A diretora de uma escola estadual em Guarujá, no litoral de São Paulo, foi espancada por dois jovens desconhecidos após denunciar irregularidades que, segundo ela, aconteciam na unidade.
Para ela, o ataque foi uma tentativa de intimidá-la para que a investigação não continuasse. As agressões chegaram a causar um traumatismo craniano na vítima. A polícia já está investigando o caso e um boletim de ocorrência foi registrado.
A diretora agredida mudou-se para a Baixada Santista neste ano. Em São Paulo, ela foi responsável pela escola que atingiu o maior IDEB da capital paulista. Abalada e com hematomas no rosto e no corpo, a diretora precisou ser afastada do trabalho, mas garante que voltará a unidade e vai transformar a escola em uma das melhores da cidade.
Há 29 anos dentro da rede pública de ensino, a profissional, que prefere não ser identificada, saiu da capital paulista para ser diretora da Escola Estadual Vicente de Carvalho, no Centro de Guarujá. Assim que chegou, foi muito bem recebida pelos professores e alunos. Com a chegada dela na escola, a atual gestora virou vice-diretora.
“Quando mudamos de escola temos dez dias para levantar possíveis irregularidades. Se eu não aponto, eu passo a responder por elas. Eu tenho que apresentar a documentação que comprova as possíveis irregularidades e o dirigente de ensino encaminha os procedimentos administrativos. Isso é praxe dentro da Secretaria da Educação”, explica.
Irregularidades
A nova diretora apontou três possíveis irregularidades na escola. As notas fiscais da merenda escolar de agosto constavam que os alunos tinham comido melão, abacaxi, maçã, chuchu, abobrinha e repolho, mas não havia nenhum desses alimentos na escola. “De acordo com o relato dos alunos, de maio para cá eles comeram apenas banana”, diz.
Outra irregularidade é referente ao patrimônio da escola.
O documento diz que há quatro televisões e um microscópio com lupa eletrônica, que não foram localizados. Segundo ela, há livros didáticos jogados no chão e potes onde é servida a merenda em uma parte do prédio que está interditada.
O terceiro e mais grave problema seria um possível desvio de recurso financeiro. A antiga diretora e atual vice prestou contas. Os professores, por outro lado, dizem que serviços que estão na nota fiscal não foram realizados na escola.
“Ela disse que era uma forma de pagar o contador. Alguém expedia essa nota fiscal como se o serviço estivesse sido realizado, ela pegava esse dinheiro e pagava o contador”, explica.
A atual diretora teve acesso a cheques da Associação de Pais e Mestres que estavam assinados pelo diretor executivo e pela diretora financeira e que estavam em branco. Ela repassou as irregularidades para a Diretoria de Ensino, em Santos, na última sexta-feira.
Agressão
Por volta das 14h do último sábado (1), quando foi até a escola para receber as urnas para as eleições municipais, ela foi alvo de agressões. Ela encontrou a vice-diretora e o zelador. As duas começaram a conversar na sala da direção sobre as irregularidades apontadas.
Segundo a diretora, a outra profissional negou que pegou o dinheiro público. Já a diretora afirmou que cabia a administração pública averiguar o caso.
De acordo com a polícia, nessa hora, dois jovens bateram na porta e a vice-diretora abriu. Os adolescentes, que aparentavam ter 17 anos, disseram que queriam beber água. A diretora argumentou que eles não poderiam estar ali por conta da chegada das urnas.
Além disso, perguntou como eles sabiam que a porta estava aberta, mas os adolescentes não responderam e saíram.
Em seguida, a vice-diretora perguntou se ela já tinha apresentado os cheques à Secretaria de Educação. A atual diretora disse que faria isso na segunda-feira (3).
“Ela saiu da sala e, quando voltou, entrou e foi para uma salinha que tem ao lado. Os dois garotos entraram atrás, os mesmos que tinham ido beber água”, conta.
Após isso, dupla anunciou um suposto assalto. A diretora reagiu e segurou na mão de um dos jovens quando o segundo veio para cima dela com uma baqueta de instrumento musical.
“A baqueta estava colocada em cima do guichê da secretaria. Eles começaram a me chutar, dar paulada na minha cabeça. Ela (vice-diretora) ficou assistindo. Ela ficou falando ‘polícia, é um assalto’, mas falou baixo. Eu pedindo socorro e ninguém ouvia nada. A gente ouviu uma sirene, eram as urnas chegando. Eles se evadiram”.
Mesmo com o rosto sangrando, a diretora recebeu as urnas eleitorais. Depois, fez um boletim de ocorrência na delegacia e passou pela Unidade de Pronto Atendimento (UPA). Quando chegou em casa, entrou em contato com a Secretaria de Educação para falar sobre os fatos ocorridos.
Outro lado
Após o episódio, a vice-diretora também registrou um boletim de ocorrência. Ela relatou à polícia que foi agredida no último sábado e teve o celular roubado pela dupla que invadiu a unidade.
O G1 ligou para a vice-diretora da escola. Segundo uma amiga dela, que atendeu o telefone, a profissional está de férias e viajou. Ela confirmou a versão de que a mulher havia sido agredida e que teve o celular roubado no dia da agressão na escola e, por esse motivo, seria impossível conversar com ela nos próximos dias.
Volta ao trabalho
Na segunda-feira, a diretora trabalhou na escola e fez o exame de corpo de delito no IML. “O médico do IML disse que os tipos de golpe poderiam ter me levado a óbito porque foram na cabeça com a intenção de fratura craniana e, no peito, com a intenção de parada cardíaca. Eu saí de lá apavorada, sem condições de voltar ao trabalho”, falou emocionada.
Ela diz que nunca tinha passado por isso, mesmo trabalhando em escolas na periferia em São Paulo. Segundo a diretora, é comum encontrar irregularidades administrativas, mas a Secretaria toma as providências necessárias.
“Esse é o meu papel. Só que me bateram muito, sem dizer nada e não levaram nada. Não foi um simples assalto. A minha sensação é que era para intimidar, para eu cair fora e as apurações pararem por ali. Para assustar a diretora e ela ir embora. Não levaram nada”, afirma.
Por enquanto, a diretora permanece com uma licença. Ela quer se recuperar do baque para retornar ao trabalho e mostrar o quanto pode fazer pela Educação.
“Eu vou voltar. A equipe de professores está esperando isso. A gente vai tocar o trabalho para frente. Nós vamos reorganizar aquela escola. A escola que eu venho de São Paulo foi o melhor resultado do Ideb da Capital. Isso foi fruto de um trabalho de equipe e nós não vamos fazer diferente aqui em Guarujá”, afirmou.
Investigação
Em nota, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo informou que as agressões foram registradas na Delegacia de Polícia de Guarujá e seguem em investigação para identificação dos autores.
As vítimas já prestaram depoimento e informaram as características dos agressores.
Já a Diretoria Regional de Ensino de Santos lamentou o fato e informou que presta atendimento às funcionárias da unidade de ensino.
Esclareceu, ainda, que imediatamente ao ser notificada pela direção da escola sobre possíveis irregularidades, abriu uma apuração para averiguar os fatos e tomar todas as medidas cabíveis e necessárias, como a punição aos responsáveis, caso os fatos sejam comprovados.
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