A tradução da acusação dos pais de uma menina chinesa de cinco anos, que morreu após cair do 21º andar de um edifício em Lisboa, afirma que os pais foram “condenados à pena de morte” em Portugal – país que não tem tal sentença há 200 anos.
O erro, entre vários outros, na transcrição do português para mandarim levou o advogado do casal a pedir junto do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa a nulidade da tradução da acusação do Ministério Público (MP), segundo o requerimento a que a agência Lusa teve acesso.
“Na acusação recebida pelos pais da menina na China é afirmado que eles são acusados da ‘prática de um crime de exposição ou abandono, e condenados a pena de morte’“, lê-se no requerimento assinado pelo advogado Correia de Almeida, destacando que “foi em profundo estado de desespero” que os acusados o contataram.
“A notificação provocou profundo mau estar ao casal, porque, se em Portugal não existe pena de morte, e qualquer cidadão percebe que se trata de um erro, o mesmo não acontece na República Popular da China, país onde existe a pena de morte“, acrescenta o requerimento.
Segundo o o texto, que deu entrada no tribunal nesta terça-feira (25), os acusados “desconhecem os fatos” de que são acusados, apenas sabendo “que foram condenados” a pena de morte.
“O fato levou que os acusados entrassem em estresse, adotando comportamentos que prejudicam a saúde mental, que tem se agravado gradualmente”, acrescenta o documento.
“A acusação, entre dezenas de outros erros, refere que já existiu efetivamente a sentença, a qual pune os acusados com pena de morte”, diz o requerimento.
A defesa do casal requere que a acusação seja substituída por outra, “devidamente traduzida, para que os pais da chinesa possam se inteirar devidamente e assim apresentar sua defesa”.
O início do julgamento estave marcado para 3 de maio deste ano, mas o presidente do coletivo de juízes, Pedro Nunes, explicou que a tradução do despacho de marcação das datas de julgamento só ficou concluída em 27 de abril, razão pela qual os acusados não foram notificados, além de a lei portuguesa conceder 20 dias para se pronunciarem.
O caso
Os acusados, ambos com 40 anos, respondem por crime de exposição ou abandono, agravado pelo resultado da morte da criança que, segundo o despacho ficou sozinha enquanto o casal foi para o Casino de Lisboa.
No despacho, o Juiz de Instrução Criminal (JIC) decidiu levar a julgamento Jiong Wu e Wenzheng Wu, naturais de Shangai, por considerar que, enquanto pais, violaram suas “obrigações e deveres” ao abandonarem a criança na residência, enquanto foram para o Casino de Lisboa, colocando assim em perigo a vida da filha.
Na madrugada de 19 de fevereiro de 2016, segundo a pronúncia, os acusados deixaram a menina Yixuan Wu, de cinco anos, sozinha na sua residência, presumivelmente a dormir, entre as 0h e as 3h11min, tendo ido jogar no Casino de Lisboa.
O TIC considerou que os pais da menina sabiam que era fácil a abertura da porta, que a residência se situava no 21º andar e que podia acontecer que a criança, mesmo cansada, acordasse durante o sono e, ao perceber que estava sozinha, ir em busca dos pais e não os encontrar, abrir a porta da varanda, subir nas grades e cair. O que, de fato, aconteceu.
// ZAP