O jornal Libération desta sexta-feira trata da polêmica envolvendo a intenção do governo francês de premiar trabalhadores que estão na linha de frente da luta contra o coronavírus.
“Eles valem mais do que uma medalha” é a manchete de capa do diário que afirma que é preciso rever a questão da remuneração de profissionais do setor da saúde, da limpeza pública, cuidadores de casas de repouso, caixas de supermercado e entregadores, que trabalharam sem pausa durante os dois meses de confinamento na França.
Todas as noites, às 20 horas em ponto, os franceses saem às janelas e sacadas de suas casas e apartamentos para aplaudir os trabalhadores que continuam exercendo suas atividades para que o país vença o combate contra o coronavírus. “Eles merecem apenas um agradecimento e isso é tudo?”, questiona Libération.
Tratados como “heróis” nos discursos do governo, as autoridades evocaram várias vezes a possibilidade de conceder honrarias, como medalhas ou distinções, instituir um feriado nacional em homenagem a esses trabalhadores ou “presenteá-los” com dias de folga.
Para o setor da saúde, especificamente, o governo francês prometeu um bônus que varia entre € 1.000 e 1.500. Muitos empregados já adiantaram que recusarão essa quantia, considerada insuficiente diante dos esforços de diversas categorias.
Para muitos trabalhadores, as homenagens servem para camuflar a necessidade de resolver a questão da precariedade em vários setores. As declarações públicas de agradecimento pouco convencem, por exemplo, os fucionários do setor da saúde, “exaustos após dois anos de protestos que pedem melhores condições de trabalho”, reivindicações que se intensificaram após três intensos meses de crise sanitária, afirma a matéria.
“Queremos a revalorização de nossos salários”
“Não queremos medalhas, sabemos que cumprimos nosso dever”, afirma o cardiologista do hospital Bichat, Olivier Milleron, membro do coletivo Inter-hospitais. “Queremos a revalorização de nossos salários, não queremos bônus”, reitera.
Em um manifesto publicado na quinta-feira, 150 personalidades da esquerda exigem uma melhora signiticativa e imediata dos salários. Já autoridades da direita lembram ao governo que “o trabalho deve ser bem remunerado”. Centrais sindicais fazem um apelo para uma melhor divisão das riquezas.
E o consenso entre os dois campos termina por aí, afirma Libération: “se a esquerda e os sindicatos pedem uma taxação sobre o capital, o patrimônio e os altos salários, a direita e o empresariado falam em aumento do tempo de trabalho. “As duas opções estão, por enquanto, descartadas pelo executivo“, publica o jornal.
Para encontrar uma solução, o governo pretende realizar uma grande conferência social, onde a questão dos reajustes salariais será tratada. Segundo fontes do executivo, a ideia não é aumentar a remuneração de todos, mas de trabalhar por setores e profissões.
“Será que a folha de pagamento vai ser o primeiro pilar do mundo de amanhã?”, questiona o diário em editorial. Se for o caso, é preciso, sobretudo, deixar no “mundo de antigamente” a postura do empresariado e realizar um grande debate sobre os salários, afirma o jornal.
“Essa é a melhor forma de indicar ao grupo de céticos que um novo mundo é possível. Salvo se o próprio governo não acreditar nisso“, conclui Libération.
// RFI