Em algum momento do mês de maio, a internet irá sofrer um pequeno “apagão” que impedirá o acesso de milhares de pessoas à rede. O evento, conhecido como Dia 768k, já é esperado há algum tempo pelas operadoras, e deverá afetar os clientes cujos provedores de internet utilizam equipamentos de rede mais antigos.
O Dia 768k é uma espécie de “sequência” ou “evolução” do evento que ficou conhecido como Dia 512k, quando em 12 de agosto de 2014 um “apagão” na internet mundial causou bilhões em prejuízo financeiro.
Essa falha geral na internet ocorreu quando os roteadores ficaram sem espaço para armazenar a tabela de roteamento BGP (protocolo de roteamento de dados utilizado pela maior parte dos roteadores do mundo). Essa tabela contém os endereços IPv4 de todas as redes de internet conhecidas no mundo, e é utilizada pelos roteadores para conectar o usuário ao site que ele deseja acessar.
O que aconteceu é que, em 2014, a maioria dos roteadores utilizava um sistema de alocação TCAM (ternary content-addressable memory, ou memória endereçável por conteúdo ternário, em tradução livre), que permitia um limite máximo de 512 mil endereços alocados (daí o nome 512k).
Assim, quando em 12 de agosto de 2014 a operadora de internet Verizon adicionou 15 mil novas rotas BGP à tabela, isso fez com que os roteadores sofressem com problema de vazamento de memória, fazendo com que eles travassem toda vez que tentassem fazer a leitura ou acessar qualquer tipo de arquivo — o que acabou afetando praticamente todos os provedores de internet do mundo.
Na época, a solução emergencial foi desenvolver patches para o firmware desses roteadores que estabeleciam um limite maior de memória máxima para armazenamento das rotas BGP, aumentando esse número para 768 mil — de onde foi tirado o nome dia 768k.
Atualmente, a melhor fonte para gerenciar o tamanho da tabela BGP é um bot do Twitter chamado BGP4-Table, criado para avisar os programadores sobre a aproximação do fatídico Dia 768k. O perfil tweeta a cada 6h com a quantidade atual de endereços alocados na tabela BGP e, de acordo com o tweet mais recente dele durante a escrita desta matéria, existem atualmente 768105 prefixos IPv4. Apesar disso, o número real é um pouco menor, já que a ferramenta não filtra endereços duplicados.
É por isso que alguns analistas especializados neste setor, como Aaron A. Glenn (engenheiro de rede na AAGICo em Berlim) e Jim Troutman (Diretor da Northern New England Neutral Internet Exchange) estimam que o Dia 768k deve acontecer em algum momento de maio, quando o número de endereços alocados deverá ultrapassar os 768 mil endereços reais (ou seja, sem duplicatas).
Apesar da preocupação, nenhum dos dois especialistas acredita que a chegada a esse marco irá causar tantos problemas quanto os ocorridos no Dia 512k. Isso porque, ao contrário de 2014, as operadoras já se prepararam para o evento.
Como já estão esperando o Dia 768k desde o apagão geral da internet em 2014, as empresas já desenvolveram diversas formas de evitar que algo do tipo aconteça novamente. Os equipamentos utilizados pelas empresas já permitem que o espaço de alocação da tabela BGP vá muito além dos 768 mil conseguidos em 2014, o que garante que aquelas empresas que atualizaram seus equipamentos depois de 2014 não deverão ter problemas.
Mas mesmo aquelas que ainda possuem equipamentos antigos que sofreriam com o limite de 768 mil espaços de alocação podem evitar facilmente o problema. Isso porque, de acordo com Troutman, esse limite só é um problema se o roteador dos servidores de uma provedora de internet estiver considerando todas as rotas existentes.
Se esses equipamentos forem configurados para ignorar qualquer coisa vinda das rotas /24 (notação CIDR usada para definir endereços IP de redes locais de grande porte, como por exemplo a Ethernet da Microsoft) e direcionem pedidos desses endereços para o roteador de outra empresa. I
sso faz com que o número de endereços existentes na tabela desses roteadores mais antigos caia para menos da metade, o que permite operarem sem problemas, deixando qualquer pedido vindo de algo com esse endereçamento para os equipamento mais novos das grandes operadoras, que já possuem espaço para um número de alocações maior do que 768 mil endereços.
Por isso, ao contrário do que aconteceu em 2014, a chegada do Dia 768k não deverá ser uma ameaça para o funcionamento da internet mundial, e apenas algumas pequenas provedoras locais que não estão atualizadas sobre o assunto deverão ficar com seus sistemas fora do ar.
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