC.
Os resultados obtidos indicam que essas pinturas datam de há 65 mil anos, sendo que os humanos modernos só chegaram à Europa há cerca de 45 mil anos.
Deste modo, os pesquisadores concluem que a arte em cavernas só pode ter sido feita pelos neandertais, uma espécie “irmã” da Homo sapiens – e os únicos habitantes humanos da Europa naquela época.
As descobertas são sustentadas pela datação de conchas marinhas que foram perfuradas e pintadas com pigmentos para serem usadas como colares.
Dois de quatro exemplares analisados datam de 115 mil anos atrás – mais uma vez, muito antes de haver presença confirmada de humanos modernos na região.
Mudança de percepção
“Logo após a descoberta do primeiro dos seus fósseis, no século XIX, os neandertais passaram a ser retratados como brutos e sem cultura, incapazes de reproduzirem arte ou comportamentos simbólicos, e algumas dessas percepções persistem até hoje”, diz o Alistair Pike, cientista da Universidade de Southampton envolvido no estudo.
Pike nota que a nova descoberta acrescenta dados novos à “questão de quão semelhantes aos humanos (modernos) os neandertais eram”.
Artefatos simbólicos datados de há 70 mil anos já tinham sido encontrados na África, mas são associados a humanos modernos.
O pesquisador Paul Pettitt, coautor do estudo da Universidade de Durham, no Reino Unido, destaca que a nova descoberta permite concluir que “os neandertais criaram símbolos significativos em locais significativos”. “A arte não foi algo acidental que ocorreu uma só vez”, salienta.
“Temos exemplos em três cavernas distantes 700 quilômetros entre si e evidências de que se tratava de uma tradição antiga”, acrescenta Pettitt, que acredita que seria possível encontrar arte rupestre semelhante em outras cavernas da Europa “com origem neandertal”.
Ciberia // ZAP