Encontro em 22 de abril foi citado por Sergio Moro como evidência da pressão do presidente para mudar comando da PF. Supremo ordenou a entrega da íntegra do vídeo da reunião, sem cortes. Prazo esgota na sexta-feira.
A Advocacia-Geral da União (AGU) encaminhou nesta quinta-feira (07/05) um pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF) para entregar apenas parte das gravações de uma reunião ministerial que ocorreu no dia 22 de abril. O encontro foi citado pelo ex-ministro Sergio Moro como uma evidência de que o presidente Jair Bolsonaro interferiu politicamente na Polícia Federal.
Esse foi o segundo pedido de reconsideração da AGU ao STF após o ministro Celso de Mello determinar que o Planalto tem 72 horas para entregar as gravações. Na quarta-feira, o órgão já havia pedido para que o ministro revertesse a decisão, alegando que na reunião foram tratados “assuntos potencialmente sensíveis e reservados de Estado”. O prazo determinado pelo STF para que o presidente entregue a gravação acaba esta sexta-feira.
Desta vez, a AGU pede ao ministro que reconsidere “a ordem de entrega de cópia de eventuais registros audiovisuais de reunião presidencial ocorrida no dia 22 de abril de 2020, para que se restrinja apenas e tão-somente a eventuais elementos que sejam objeto do presente inquérito”. Ou seja, o governo afirma que quer entregar apenas a parte das conversas entre Moro e o presidente.
O pedido contraria Celso de Mello, que ordenou que o governo encaminhasse a íntegra do vídeo sem alterações ou edições. Mello ainda mandou que o governo preservasse “a integridade do conteúdo” da gravação e impedir “que os elementos nela contidos possam ser alterados, modificados ou, até mesmo, suprimidos”.
Diante da postura do governo, a defesa do ex-ministro Moro também acionou o STF e solicitou que Mello mantenha a ordem de entrega da íntegra das gravações.
Os advogados do ex-ministro argumentaram que mesmo que a reunião eventualmente tenha tratado de “assuntos de relevância nacional” não se pode impedir que a Justiça analise a íntegra da gravação.
“Eventuais colocações constrangedoras do Exmo. Presidente da República, passíveis de constatação durante esta reunião, sobre estes ou outros assuntos ali tratados, não são motivos aptos a impedir o atendimento da determinação de Vossa Excelência, pois não se revelam ‘segredo de Estado’ (como referido pela AGU, que estejam ligados, por exemplo, às Relações Exteriores), estes sim, uma vez detectados no exame a ser realizado por Vossa Excelência sobre os tais registros audiovisuais, passíveis de proteção através de sigilo parcial”, apontaram os advogados no documento.
A entrega do vídeo é mais um capítulo da crise provocada pela saída de Moro do governo. O caso teve início em 24 de abril, quando o ex-juiz deixou a pasta da Justiça após 16 meses turbulentos como membro do governo Bolsonaro. Ao sair, Moro acusou o presidente de interferir na chefia da Polícia Federal, corporação subordinada ao Ministério da Justiça. O estopim foi a exoneração de Maurício Valeixo da direção-geral sem o consentimento de Moro.
No lugar de Valeixo, Bolsonaro tentou nomear o delegado Alexandre Ramagem, um amigo dos filhos do presidente. A nomeação foi barrada pelo Supremo. No lugar, Bolsonaro nomeou um indicado de Ramagem, Rolando Alexandre de Souza, que imediatamente trocou a chefia da PF no Rio de Janeiro, estado que é reduto do clã do presidente e que concentra investigações de interesse do círculo de Bolsonaro.
Em depoimento à PF, Moro descreve que o presidente o pressionou para mudar o comando no Rio. “Moro, você tem 27 superintendências, eu quero apenas uma, a do Rio de Janeiro”, escreveu Bolsonaro a Moro em mensagem de WhatsApp, segundo declarou o ex-ministro em depoimento.
Moro ainda mencionou a reunião ministerial de 22 de abril em seu depoimento. O procurador-geral da República, Augusto Aras, já solicitou ao STF depoimentos de outros ministros que estiveram na reunião: Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), Augusto Heleno Ribeiro Pereira (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência) e Walter Souza Braga Netto (Casa Civil).
Na ocasião, segundo Moro, o presidente cobrou tanto a substituição do superintendente da PF no Rio e de Valeixo da chefia da PF.