No mundo ocidental, a cruz suástica é sinônimo de nazismo, mas a verdade é que o símbolo existe há milhares de anos e foi usado como um amuleto da sorte. Agora, alguns tentam recuperar o seu sentido original.
Na linguagem antiga do sânscrito, suástica significa “bem-estar”. A figura foi usada por hindus, budistas e jainistas durante milhares de anos e associada à religião indiana.
Viajantes do Ocidente foram inspirados pelas suas associações positivas e começaram a usar este símbolo nos seus países. Aliás, no início do século XX, chegou a haver a moda de usar a suástica como símbolo de sorte.
A figura, que mais tarde viria a ter um simbolismo completamente oposto, foi adotada com entusiasmo na Europa em áreas como a arquitetura, publicidade e design de produtos.
“A Coca-Cola usou o símbolo. A Carlsberg também o usou nas suas garrafas de cerveja. Os escoteiros o adotaram e o Girls’ Club of America chamou à sua revista ‘Swastika’. Até mandavam distintivos da suástica para seus jovens leitores como prêmio por vender revistas”, diz o escritor e designer Steven Heller, citado pela BBC.
O ícone oriental também foi usado por unidades do Exército norte-americano durante a Primeira Guerra Mundial e era visto nos aviões da Força Aérea Britânica até 1939. No entanto, isso acabou nos anos 1930, quando o partido nazista chegou ao poder na Alemanha.
O uso nazista da suástica tem origem no trabalho de acadêmicos alemães do século XIX que traduziam antigos textos indianos e notaram semelhanças entre o alemão e o sânscrito.
Então, concluíram que indianos e alemães deveriam ter os mesmos ancestrais e imaginaram uma raça de guerreiros a quem chamaram Arianos.
Essa ideia foi utilizada por grupos nacionalistas antissemitas dentro do movimento, que se apropriaram da cruz suástica como um símbolo ariano, para espalhar entre os alemães o sentimento de que pertenciam a uma linhagem antiga.
A hakenkreuz (cruz com ganchos, em alemão) negra dentro de um círculo branco e o fundo vermelho da bandeira nazista se tornaram o emblema mais odiado do século XX, para sempre ligado às atrocidades cometidas no Terceiro Reich.
“Para os judeus, a suástica é sinônimo de medo, de repressão e de extermínio. É algo que nunca poderemos mudar. Colocar a suástica em lápides ou em sinagogas causa medo. Não deveria acontecer”, diz o sobrevivente do Holocausto Freddie Knoller, de 96 anos.
O símbolo foi proibido na Alemanha no fim da Segunda Guerra Mundial e o país tentou, sem sucesso, proibi-lo em toda a Europa no ano de 2007.
Contra o mal
A ironia é que a suástica tem uma origem mais europeia do que a maior parte das pessoas pensa. Descobertas arqueológicas já demonstraram que a cruz é muito antiga, mas que seus exemplares não são limitados à Índia.
Ela também foi usada pelos antigos gregos, pelos celtas, pelos anglo-saxões e até – em alguns dos artefatos mais antigos – no leste da Europa, do mar Báltico até aos Bálcãs.
Um bom lugar para conhecer esta história é o Museu Nacional de História da Ucrânia, em Kiev. Entre os principais tesouros do museu está uma figura pequena de marfim que mostra um pássaro fêmea. Feito da presa de um mamute, a figura foi encontrada em 1908 no assentamento paleolítico de Mezin, perto da fronteira da Ucrânia com a Rússia.
No peito do pássaro está gravado um padrão complexo de suásticas. É o padrão de suásticas mais antigo identificado no mundo: impressionantes 15 mil anos. O pássaro foi encontrado juntamente com uma série de objetos fálicos, o que dá a entender que o padrão era usado como símbolo de fertilidade.
Suásticas “solitárias” começaram a aparecer na cultura neolítica Vinca, no sudeste da Europa, há cerca de 7 mil anos, mas foi na Era do Bronze que mais se espalharam pelo continente. Na coleção do museu há também vasos de cerâmica que têm suásticas e datam de 4 mil anos atrás.
Quando os nazistas ocuparam Kiev, estavam tão convencidos de que esses vasos eram provas dos seus ancestrais arianos que os levaram para a Alemanha (acabariam por ser devolvidos à Ucrânia depois do conflito).
Na coleção grega, a suástica também aparece no ornamento da arquitetura que se tornou conhecido como padrão grego, usado em azulejos e tecidos até hoje.
Mas talvez os artefatos mais surpreendentes do museu sejam os fragmentos de tecido que sobreviveram do século 12 d.C. Acredita-se que pertenceram ao colarinho do vestido de uma princesa eslava e que foram bordados com cruzes e suásticas, para afastar o mal.
Relembrar o passado
Algumas pessoas acham que estas origens podem ajudar a devolver à suástica o sentimento positivo que outrora já teve na Europa. Um desses casos é o famoso tatuador Peter Madsen, de Copenhague, que afirma que o símbolo é um elemento da mitologia nórdica que continua atraente para muitos escandinavos.
O tatuador é um dos fundadores do “Dia de Aprender a Amar a Suástica”, que ocorreu em 13 de novembro de 2013, quando tatuadores de todo o mundo se ofereceram para tatuar suásticas de graça, para relembrar o passado multicultural do símbolo.
“A suástica é um símbolo de amor e Hitler abusou dela. Não estamos tentando trazer a hakenkreuz de volta. Isso seria impossível. E também não é algo que queremos que as pessoas esqueçam”, afirma.
“Só queremos que as pessoas saibam que a suástica aparece de muitas outras formas, e nenhuma delas foi usada para nada mau. Também queremos mostrar aos fascistas da direita que é errado usar este símbolo. Se pudermos educar o público sobre o verdadeiro significado da suástica, talvez possamos tirá-las dos fascistas“, concluiu.