Dois ou três cafés por dia protegem as células da retina. Esta é a conclusão de um estudo realizado por cientistas das universidades de Coimbra (Portugal) e de Bona (Alemanha).
Em nota enviada à Lusa, a Universidade de Coimbra refere que o estudo abre caminho para o desenvolvimento de “abordagens terapêuticas para o tratamento de doenças da visão associadas a episódios isquêmicos, como a retinopatia diabética e glaucoma”.
Estas são duas das principais causas de cegueira a nível mundial. Na mesma nota, a Universidade de Coimbra indica que a isquemia da retina é uma complicação que está associada às doenças degenerativas da retina, que contribui para a perda de visão e cegueira.
A isquemia da retina “ocorre por oclusão de vasos sanguíneos, majoritariamente da artéria central da retina, de um ramo da artéria da retina ou por oclusão venosa”.
O estudo, liderado por Ana Raquel Santiago, pesquisadora no laboratório Retinal Dysfunction and Neuroinflammation da Faculdade Medicina da Universidade de Coimbra, foi realizado em modelos animais (ratos) e desenvolvido em duas fases, tendo sido publicado na Cell Death and Disease.
No início, foram avaliados os efeitos da cafeína nas células da micróglia – “células imunológicas que funcionam como os macrófagos da retina, mas que em situação de isquemia liberam substâncias nocivas que contribuem para o processo degenerativo”, explica a Universidade.
Os ratos começaram consumindo cafeína durante duas semanas ininterruptamente, tendo sido posteriormente sujeitos a um período transitório de isquemia ocular. Após a recuperação, voltaram a beber cafeína.
As análises revelaram que “a cafeína controla a reatividade das células da micróglia de forma a conferir proteção à retina, quando comparado com animais que bebiam água”, acrescenta a Universidade de Coimbra.
“Nas primeiras 24 horas, assistiu-se a uma ativação exacerbada das células da micróglia, indicando que, de alguma forma, a cafeína estava a promover um ambiente pró-inflamatório para depois garantir proteção e travar a progressão da doença”, refere a coordenadora do estudo.
Sabendo que a cafeína é um antagonista dos receptores de adenosina (envolvidos na comunicação do sistema nervoso central) e perante os primeiros resultados, a segunda fase do estudo centrou-se em testar o potencial terapêutico de um fármaco, a istradefilina, no controle do ambiente inflamatório após um episódio isquêmico da retina.
Este é um fármaco capaz de bloquear a ação dos receptores A2A de adenosina e que tem sido avaliado em outras doenças neurodegenerativas.
“Neste grupo de experiências, observou-se que a administração de istradefilina diminui a reatividade das células da micróglia, atenuando o ambiente pró-inflamatório e o dano causado pela isquemia transiente”, descreve Ana Raquel Santiago. Este fármaco foi testado pela primeira vez na retina, tendo sido administrado após o episódio isquêmico da retina.
Estes resultados podem abrir portas à identificação de novos fármacos que possam tratar ou atenuar as alterações visuais inerentes a estas doenças. “Os receptores A2A de adenosina podem vir a ser um alvo interessante para travar a perda de visão causada por doenças como o glaucoma ou a retinopatia diabética”, acrescenta a pesquisadora.
Atualmente, não há cura para estas doenças e os tratamentos disponíveis não são eficazes. Desenvolvido ao longo de três anos, o estudo foi financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e pela empresa Manuel Rui Azinhais Nabeiro.
Ciberia // ZAP