Yingxiu, no sudoeste da China e onde um quarto de sua população morreu no terremoto de Wenchuan, é hoje uma tranquila cidade turística na qual cada habitante guarda lembranças que certamente vieram à tona neste sábado, quando se completa o 10º aniversário da tragédia.
A cidade mais próxima do epicentro do tremor de magnitude 8 na escala Richter, que deixou cerca de 90 mil mortos e desaparecidos, é, à primeira vista, um bucólico vilarejo de montanha, porta de entrada para os santuários dos ursos panda de Wolong e para o turístico vale de Jiuzhaigou, mas no seu interior restam muitas cicatrizes.
O principal símbolo são as ruínas do Instituto Xuankou, conservadas no centro da cidade como um memorial, já que nas suas salas de aula morreram dezenas de crianças que assistiam a aulas quando boa parte do local desmoronou.
Diante das ruínas do que outrora foi um dos principais edifícios de Yingxiu, onde convivem as etnias han (majoritária na China), tibetana e qiang, foi instalada a rachada estátua de um relógio parado na hora da catástrofe: 14h28 de 12 de maio de 2008.
Os visitantes prestam um minuto de silêncio em frente aos destroços da escola, fazem três reverências e deixam crisântemos amarelos junto a uma enorme estátua que homenageia os heróis mortos no terremoto.
Na escola morreu um dos três filhos de Zhou Zhenyong, que antes do tremor era uma humilde camponesa em uma aldeia próxima e hoje tem um restaurante para turistas. Ela se desfaz em sorrisos para os clientes, mas quando ouve falar do terremoto, não consegue conter as lágrimas.
“Às vezes dizia ao meu marido para irmos para outro país. Este é o lugar de nossas lembranças mais felizes, mas também das mais amargas”, contou Zhou à Agência EFE depois de mostrar fotos do filho falecido, o mais novo de três, e dos colegas de classe, cujas vidas também foram tiradas pelo terremoto.
Zhou afirmou que sua família fez muitos sacrifícios para ter esse terceiro filho – a lei do filho único impunha multas às famílias das zonas rurais com mais de duas crianças -, mas decidiu criá-lo, e agora parte dela se sente culpada.
“Hoje ele teria 21 anos”, lembrou.
O terremoto matou 2,5 mil dos 10 mil moradores de Yingxiu, e muitos dos corpos repousam em um cemitério próximo da cidade, onde nas lápides aparecem seus nomes, mas as fotos de apenas dezenas deles, todos soldados do exército.
Nem todos estão lá, já que alguns desapareceram sob escombros e deslizamentos de terra, como o avô de Bi Yaohong, uma tibetana que gerencia uma pequena pensão às margens do rio, muito perto das ruínas da colina.
“Quando ocorreu o terremoto, pensei que um caminhão tinha tombado na estrada. Minha casa e todas as dos arredores caíram”, relatou Bi, cujo avô estava naquele dia trabalhando nas obras de uma estrada e ficou soterrado.
Muitos dos camponeses de Yingxiu se transformaram em hoteleiros, com ajudas do governo, e agora vivem do turismo, que segundo Zhou não foi intenso nos últimos anos, embora recentemente os moradores tenham sido ajudados pela visita do presidente da China, Xi Jinping.
Esse acontecimento parece ter estimulado a chegada de outros, como Dou Deping, um professor de Psicologia que participa nestes dias de conferências na cidade para estudar a recuperação emocional das vítimas de desastres naturais.
“As ruínas nos lembram que os humanos temos que construir uma relação mais harmoniosa com a natureza, respeitá-la e conviver com ela”, declarou Dou, que considera que os moradores de Yingxiu “são tão fortes quanto essa natureza e souberam se recuperar após a dor”.
Ma Qianhua, um senhor de 73 anos que perdeu o pai e a casa, disse à EFE, sentado em um banco perto da ponte que leva às ruínas da escola, que prefere deixar as más lembranças para trás, sem fazer muitas homenagens.
“Por mais que os sobreviventes homenageiem os falecidos, estes não voltarão“, afirmou ele, com mais singeleza que amargura. Com pragmatismo chinês, Ma acrescentou que, uma década depois da catástrofe, se sente “feliz e com uma vida estável, graças à pensão do governo”.
// EFE