Presidente francês visita local da explosão e ouve apelos por mudanças por parte da população, para quem o desastre é consequência de anos de corrupção, caos público e má gestão.
O presidente da França, Emmanuel Macron, chegou nesta quinta-feira (06/08) ao Líbano e caminhou através de multidões nas ruas devastadas de Beirute. Ele prometeu ajuda após a explosão que devastou parte da cidade e ouviu gritos de protesto contra a elite política local.
Na antiga colônia francesa, Macron fez o que nenhum líder político libanês havia feito desde a explosão no porto de Beirute, que dois dias antes matou mais de 130 pessoas e feriu outras 5 mil. E, cobrando reformas políticas por parte dos governantes, se permitiu ser indagado pelos moradores de um dos bairros mais atingidos da capital.
Dezenas de pessoas cantando “revolução” e pedindo ajuda faziam força contra o cinturão de seguranças, enquanto Macron caminhava pela área de Gemmayzeh, a mais atingida pela explosão, por cerca de 45 minutos.
“Se reformas não forem realizadas, o Líbano continuará a se afundar”, disse Macron, que fora recebido no aeroporto pelo presidente libanês, Michel Aoun, mas caminhou sozinho pela região. “O que também é necessário aqui é uma mudança política. Esta explosão deve ser o início de uma nova era”.
A raiva latente contra os líderes libaneses está em alta desde a explosão, que parece ter sido causada por negligência e é amplamente vista como a manifestação mais trágica até agora da corrupção e incompetência da classe dominante.
A França há tempos procura apoiar sua antiga colônia e enviou ajuda de emergência desde a explosão. Mas, ao mesmo tempo, se uniu a outros países ocidentais em pressionar por reformas para erradicar a corrupção, cortar os gastos públicos e reduzir as enormes dívidas do Líbano.
Várias facções políticas, incluindo o grupo radical Hisbolá, apoiado pelo Irã, governam o país desde a guerra civil de 1975-1990. Quase todas as instituições públicas do país estão divididas entre essas facções, que as utilizam como capital político e para benefício de seus apoiadores.
Pouco progresso real de fato ocorre nas instituições, e tudo que requer ação conjunta muitas vezes se torna um emaranhado de conflito. Como resultado, até mesmo serviços básicos como eletricidade e coleta de lixo estão imersos em disputas políticas.
O pequeno país mediterrâneo é, além disso, assolado pelo aumento do desemprego e por uma crise financeira que dizimou a qualidade de vida de parte significativa da população.
“O povo quer que o regime caia”, gritavam os moradores para Macron. O presidente francês respondeu que proporia “um novo pacto político” e pediria a seus interlocutores, incluindo as principais autoridades libanesas, para “mudar o sistema, acabar com as divisões e combater a corrupção”.
Os prejuízos causados pela explosão foram estimados pelo governo de Beirute entre 10 e 15 bilhões de dólares. Mais de 300 mil pessoas estão desabrigadas.
O desastre também pode acelerar a epidemia de coronavírus no país, já que milhares de pessoas foram levadas para os hospitais. Dezenas de milhares tiveram que se mudar para a casa de parentes e amigos depois que suas casas foram danificadas, aumentando ainda mais os riscos de exposição ao vírus.
O ministro da Economia, Raoul Nehme, disse que o Líbano, com seu sistema bancário em crise, uma moeda em colapso e uma das maiores dívidas do mundo, tem recursos “muito limitados” para lidar com o desastre.
O presidente Michel Aoun afirmou que a explosão foi causada por 2.750 toneladas de nitrato de amônio, usado em fertilizantes e bombas, que estavam armazenados há seis anos no porto após serem confiscados. Ele prometeu investigar e responsabilizar os culpados.
O presidente francês, que teve uma breve reunião em uma sala do aeroporto com Aoun antes de partir para o porto da capital, local da explosão, disse que nos próximos dias vai coordenar a assistência logística e anunciou o envio de um avião “com uma equipe de investigação”.
“Minha mensagem é uma mensagem de fraternidade, amor e amizade da França para o Líbano, e buscamos garantir ajuda internacional ao povo libanês”, disse Macron. “Sabemos que a crise no Líbano é grande, e é política e ética, acima de tudo, e sua vítima é o povo libanês. Minha prioridade é apoiar o povo libanês”.
Macron ainda prometeu voltar ao Líbano em setembro para verificar se a ajuda francesa foi bem aplicada. Ele ainda disse que vai se esforçar para que a contribuição “não vá parar nas mãos da corrupção”.
“Minha casa em Gemmayzeh foi devastada e a primeira pessoa a me fazer uma visita é um presidente estrangeiro”, escreveu o ator Ziad Itani em suas redes sociais após a visita de Macron, dizendo ainda aos líderes libaneses: “Que vergonha!”.