O gesto de arma com a mão, usado por Jair Bolsonaro como símbolo da campanha ao Planalto, tem tomado a forma de objeto de aço e pólvora em cada vez mais lares brasileiros. No primeiro semestre deste ano, a Polícia Federal (PF) concedeu 58 mil novos registros de armas de fogo para defesa pessoal, quatro mil a mais do que em todo o ano passado.
A ampliação do acesso às armas se explica, em parte, pela maior facilidade para sua aquisição e registro, perseguida pelo atual governo federal.
A medida mais recente nesse sentido é uma instrução normativa da PF publicada na quinta-feira passada (20/08), que autoriza cada pessoa a registrar até quatro armas em seu nome e reduz a burocracia do processo.
A permissão para que cada pessoa física registrasse até quatro armas, contra duas da norma anterior, havia sido estabelecida em decreto de janeiro de 2019 de Bolsonaro, mas até a semana passada era de difícil efetivação devido à falta de regulamentação pela PF.
Com 37 páginas, a instrução normativa também facilita a obtenção do porte de arma. Ao contrário da posse, que autoriza o dono da arma a mantê-la somente dentro de sua casa, o porte permite que ele ande com a arma pelas ruas.
Os interessados no porte devem comprovar que têm “efetiva necessidade” de carregar a arma, por exercerem atividade profissional de risco ou estarem sob ameaça à integridade física. A nova regra os dispensa de apresentar documentos que justifiquem essa necessidade em caso de “fatos públicos e notórios”.
Felippe Angeli, gerente de advocacy do Instituto Sou da Paz, afirma à DW Brasil que esse item deixa uma “preocupante” margem para interpretação. “O que seria fato público e notório? Um boato, uma nota na imprensa, uma mensagem de WhatsApp?”, questiona.
“Há suspeita de interferência política na PF. O [ex-ministro da Justiça Sérgio] Moro fez essa acusação ao sair do governo, objeto de inquérito presidido pelo ministro Celso de Mello no Supremo. Esse nível de subjetividade, em um tema prioritário para o presidente, me causa preocupação”, diz.
A pesquisadora Isabel Figueiredo, membro do conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, critica outro item da nova norma. Algumas categorias do funcionalismo público, como magistrados, membros do Ministério Público e auditores fiscais, têm direito ao porte de arma. Esses servidores foram dispensados de apresentar laudos de capacidade técnica e aptidão psicológica para manusear as armas, que poderão ser atestadas pelas próprias instituições às quais pertencem.
“Já tínhamos pouca informação sobre como se avaliava a capacidade técnica e a aptidão psicológica, quem era aprovado ou reprovado. Era algo nebuloso, e agora a PF ainda abriu mão de um controle que era seu”, diz.
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