Uma nova pesquisa japonesa mostrou que uma espécie de peixe pequeno pode passar em um teste que é amplamente considerado o “padrão de ouro” da inteligência animal.
Até hoje, apenas alguns animais considerados bastante inteligentes – além de nós – haviam passado neste teste de autorreconhecimento, como grandes símios (gorilas, chimpanzés, bonobos e orangotangos), golfinhos-nariz-de-garrafa e elefantes-asiáticos.
Mas uma nova pesquisa japonesa mostrou que uma espécie de peixe pequeno pode passar em um teste que é amplamente considerado o “padrão de ouro” da inteligência animal. O estudo foi publicado em um artigo na revista científica PLOS Biology.
À luz dessa descoberta inesperada, os pesquisadores argumentam que pode ser hora de repensarmos como testamos a inteligência animal.
A equipe internacional de pesquisa liderada por Masanori Kohda, especialista em comportamento de peixes da Universidade da Cidade de Osaka (Japão), concluiu que o bodião-limpador (Labroides dimidiatus) mostra sinais de reconhecimento ao se olhar em um espelho.
O bodião, que se alimenta de parasitas que “limpa” de outros peixes, parece passar no teste do “autorreconhecimento espelhado”, há muito considerado uma marca da autoconsciência em animais.
Se isso significa que ele é autoconsciente, ou se significa que este é um teste ruim de autoconsciência, é algo que está agora em debate.
O estudo
Quando os pesquisadores colocaram um espelho nos tanques dos peixes, 7 de 10 animais o atacaram, o que significa que provavelmente viram suas reflexões como rivais. Ao longo de uma semana, no entanto, os animais atacaram o espelho cada vez menos e acabaram parando quase inteiramente.
Quando esse comportamento desapareceu, outro tomou o seu lugar: os bodiões começaram a nadar de cabeça para baixo, o que nunca havia sido observado antes em qualquer indivíduo dessa espécie. Parece que estavam inspecionando suas reflexões de uma nova maneira.
As coisas ficaram ainda mais interessantes quando os pesquisadores colocaram uma marca nas gargantas dos peixes, que eles só podiam ver no espelho.
Em vez de morder o reflexo no espelho, como um bodião-limpador faria ao limpar outro peixe, um movimento que significaria que ele não passou no teste, o animal pareceu tentar limpar a marca de sua própria garganta mergulhando no fundo do tanque.
Quando os cientistas usaram uma marca transparente ou removeram o espelho, o comportamento cessou, sugerindo que ver a marca no espelho era a dica que levava o peixe a tentar se limpar.
Os resultados provocaram polêmica entre a comunidade científica. Alguns pesquisadores veem o teste de espelho como uma medida do tipo “tudo ou nada”, que não leva em conta diferenças sutis na cognição e no comportamento animal. Só porque os peixes parecem autoconscientes, não significa que tenham um senso claro de “eu” da mesma forma que os humanos têm.
“Capacidades cognitivas complexas evoluem de baixo para cima em pequenos passos incrementais a partir de traços mais básicos compartilhados por uma ampla gama de espécies”, defendeu Frans de Waal, professor de comportamento primata da Universidade Emory, em um editorial encomendado pela revista PLOS Biology para abordar o debate.
Embora o teste possa ser uma maneira imperfeita de medir a autoconsciência, os resultados de fato indicam que os bodiões estão exibindo algum tipo de comportamento que merece estudo adicional.
Ressalvas
O teste de autorreconhecimento do espelho envolve três fases: reações sociais em direção à reflexão; comportamentos idiossincráticos repetidos em direção ao espelho; e observação frequente de sua reflexão. Conforme foi descrito pelos pesquisadores, os peixes se engajaram em todos esses comportamentos.
O que de Waal argumenta é que não está claro se os peixes estão realmente tentando se limpar por causa do que viram no espelho. Talvez eles estejam apenas se limpando reflexivamente depois de verem o que pensam ser outro indivíduo com um parasita. Afinal, o comportamento não é novo.
“A evidência mais convincente seria um comportamento único, nunca visto sem um espelho, enquanto a autolimpeza é um padrão fixo de ação em muitos peixes. Podemos precisar de um estudo aprofundado desse padrão específico antes de podermos determinar o que significa quando realizado diante de um espelho”, sugere de Waal.
Uma dificuldade deste tipo de pesquisa é que os testes que podem ser realizados em um peixe são bastante limitados.
Ao contrário da tromba de um elefante ou dos dedos de um chimpanzé, o bodião não tem um apêndice que usa para explorar seu próprio corpo. Portanto, os cientistas só podem inferir porque o peixe está tentando se limpar, enquanto um chimpanzé inspecionando seu corpo, por exemplo, é um sinal bastante claro de que ele entende o que está olhando em um espelho.
Então, será que o bodião-limpador é tão inteligente quanto um golfinho? Por enquanto, é difícil dizer. Mas está claro que os cientistas precisam descobrir uma nova maneira de avaliar a inteligência animal.
// HypeScience / Inverse