Segundo a ONU, cerca de 524 milhões de indianos não têm banheiro em casa, sendo obrigados a defecar ao ar livre todos os dias. Mas, para as mulheres, há um nível de vulnerabilidade superior, devido ao risco de estupro e outros tipos de violência sexual.
Uma pesquisa da Fundação Thomson Reuters, divulgada esta semana, dá conta de que a Índia é o país mais perigoso do mundo para as mulheres, devido ao elevado risco de sofrerem violência sexual e de serem forçadas a trabalho escravo.
Mona (nome fictício) contou à BBC que evita deliberadamente beber água por ter medo de ser estuprada. “Bebo menos água do que deveria porque estimula a produção de fezes e o local que usamos para defecar está sempre cheio de rapazes. Tenho medo de ir lá.” Cada vez que se desloca a esse local, Mona vai acompanhada de outras mulheres.
Savita, que vive em uma favela urbana em Nova Deli, relata o calvário que muitas mulheres são forçadas a enfrentar diariamente. “Várias mulheres sofrem com comentários obscenos, perseguições e olhares de rapazes quando saem para defecar nessas áreas. É por isso que temos medo de ir”, explica.
As mulheres são assim forçadas a escolher entre a saúde e a segurança, fazendo com que, muitas vezes, a saúde seja a principal prejudicada. “Essas mulheres se desidratam intencionalmente, o que pode levar a sérias consequências, principalmente se houver uma onda de calor”, diz Gulrez Shah Azhar, pesquisador da RAND Corporation.
Enquanto estudava a onda de calor de 2010, na cidade de Ahmedabad, no oeste do país, Gulrez descobriu que as mulheres tinham um risco de morte muito maior do que os homens indianos.
Além disso, acredita-se que as mulheres que ficam restringidas a ambientes fechados não enfrentam risco durante uma onda de calor, mas é mentira. Em muitas casas, um ventilador de teto é a única fonte de refrigeração, que pode, porém, não ser tão confiável devido ao fornecimento inconsistente de eletricidade.
Na hora do preparo das refeições, o calor aumenta dentro de casa. O traje típico do país – o sari – também dificulta.
Temperaturas chegam aos 47ºC
Bhuni Shelukar vive em uma aldeia chamada Makhla, na região de Vidarbha, no estado de Maharashtra. Nessa área, as temperaturas são extremamente quentes e os termômetros podem mesmo chegar aos 47ºC. Bhuni e outras mulheres são obrigadas a caminhar no calor intenso para ir buscar água, que carregam em jarros nas cabeças.
“Andamos de dois a três quilômetros para conseguir água e, muitas vezes, não é suficiente. Temos que fazer várias viagens, já que só podemos carregar um pote de cada vez”, explica Bhuni. Nessa cidade, as mulheres são encarregadas das tarefas domésticas e não podem dar prioridade à sua própria saúde ou necessidades básicas.
“É difícil usar o banheiro. Temos que esperar os homens irem primeiro.” Gulrez diz que há uma espécie de cultura de silêncio que envolve questões sanitárias das mulheres que levam à morte. A longo prazo, a solução envolveria lidar com questões de igualdade e direitos das mulheres, aponta o pesquisador.
As ondas de calor no país não têm recebido a atenção necessária, e Gulrez ressalta que é importante encontrar soluções adequadas ao ambiente local. As soluções podem incluir o acesso a celulares para que as pessoas possam receber alertas de ondas de calor ou para pedir ajuda.
“Além disso, podiam ser tomadas outras medidas práticas como a pintura de telhados com tinta reflexiva branca, que proporcionaria algum alívio para quem fica dentro de casa”. Ainda assim, o acesso a um banheiro interno e a água potável continua primordial.