Menos de 24 horas depois da saída dos Estados Unidos do acordo nuclear com o Irã, anunciada por Donald Trump na terça-feira (8), em Washington, países exportadores de petróleo já comemoravam lucros expressivos.
No fim da tarde desta quarta, o barril de petróleo era negociado a US$ 71,32 (aproximadamente R$ 277), valor mais alto desde novembro de 2014.
Conforme aumentam a tensão no Oriente Médio (tendo o Irã atacado Israel, que revidou) e os preços dos barris no mercado internacional, países produtores de petróleo, como o Brasil, arrecadam mais dinheiro com impostos e royalties.
Mas a notícia também traz efeitos colaterais para consumidores e empresários, que encontrarão gasolina mais cara nos postos e devem faturar menos com a venda de mercadorias e serviços, graças ao transporte mais caro.
Para o engenheiro David Zylbersztajn, diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, a alta traz alívio para municípios e estados que dependem da produção de petróleo – caso do Rio de Janeiro, cuja economia entrou em colapso com a queda na arrecadação de royalties nos últimos anos.
“Governo e estados arrecadam significativamente mais. O problema no Brasil é que se gasta mal na maioria das vezes. Quando cair o preço, os Estados entrarão em crise novamente. Não se criam condições para que a economia se reproduza. É como a mesada da tia: quando ela morre, se você não investiu ou guardou nada, vai ficar sem mesada, sem dinheiro de uma hora para a outra”, compara.
“É claro que vai impactar no preço final para os consumidores“, continua Zylbersztajn. “Ainda mais porque há dois movimentos: aumento do preço do barril com a saída dos EUA do acordo e o aumento do dólar” – que bateu recordes nas últimas semanas graças a incertezas sobre as eleições brasileiras e à chance de aumento nas taxas de juros dos EUA.
Para o professor da USP Ildo Sauer, ex-diretor da Petrobras durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, a classe média é a principal prejudicada.
“O transporte urbano e de cargas é extremamente dependente da gasolina e do diesel. (A alta) vai aumentar os custos da classe média e seu mau humor, às vésperas das eleições”, diz Sauer por telefone à BBC.
“Vazio iraniano”
Na avaliação de Luis Carvalho, analista de petróleo e gás para a América Latina do banco suíço UBS, “a Petrobras deve ser afetada positivamente” com a decisão de Trump, já que a companhia reajusta valores de combustíveis no mercado doméstico a partir da oscilação dos preços internacionais.
“O pré-sal atualmente é viável com o valor do petróleo próximo dos 35 a 40 dólares por barril. Consequentemente, com o barril próximo dos 77 dólares, a margem de lucro dessa produção será muito maior”, prevê o economista.
Analistas americanos avaliam que a principal razão da alta recorde desta quarta-feira é a incerteza sobre o futuro das exportações do petróleo iraniano – o país é um dos cinco maiores produtores do mundo e exporta atualmente mais de 2,6 milhões de barris por dia.
Quando as sanções econômicas prometidas por Trump contra o Irã entrarem em vigor, em novembro, estima-se que as exportações iranianas poderão cair entre 500 mil e 1 milhão de barris diários – voltando aos níveis anteriores ao acordo assinado em 2015 com EUA, França, Reino Unido, Alemanha, China e Rússia, quando o país era alvo de sanções americanas e europeias.
Mas quem deve ocupar o “vazio” que aparecerá após as sanções sobre exportações iranianas?
Para Dan Eberhart, especialista no mercado de energia e CEO da empresa americana de serviços petroleiros Canary LLC, o movimento do presidente americano deve estimular a produção de petroleiras dos próprios Estados Unidos.
“A OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) deve continuar com sua capacidade adicional de produção inalterada, já que a Arábia Saudita está focada nos preços das ações de sua empresa estatal de combustível. Então, qualquer oferta adicional deve cair nos ombros dos produtores americanos. Algo que tenho certeza que deve deixá-los bastante felizes”, avalia.
No entanto, para Eberhart, a popularidade doméstica de Trump também pode ser abalada com o preço do combustível em alta.
“A decisão será boa para o mercado de petróleo e gás dos EUA. Mas (Trump) não está fazendo isso por essa razão, uma vez que o preço da gasolina na bomba tem uma importância política significativa, especialmente quando entramos na temporada de viagens de verão (no hemisfério norte).”
Ciberia // BBC