Há um lagostim mutante que clona a si mesmo e se espalha pelo mundo

Depois de sequenciar o DNA da espécie Procambarus virginalis, popularmente conhecida como lagostim de mármore, uma equipe de cientistas de vários países concluiu que todos os indivíduos existentes hoje são descendentes de uma única fêmea criada em cativeiro.

A fêmea passou por uma mutação e começou a se reproduzir de forma assexuada, clonando a si própria. Um estudo sobre o caso foi publicado esta semana na revista Nature Ecology and Evolution.

Os clones, todos do gênero feminino, estão há três décadas produzindo filhas de si mesmas e se expandindo pelo mundo.

Frank Lyko é biólogo molecular do Centro Alemão de Pesquisa do Câncer e um dos coautores do estudo. O cientista apelidou o fenômeno de “invasão dos clones”.

E não é para menos. Hoje em dia, o lagostim de mármore é considerado uma espécie superinvasora, presente em várias zonas da Europa, África e Ásia, ameaçando ecossistemas nestes habitats, segundo a BBC.

“A origem do fenômeno, por enquanto, é desconhecida”, escreveu Lyko. O biólogo também foi responsável por descrever a espécie em 2015. Foi ele que escolheu o nome Procambarus virginalis, que em latim significa “lagostim ou caranguejo virgem“.

A primeira vez que Lyko viu um exemplar da espécie foi em 2015, quando um criador mostrou alguns animais que tinha comprado em uma feira de aquarismo na Alemanha.

Os então chamados “lagostins do Texas”, explicou Lyko, “se propagaram rapidamente no aquário. Eram grandes e esteticamente agradáveis, o que os tornou populares entre os aquaristas”.

Rapidamente, se descobriu que um único indivíduo podia produzir centenas de ovos de uma só vez. Poucos anos depois, o Procambarus virginalis já estava disponível em lojas de aquarismo em várias partes do mundo, e começaram a aparecer registros de populações selvagens, provavelmente graças à libertação por humanos.

Por enquanto, o que se sabe é que o primeiro indivíduo foi uma fêmea de cativeiro. Mas não está claro se viveu na Alemanha. Pode até ter saído dos Estados Unidos.

É que os lagostins de mármore são descendentes de animais de rio (Procambarus fallax), uma espécie endêmica do estado da Flórida, nos EUA. Mas a espécie se reproduz de forma sexuada, com macho e fêmea.

O certo é que, de alguma forma, uma fêmea de aquário sofreu uma mutação que a levou a ter três pares de cromossomos em vez de dois, como é o habitual.

Em vez de apresentar má formações que a impedissem de sobreviver, a fêmea desenvolveu a capacidade de produzir ovos, que se converteram em embriões e depois em lagostins fêmeas com os mesmos três pares de embriões. Todas eram um clone da mãe, nascidas através de um processo conhecido como partenogênese.

“Este único indivíduo fundou toda uma espécie, e agora temos milhares de milhões por todo o mundo”, disse o neurocientista Wolfgang Stein à revista National Geographic. Stein, cientista da Universidade Estadual de Illinois (EUA), participou no estudo de Lyko.

Entre 2007 e 2017, a equipe registrou a forma como a incidência do Procambarus virginalis em Madagascar aumentou dez vezes, deixando de ocorrer em uma área de mil quilômetros quadrados para ocorrer em 100 mil quilômetros.

“São encontrados em água mais ácida e mais alcalina, em água contaminada e na água limpa, e têm sempre a mesma composição genética“, diz Stein.

Os lagostins também conseguem se adaptar a diferentes condições ambientais. Por isso, a União Europeia e alguns estados dos EUA proibiram a criação e uso da espécie, em uma tentativa de controlar a propagação. Mas nem tudo é negativo na experiência com a espécie.

Segundo Lyko, o estudo do animal pode ajudar a entender melhor o câncer, inclusive os tumores desenvolvidos por humanos. Isto porque o câncer também é, ele próprio, uma mutação de células. “Estamos vendo em câmera lenta, na evolução desses animais, algo que acontece durante as primeiras etapas da formação de um tumor”, disse.

Ciberia // BBC / ZAP

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