A onda da alimentação saudável, especialmente promovida pelos compartilhamentos em redes sociais como o Instagram, criou um novo tipo de transtorno alimentar: a Ortorexia Nervosa, ou a obsessão com a qualidade dos alimentos.
Pode parecer estranho que o fato de as pessoas se preocuparem com a qualidade daquilo que comem seja um problema de saúde. Mas a ortorexia nervosa é um comportamento extremo, em que a preocupação com a alimentação saudável leva as pessoas a comerem de uma forma que acaba por prejudicar a saúde.
Esportistas, profissionais de saúde, nomeadamente da área da nutrição, artistas e figuras públicas incluem os grupos de risco deste distúrbio alimentar dos novos tempos porque procuram, tendencialmente, a alimentação ideal e o corpo perfeito.
“Obsessão pela qualidade”
Estamos a falar de “tudo o que passe da normalidade a uma obsessão, a uma preocupação excessiva“, explica à RTP1 a psicóloga Marta Martins.
A ortoroxia é a “obsessão pela qualidade do tipo de alimentos ingeridos”, explica a psicóloga, destacando que “a anorexia pode, muitas vezes, estar mascarada” por este novo tipo de problema nervoso. E em outros casos, anoréxicos em tratamento podem virar ortoréxicos.
Marta Martins realça que estas pessoas baseiam a alimentação em saladas, iogurtes e sementes, que estão na moda hoje em dia, de forma que mantêm uma dieta com uma “quantidade energética tão baixa que vai acabar por ser prejudicial” para a sua saúde.
Como sinais de alerta, a psicóloga destaca que “começa a haver uma preocupação prévia de preparação das refeições, com muita antecedência, de procurar os nutrientes, a quantidade energética de cada alimento que se vai ingerir”.
Mas os sintomas deste transtorno não são fáceis de identificar, já que muitas vezes se confundem com uma mera preocupação por uma alimentação e um estilo de vida saudáveis.
Talvez por isso, ainda não seja considerada “uma doença do comportamento alimentar, tal como a anorexia e bulimia nervosas“, explica a coordenadora da Unidade de Nutrição Clínica do Hospital Lusíadas Lisboa, Ana Rita Lopes, ao Delas.
No Manual de Diagnóstico e Estatística dos Transtornos Mentais da Associação Americana de Psiquiatria (DSM-5), a ortorexia está classificada como um “transtorno alimentar não especificado”.
A influência do Instagram
Um estudo divulgado em Março passado, apurou que o “uso mais elevado do Instagram foi associado a maiores tendências para a ortorexia nervosa” – um efeito que não se verifica em outras redes sociais, de acordo com a pesquisa.
O dado pode ter a ver com a preponderância visual do Instagram, aliada à moda atual da boa forma física e da alimentação saudável, explica à BBC o nutricionista e especialista em neurociência clínica, Miguel Toribio-Mateas.
“Esses pratos inspirados pelo Instagram, com umas folhas de espinafre, uns grãos de quinoa (que estão muito na moda), algumas sementes de romã (que são lindas), é tudo muito bonito, mas não têm nutrientes suficientes“, destaca Toribio-Mateas.
Os ortoréxicos acabam assim, por ingerir uma refeição com apenas “200 calorias, o que não é nada em termos energéticos, e sem proteínas“, acrescenta o nutricionista.
E “está tudo bem” se isso acontecer ocasionalmente, mas já se torna um problema sério quando “se recusa comer o resto da comida normal” por se achar que ela não é saudável ou que não tem qualidade, avisa Toribio-Mateas.
Consequências graves
A ortorexia nervosa pode ter consequências graves em termos de saúde, levando as pessoas a abdicarem de uma série de alimentos porque têm glúten, lacticínios, corantes e aromatizantes – há até quem deixe de comer fruta por ter açúcar.
Assim, os ortoréxicos se arriscam a sofrer de deficiências nutricionais, especialmente os que evitam cereais e derivados, carne, peixe e ovos.
Além disso, o transtorno alimentar pode causar a diminuição do ritmo cardíaco e da massa óssea e provocar maior vulnerabilidade dos ossos, acarretando ainda problemas psicológicos relacionados com a frustração contínua e sentimentos de culpa.
Estima-se que, em termos mundiais, haja 6,9% de pessoas com este transtorno alimentar, com destaque de prevalência para os países desenvolvidos e para as “classes privilegiadas”, sublinha Toribio-Mateas.
Mais ainda, nota o nutricionista, porque os “alimentos que estão na moda” são mais caros.
// ZAP
Por acaso, o correto seria comer porcaria uma vida inteira e aceitar que a coitadinha da indústria alimentar não pode sobreviver sem a nossa ignorância?! Sanidade não é obsessão. Um dia a casa cai. Finalmente.