Bolsonaro tenta melhorar imagem no exterior, mas volta a provocar controvérsia

(cv)

Em sua primeira reunião com correspondentes estrangeiros em Brasília, o presidente Jair Bolsonaro diz querer corrigir a imagem errada sobre ele que estaria sendo espalhada no exterior. O evento, na sexta-feira (19/07) foi agendado às pressas.

Ele dá as boas-vindas aos representantes da imprensa: abraça o correspondente da China (“nosso maior parceiro comercial”) e manda uma saudação para a chanceler federal Angela Merkel ao cumprimentar o único jornalista alemão presente.

“Entendo perfeitamente o tamanho do envenenamento que fazem do Brasil lá fora. A ideia é que vocês saibam da verdade e mostrem o que o Brasil é”, diz Bolsonaro aos correspondentes. Mas quando as primeiras perguntas são feitas, a afabilidade acaba rapidamente. Bolsonaro mergulha o olhar na mesa do café da manhã para erguê-lo poucas vezes nos próximos 60 minutos.

Quanto às crescentes críticas à política do Brasil para a Amazônia, Bolsonaro deixa sua posição clara de forma direta: “A primeira coisa que você precisa entender é que a Amazônia é do Brasil, não de vocês.”

Ele afirma que seu governo está tentando conciliar o progresso econômico e a proteção das florestas. “Gostamos de trabalhar em conjunto com todos os Estados que queiram fazer uso econômico da biodiversidade da Amazônia.” O general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, sentado à esquerda de Bolsonaro, emenda que esse é um “negócio de bilhões de dólares”.

Bolsonaro argumenta que nenhum país do mundo protege tanto as florestas quando o Brasil faz, em relação a seu tamanho. “Nenhum país do mundo tem moral para falar da Amazônia. Vocês destruíram seus ecossistemas”, afirma. O presidente brasileiro parece não se impressionar com os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) sobre o aumento dramático das taxas de desmatamento. “Esses dados, pelo nosso sentimento, não condiz (sic) com a verdade”, diz. ““Até parece que estão a serviço de alguma ONG.”

Bolsonaro também considera injustificada a crítica da política indígena de seu governo. “Vocês querem que o índio continue a viver como um homem pré-histórico, sem acesso à ciência, à tecnologia, a todas as maravilhas da modernidade”, acusa, afirmando que a maioria dos estrangeiros seria indiferente aos direitos humanos dos povos indígenas. “É um crime o que grande parte da imprensa mundial faz contra o Brasil e esses seres humanos”, diz Bolsonaro.

A crescente crítica à política agrícola do Brasil Bolsonaro vê como uma estratégia de seus oponentes numa guerra comercial mundial na qual um grande fornecedor de matérias-primas como o Brasil se encontra. Segundo ele, o Brasil usa muito menos agrotóxicos do que a maioria dos países agrícolas do mundo. Esta é, conforme o presidente, outra imagem falsa que seria espalhada sobre o Brasil. “Mais um fake news, como diz o nosso querido Donald Trump.”

Bolsonaro diz que, enquanto seus antecessores eram “fracos, antipatrióticos e corruptos”, ele agiu para baixar a criminalidade, e cita as taxas de homicídio, afirmando que caíram este ano em 20%.

A razão, diz, é que, com ele, as organizações criminosas nos presídios e das drogas estariam sendo combatidas eficientemente pela primeira vez. “Não tem ninguém do meu governo envolvido com narcotráfico”, diz Bolsonaro. Ele não menciona que recentemente um militar membro da comitiva de apoio presidencial foi flagrado na Espanha tentando contrabandear 39 quilos de cocaína.

Ele ainda contesta que o fato de que há brasileiros que passam fome. “Falar que se passa fome no Brasil é uma grande mentira. Passa-se mal, não come bem. Aí eu concordo. Agora, passar fome, não“, disse Bolsonaro.

A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) informou recentemente que cinco milhões de pessoas no Brasil sofrem com desnutrição. Mas, para Bolsonaro, a referência à fome dos brasileiros é apenas um discurso populista que seus antecessores teriam usado para transformar o Brasil em uma sociedade de beneficiários de programas assistenciais.

No mais, Bolsonaro se vende como um amigo da mídia, que ele e seus simpatizantes nas mídias sociais repetidamente atacam como uma imprensa mentirosa. “Sou completamente aberto à liberdade de imprensa livre. Ao contrário de meus antecessores”, explica. S

obre a transparência em relação à imprensa estrangeira, Bolsonaro avançou em relação que seus antecessores: os presidentes Lula e Dilma Roussef deram entrevistas a correspondentes estrangeiros somente após anos no cargo, durante seus segundos mandatos.

Por outro lado, ele dirige ataques à imprensa nacional, em especial contra a jornalista e comentarista Miriam Leitão, da TV Globo, que foi presa e torturada pelo regime militar quando tinha 19 anos e estava grávida. Aos jornalistas, Bolsonaro diz que a história da jornalista é uma mentira.

“Ela estava indo para a guerrilha do Araguaia quando foi presa em Vitória. E depois (Miriam) conta um drama todo, mentiroso, que teria sido torturada , sofreu abuso. Mentira. Mentira.“

Bolsonaro volta a ficar mais relaxado quando fala sobre as reservas de nióbio não utilizadas do Brasil, seu tema preferido. O metal especial é usado para endurecer o aço. O Brasil é o maior produtor do mundo.

