Após o choque do ataque racista em Hanau e pressionado por todos os lados a reagir, o governo alemão anunciou nesta sexta-feira (21) um fortalecimento da vigilância policial, especialmente em torno das mesquitas, diante de uma ameaça “muito elevada” da extrema direita.
As homenagens em memória das nove vítimas dos tiroteios em Hanau, organizadas na quinta-feira (20) à noite em cerca de 50 cidades alemãs, deram lugar a um debate sobre armas, proteção de minorias e o papel panfletário do partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD).
O país registrou três ataques racistas e antissemitas em nove meses: do assassinato de um político pró-migrante até o massacre de Hanau, passando pelo ataque à sinagoga de Halle, em pleno Yom Kippur.
Nesse contexto, também marcado pelo desmantelamento de grupos que estariam prontos a agir, “não podemos mais falar de atos individuais (…), mas de um problema político. É hora de encarar”, resumiu nesta sexta-feira o jornal “Tagesspiegel”.
Diante deste “grande perigo para a democracia”, segundo a ministra da Justiça, Christine Lambrecht, o governo anunciou as novas medidas nesta sexta-feira. “Lugares sensíveis”, em particular os arredores de mesquitas, aeroportos e fronteiras, terão a segurança reforçada, informou o ministro do Interior, Horst Seehofer.
O governo de Angela Merkel já havia fortalecido significativamente seu arsenal legislativo e de segurança nos últimos meses, principalmente impondo novas obrigações às redes sociais para denunciar conteúdo de ódio, ou protegendo autoridades e ativistas.
Berlim tem, no entanto, dificuldades para combater todas as ameaças, em particular as encarnadas por indivíduos solitários, desconhecidos da polícia e legalmente armados, que passam à ação repentinamente, como o assassino de Hanau.
Esses “lobos solitários” que estão se radicalizando na Internet são “bombas-relógio que devemos combater com todos os meios que o Estado constitucional nos oferece”, argumentou a ministra da Justiça.
“O que já é feito no campo do jihadismo” em termos de vigilância on-line, incluindo aplicativos criptografados, “também deve ser realizado no extremismo de direita“, defende Peter Neumann, especialista em terrorismo no King’s College de Londres no “Die Welt”.
O autor do ataque de Hanau, desconhecido da polícia, tinha um site pessoal que misturava teorias raciais e conteúdo de teor conspiratório. Esses “sinais” devem ser antecipados com mais eficácia no futuro, argumenta Neumann.
Agressividade
Outro aspecto da ameaça diz respeito a um possível controle mais rigoroso sobre a posse de armas. Cerca de 5,4 milhões de armas estão em circulação no país, segundo o “Bild”. O Ministério do Interior está particularmente preocupado com o fato de a extrema direita radical estar adquirindo cada vez mais armas de todos os tipos. No contexto de investigações de delitos e crimes atribuídos a extremistas de direita, a polícia apreendeu 1.091 armas em 2018, um número muito superior às 676 apreendidas um ano antes.
Membros da direita conservadora CDU pediram um reforço da legislação sobre armas, uma aposta alta em um país que gosta da caça e do tiro esportivo, disciplina praticada pelo assassino de Hanau. “As armas automáticas não podem mais ser mantidas nas casas de indivíduos, incluindo atiradores esportivos”, considerou o “Frankfurter Allgemeine Zeitung” em seu editorial.
Finalmente, o drama de Hanau tem uma dimensão política em um país marcado pelo crescimento, a partir de 2013, da sigla de extrema direita. O AfD entrou no Parlamento alemão há dois anos.
Abertamente xenófobo e com lideranças que criticam em voz alta o arrependimento alemão sobre o nazismo, esse partido deve ser colocado “sob a vigilância” dos serviços de Inteligência, afirma o secretário-geral do social-democrata SPD, Lars Klingbeil.
“Alguém atirou em Hanau, mas muitos forneceram-lhe munição, e o AfD certamente foi um deles”, denunciou na emissora pública ARD. “O AfD é responsável pela polarização (…) e pela agressividade no discurso político”, resumiu Oliver Decker, especialista em extrema direita da Universidade de Leipzig.
// RFI