“A reforma trabalhista vai gerar 6 milhões de empregos”, prometeu Henrique Meirelles (MDB), ex-ministro da Fazenda do governo de Michel Temer, em defesa das alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovadas pelo Congresso em dezembro de 2017.
No entanto, o argumento do emedebista não se tornou realidade. De acordo com estatísticas sistematizadas pelo Ministério do Trabalho, baseadas no saldo de empregos de julho, desde a aprovação da Lei 13.467/17 foram gerados apenas 50.545 postos de empregos formais.
Os dados correspondem ao período de novembro de 2017 a julho deste ano, ou seja, evidenciam o impacto da reforma nos 9 meses posteriores a sua aprovação.
Segundo o Brasil de Fato, entre dezembro de 2014 e dezembro de 2017, 2,9 milhões de empregos com carteira assinada foram fechados. Ou seja, na comparação com o período compreendido, houve uma média de 79,5 mil postos de trabalho a menos por mês.
Bárbara Vallejos, integrante do Grupo de Trabalho sobre a Reforma Trabalhista do Instituto de Economia da Unicamp, mestre em Desenvolvimento Econômico e técnica do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), relembra que o principal argumento usado em defesa da reforma era o de que a antiga legislação trabalhista atrapalhava a geração de novos trabalhos e a flexibilização da lei potencializaria o crescimento do mercado de trabalho.
“Essa é uma tese infundada. A geração de emprego dos anos 2000, com carteira assinada, foi muito expressiva e não tivemos alterações significativas nos direitos do trabalho porque havia um cenário de crescimento econômico. Esse é o [fator] determinante”, argumenta.
“O efeito dessa reforma no mercado de trabalho, do ponto de vista do nível de emprego, vai ser quase nulo. Efetivamente, analisando os dados, o que vemos é que a crítica que era feita à reforma se confirmou. Esse saldo de 50,5 mil novos postos da reforma é um saldo irrisório frente a uma força de trabalho que tem 104 milhões de pessoas. É um crescimento muito inexpressivo. Em síntese, a reforma não está ajudando a gerar mais empregos”, analisa.
A especialista ressalta ainda que, além de não impactar na criação de novos postos de trabalho, o principal problema da reforma trabalhista é o aumento de vagas de trabalho precarizadas.
No último período, foram gerados 26.300 postos intermitentes e 13.320 parciais, ou seja, 78,4% dos saldos de empregos formais criados desde novembro correspondem a esses dois tipos de contratação.
O contrato intermitente pode ou não ser provisório, mas, nessa modalidade, o trabalhador é remunerado apenas pela hora efetivamente trabalhada no mês, com a necessidade de estar à disposição do empregador, sem salário fixo. Já o contrato parcial é uma jornada fixa, porém reduzida.
“Eu já sabia”
O grupo de trabalho do qual Vallejos faz parte estuda as implicações de reformas trabalhistas parecidas com a implementada no Brasil, antes de sua aplicação. A partir dessa análise, os especialistas alertaram quais seriam as consequências.
“Quando observamos como as reformas trabalhistas impactaram o mercado de trabalho, o que ocorreu foi um movimento de substituição dos postos formais, do que seria equivalente a uma CLT, com salário fixo, por formas precárias e atípicas de contratação. Então, vão se constituindo mercados de trabalhos mais flexíveis, em que os trabalhadores tem menos previsibilidade do seu salário e evidentemente tem uma perda também de seu poder de compra”, explica a técnica do Dieese.
José Eymard Loguércio, advogado trabalhista e membro da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), concorda.
“Quem estava desempregado, permanece desempregado. Quem estava empregado, passa a estar desempregado e é recontratado por outra modalidade [contratual]. Não se aumenta postos de trabalho, simplesmente se distribui os postos que já existem. Substitui-se contratos regulares, permanentes, por contratos precários”.
A ampliação desses contratos concentrou-se em setores econômicos com maior rotatividade e menores salários, ou seja, profissões historicamente vulneráveis. Mais de 60% dos contratos intermitentes estão nos setores de Comércio ou Serviços.
As ocupações com maior saldo dessa nova modalidade de trabalho são assistente de venda, servente de obras, alimentador da linha de produção, faxineiro, vigilante e garçom. As profissões se repetem na relação de contratos parciais.
Acordos
O advogado trabalhista também destaca que os números do “desligamento por comum acordo”, criado pela reforma, também são expressivos. Foram 94,5 mil desligamentos nessa modalidade, na qual o trabalhador não acessa integralmente verbas rescisórias, nem o seguro desemprego.
“O que indica, indica porque não há como dizer que todos são assim, é que muitos desses acordos foram realizados para que as pessoas se desligassem da contratação regular e voltassem a ser contratados com outro tipo de contrato”, afirma.
O jurista critica a fala de Meirelles e aponta que o argumento de que a reforma trabalhista gera emprego não se sustenta.
“É um discurso simplesmente para conseguir apoio, portanto, discurso que não tem base empírica, não tem base de realidade. E a prova disso é o que aconteceu na prática depois desse período. Em pouquíssimo tempo, se comprova o fato de que a reforma tem por único e exclusivo objetivo, precarizar as relações e diminuir o custo da mão de obra”, enfatiza.
O impacto do desemprego e da precarização do trabalho na economia também preocupa os especialistas. Segundo Vallejos, sem poder de compra e consumo, a população não participa ativamente da movimentação econômica do país, fator que impede seu crescimento.
Ciberia // Brasil de Fato