Bolsonaro quer aumentar sua extração. Ele faz com que um ajudante militar em traje de gala traga um colar de nióbio que ele acaba de comprar no Japão e o mostra orgulhosamente. Então, ele fala sobre sua primeira namorada (“uma japonesa – um povo fantástico”) e sua admiração por Putin. “Tenho um profundo respeito pelo Putin“. Ele espera que a Rússia ajude a resolver a crise na Venezuela.

Repercussão

Pouco depois do café da manhã e dos comentários de Bolsonaro, a imprensa brasileira passou a contestar as falas do presidente. Muitas repercutiram mal. O comentário sobre a jornalista Miriam Leitão levou o Jornal Nacional a apontar que o presidente mentiu sobre o passado da jornalista, que nunca planejou se juntar a uma guerrilha.

O presidente ainda teve que recuar sobre o seu comentário sobre a fome no país. Ao fim de uma cerimônia no mesmo dia, ele também reconheceu que “alguns passam fome” e se irritou com novos questionamentos de jornalistas.

Além disso, um vídeo que mostra o início do encontro com os correspondentes estrangeiros acabou se espalhando pela internet. Nele, Bolsonaro, sem saber que estava sendo gravado, disse ao seu ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, que “daqueles governadores de ‘paraíba’, o pior é o do Maranhão”.

O uso da expressão pejorativa “paraíba”, que é usada no Rio de Janeiro para se referir aos nordestinos, causou nova avalanche de críticas. Na mesma fala, Bolsonaro ainda afirmou “tem que ter nada para esse cara”, em referência ao governador maranhense Flávio Dino (PCdoB).

Em resposta, governadores do Nordeste divulgaram uma carta cobrando explicações do presidente. Eles afirmaram ainda ter recebido “com espanto e profunda indignação a declaração do presidente da República transmitindo orientações de retaliação a governos estaduais, durante encontro com a imprensa internacional”.

Assim terminou o dia em que o presidente tentou lustrar sua imagem no exterior.

COMPARTILHAR

DEIXE UM COMENTÁRIO:

Como é feito o café descafeinado? A bebida é realmente livre de cafeína?

O café é uma das bebidas mais populares do mundo, e seus altos níveis de cafeína estão entre os principais motivos. É um estimulante natural e muito popular que dá energia. No entanto, algumas pessoas preferem …

“Carros elétricos não são a solução para a transição energética”, diz pesquisador

Peter Norton, autor do livro “Autonorama”, questiona marketing das montadoras e a idealização da tecnologia. Em viagem ao Brasil para o lançamento de seu livro “Autonorama: uma história sobre carros inteligentes, ilusões tecnológicas e outras trapaças …

Método baseado em imagens de satélite se mostra eficaz no mapeamento de áreas agrícolas

Modelo criado no Inpe usa dados da missão Sentinel-2 – par de satélites lançado pela Agência Espacial Europeia para o monitoramento da vegetação, solos e áreas costeiras. Resultados da pesquisa podem subsidiar políticas agroambientais Usadas frequentemente …

Como o Brasil ajudou a criar o Estado de Israel

Ao presidir sessão da Assembleia Geral da ONU que culminou no acordo pela partilha da Palestina em dois Estados, Oswaldo Aranha precisou usar experiência política para aprovar resolução. O Brasil teve um importante papel no episódio …

O que são os 'círculos de fadas', formações em zonas áridas que ainda intrigam cientistas

Os membros da tribo himba, da Namíbia, contam há várias gerações que a forte respiração de um dragão deixou marcas sobre a terra. São marcas semicirculares, onde a vegetação nunca mais cresceu. Ficou apenas a terra …

Mosquitos modificados podem reduzir casos de dengue

Mosquitos infectados com a bactéria Wolbachia podem estar associados a uma queda de 97% nas infecções de dengue em três cidade do vale de Aburra, na Colômbia, segundo o resultado de um estudo realizado pelo …

Chile, passado e presente, ainda deve às vítimas de violações de direitos humanos

50 anos após a ditadura chilena, ainda há questões de direitos humanos pendentes. No último 11 de setembro, durante a véspera do 50° aniversário do golpe de estado contra o presidente socialista Salvador Allende, milhares de …

Astrônomos da NASA revelam caraterísticas curiosas de sistema de exoplanetas

Os dados da missão do telescópio espacial Kepler continuam desvendando mistérios espaciais, com sete exoplanetas de um sistema estelar tendo órbitas diferentes dos que giram em torno do Sol. Cientistas identificaram sete planetas, todos eles suportando …

Em tempos de guerra, como lidar com o luto coletivo

As dores das guerras e de tantas tragédias chegam pelas TV, pelas janelinhas dos celulares, pela conversa do grupo, pelos gritos ou pelo silêncio diante do que é difícil assimilar e traduzir. Complicado de falar …

Pesquisa do Google pode resolver problemas complexos de matemática

O Google anunciou uma série de novidades para melhorar o uso educativo da busca por estudantes e professores. A ferramenta de pesquisa agora tem recursos nativos para resolver problemas mais complexos de matemática e física, inclusive …