Demolindo a fama de individualistas e indiferentes da geração “milennial”, os jovens mexicanos levantaram nos últimos dias a bandeira da solidariedade em um país traumatizado pelo forte terremoto que já deixou 333 mortos e podem se transformar em um símbolo de mudança.
“Dizem que somos muito apáticos, (…) mas esta foi a oportunidade para demonstrar que, apesar de sermos jovens, vamos dar tudo pelo nosso país“, disse à Agência Efe Carlos Alberto Vázquez, recém-formado em Relações Internacionais e voluntário em um edifício que desabou com o tremor na Cidade do México.
Com um capacete, colete e botas, Carlos Alberto faz fila junto a 50 pessoas, a maioria com menos de 30 anos, para poder entrar no marco zero deste imóvel, onde se calcula que ainda haja 35 pessoas sob os escombros.
O jovem não tem conhecimento específico em obras nem em resgate, mas sim uma enorme vontade de ajudar. Já vacinado contra o tétano e com seu nome e número de telefone pintados no braço, está pronto para o que considera um dever.
Hoje Carlos Alberto continuará ajudando nos trabalhos de remoção de escombros e dividindo comida com os companheiros. Tal como fizeram centenas de milhares de jovens nos últimos dias no México, diante da que foi, provavelmente, a pior tragédia que se lembram.
Angélica Rodríguez tem 22 anos e é estudante de Direito. Está há vários dias trabalhando como voluntária. “Se eu estivesse em uma situação similar, gostaria de receber apoio”, contou a jovem, que disse estar ali “escondida”, porque seus pais não a deixam ajudar em áreas com risco de desabamento, por medo de que possa lhe acontecer algo.
O diretor-executivo da Rede pelos Direitos da Infância no México (Redim), Juan Martín Pérez, avalia muito positivamente este advento dos jovens após o terremoto de 7,1 na escala Richter que sacudiu a região central do México, especialmente sua capital, no último dia 19 de setembro.
“Foi rompida a lógica imperante. Os protagonistas e líderes estão sendo eles”, disse o especialista, que considerou que a tragédia foi o estopim de uma necessária “ruptura geracional” que pode dar mais voz aos jovens.
Entretanto, há vários perigos. Um deles é a política tentar se apropriar deste movimento que, até hoje, carece de figuras claras. “É uma liderança coletiva. Uma liderança de ‘hashtags'”, afirmou Pérez.
A maioria dos jovens concorda que as redes sociais foram determinantes para que se dispusessem a ajudar. “Estamos mais informados. A tecnologia nos apoia”, resumiu Luis Enrique Jiménez.
As redes foram nos últimos dias uma fonte inesgotável de informação, e também de rumores. Mas para o titular da Redim, os mais jovens diferenciam melhor o que é verdadeiro e o que é falso.
De fato, a hashtag #verificado19S viralizou e uma plataforma para checar os dados foi montada.
Alex nasceu 16 anos após o terremoto de 1985, que deixou milhares de mortos na Cidade do México e também aconteceu em um dia 19 de setembro.
Aquele tremor foi um divisor de águas para a população e na política. Surgiram personagens como Superbarrio Gómez, um lutador pela moradia digna encarnado pelo ativista social Marcos Rascón.
Para os jovens é como um relato que escutam em casa desde pequenos. E após o terremoto de semana passada, chegou a hora de agir. “A lembrança de 1985 levou muitos a ajudar. Ao pensar no que aconteceu às suas famílias”, comentou Álex.
“Minha mamãe está orgulhosa por eu estar contribuindo. Eu queria dar comida, mas infelizmente as condições econômicas não me permitem, mas é melhor estender a mão“, acrescentou Carlos Alberto.
Hiperconectados com as redes sociais, desconfiando da política e dos meios de comunicação tradicionais e lembrando o exemplo de solidariedade do terremoto de 1985, os jovens se apoderaram das ruas.
No entanto, não se sabe se o movimento perdurará ou se será efêmero como tantos outros fenômenos em tempos modernos.
“É cedo para saber se o novo modelo coletivo será mantido em uma identidade geracional que consiga dialogar com outras gerações e se está comprometido com a reconstrução nacional”, concluiu Pérez, que considerou que será imprescindível “criar mecanismos de participação cidadã” para que os jovens não retornem ao seu mundo digital.
Ciberia // EFE