O alto-comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos está determinado em fazer com que os perpetradores dos horrores cometidos contra os rohingya enfrentem a justiça, mas alerta que as acusações de genocídio podem ser muito difíceis de provar. Os rohingya são um grupo étnico que tem língua própria e pratica o islamismo em Myanmar.
Em entrevista à BBC, o alto-comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Zeid Ra’ad Al Hussein, afirma que a líder de Mianmar pode ser responsabilizada pela “limpeza étnica” contra os rohingya levada a cabo pelo exército.
O responsável diz que está determinado em fazer com que os perpetradores dos horrores cometidos contra a minoria étnica enfrentem a justiça, podendo a Nobel da Paz e agora líder do país, Aung San Suu Kyi, e o chefe das forças armadas, Gen Aung Min Hlaing, serem confrontados com acusações de genocídio no futuro.
“Dada a escala da operação militar, estas são decisões que claramente teriam que ser tomadas ao mais alto nível”, afirmou Hussein à BBC no início deste mês, em um encontro na sede da ONU em Genebra, na Suíça.
Porém, Al Hussein explica que o crime, que chama de “o crime dos crimes”, é muito difícil de provar. “Por razões óbvias, se alguém planeja cometer um genocídio não se compromete com isso no papel nem fornece instruções”, explica.
“O limiar de provas é alto. Mas não me surpreenderia se, no futuro, um tribunal apurasse isso com base no que estamos assistindo agora”, declara o alto-comissário.
Aliás, o canal britânico destaca que, até hoje, poucas foram as pessoas condenadas pelo crime de genocídio, consagrado depois do Holocausto, quando os membros da recém-fundada ONU assinaram uma convenção que definia o genocídio como “atos cometidos com a intenção de destruir um grupo em particular”.
No entanto, Al Hussein afirma que já pediu uma investigação criminal a nível internacional para analisar os ataques e que entrou em contato com Suu Kyi pedindo que acabasse com a violência quando, em fevereiro, foi publicado um relatório que documentava as atrocidades cometidas contra os rohingya.
“Pedi que fizesse estas operações militares acabarem. Apelei ao lado emocional para que fizesse todo o possível para acabar e, infelizmente, isso não aconteceu”, conta.
O responsável reconhece à BBC que o poder da líder sobre o exército é limitado, mas que, mesmo assim, acredita que Suu Kyi poderia fazer mais para defender a minoria étnica.
Além disso, o alto-comissário também a critica por não usar o termo ‘rohingya’. “Roubar deles o nome é desumano ao ponto em que se começa a acreditar que tudo é possível”.
A organização Médicos Sem Fronteiras denunciou, na semana passada, que pelo menos 6.700 rohingya morreram desde o fim de agosto na sequência desta violência.
Hoje, o Observatório dos Direitos Humanos (ODH) denunciou que outras 40 aldeias no oeste do país foram queimadas no âmbito da ofensiva militar. A organização recorreu a imagens de satélite para identificar os novos incidentes, registrados entre outubro e novembro, que elevam para 354 o número de aldeias total ou parcialmente queimadas desde o início da campanha do exército de Myanmar no dia 25 de agosto.
Mais de 650 mil rohingyas já fugiram de Myanmar para Bangladesh.
A Birmânia (antigo nome do país), onde mais de 90% da população é budista, não concede cidadania aos rohingya, uma comunidade apátrida considerada pela ONU uma das mais perseguidas do planeta.
Apesar de muitos viverem no país há gerações, os rohingya não têm acesso ao mercado de trabalho, às escolas, aos hospitais, além de enfrentarem uma série de privações.
Ciberia // ZAP