Dilma defende Diretas Já como única via de estabilidade política, econômica e social

Marcelo Camargo / Agência Brasil

A ex-presidente do Brasil, Dilma Rousseff

A ex-presidente do Brasil, Dilma Rousseff

O clamor popular por Diretas Já foi reforçado pela presidente destituída Dilma Rousseff (PT). Em conferência na noite de ontem (5), durante o 3º Salão do Livro Político da Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo, Dilma defendeu a realização de eleições como único caminho para impedir o avanço do neoliberalismo, por meio da retirada de direitos, e de suas consequências imediatas, entre elas o aprofundamento das desigualdades.

“A questão democrática é central, porque articula a questão nacional, social, do desenvolvimento econômico com geração de empregos. Não há como o Brasil ter qualquer hipótese de estabilidade econômica e política se não tiver um banho de legitimidade que só tem um caminho: a realização de eleições diretas“, disse.

Na avaliação de Dilma, o voto popular é também mecanismo para o fortalecimento da frágil democracia brasileira, que corre o risco de avançar rapidamente para um estado de exceção ampliado. Para ela, tal fragilidade é resultado do pacto firmado no processo de transição da ditadura civil-militar para o período democrático, que culminou com a eleição indireta, em 1985, de Tancredo Neves, que morreu antes de assumir o cargo.

“Ao firmar nosso pacto da transição da ditadura para a democracia, não conseguimos aprovar a proposta de emenda à Constituição para eleições diretas (emenda Dante de Oliveira). Esse pacto, que permitiu anistia para torturadores e torturados, explica o voto, naquele dia 17 de abril de 2016, pelo torturador e pela ditadura militar no Brasil. Quem não viveu tudo aquilo, só tem como saber se a sociedade se purgar. Não tem outro jeito de saber”, afirmou, enquanto era interrompida por aplausos da plateia.

Para Dilma, o voto do povo brasileiro tem de incidir sobre todo processo de repactuação democrática. “E não venham com essa história, gravíssima, de que isso aprofunda a divergência no Brasil, que não se quer sentar à mesa para resolver os problemas, que são avessos a acordos, uma gente ruim”, provocou.

“Coisas do tipo só podem ser respondidas com história em quadrinhos. Em uma do Asterix e Obelix, um centurião romano, com a perninha curta sentado em cima de um cavalo, faz a seguinte reflexão: ‘Esses gauleses são gente muito difícil’“, disse.

“A gente invade o país deles, destrói a aldeia deles, estupra as mulheres deles, mata os homens e aí passa um tempo e a gente quer conversar. Mas eles não querem conversa’. Esta é a tolice que querem nos impingir. O povo tem necessariamente de participar desse processo. Não é possível que se dê a solução em um pequeno grupo. É essencial para o processo democrático. É fundamental”, acrescentou.

Essa “transição por baixo”, como defende a presidente destituída, depende também da participação popular. Ela mencionou o caso da Argentina, que no início de maio foi palco de grande manifestação popular contra a proposta da suprema corte de abreviar a prisão de torturadores – cada ano de cumprimento da pena valeria por dois. No dia seguinte aos atos que reuniram mais de um milhão em todo o país, a corte recuou.

Ela chamou atenção também para a necessidade de discussão sobre política.

“A política torna-se então irrelevante porque não produz nada, não significa nada. E muita gente começa a achar que, porque ela é irrelevante, as soluções do salvador da pátria ou as soluções da extrema direita são aquelas que devem ser consideradas. Ou seja, passa a considerar que seus símbolos, as soluções fáceis, são aquelas que melhor atendem ao país. Quando sabemos que não resolveremos nada na calada da noite, em palácio algum”, declarou.

Salão do Livro Político

Até a próxima quinta-feira (8), o 3º Salão do Livro tem uma extensa programação, com debates sobre temas sociais e políticos mais candentes do momento no país e no mundo. A edição deste ano ainda contará com um curso sobre o livro O Capital, de Karl Marx, hoje (6), com o biógrafo Michael Heinrich.

Além das palestras e debates, também haverá a projeção de filmes, exposição de charges do cartunista Gilberto Maringoni e oficina de cartazes. Com cerca de 30 editoras, o Salão também conta com publicações sobre política, economia, sociologia, antropologia e temas relacionados.

Jordana Dias Pereira, da Fundação Perseu Abramo, diz que o evento acontece em um momento importante, em que a sociedade discute cada vez mais o cenário político.

“A gente percebe que as pessoas estão se posicionando mais. Se tem alguma coisa positiva nessa turbulência institucional é que as pessoas estão se apropriando da política. A falta de interesse popular só é interessante para o grande capital”, disse.

O encerramento do Salão do Livro Político terá uma mesa sobre perspectivas para o Brasil e contará com a participação do ex-presidente do PCdoB, Renato Rabelo, do ex-candidato presidencial, Ciro Gomes (PDT), e do presidente da Fundação Perseu Abramo, Márcio Pochmann.

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