Em outubro de 1996, quando os soldados do Talibã tomaram o poder de Cabul, o grupo extremista impôs uma longa lista de interditos: mulheres estavam proibidas de ir à escola ou trabalhar, era proibido não frequentar a mesquita, cortar a barba era proibido, assistir a filmes também estava proibido, assim como jogar xadrez ou brincar de pipa, enumera Bruno Philip, correspondente do jornal francês Le Monde à época. Escutar música era outro “haram”, palavra árabe para definir o que é proibido.
De volta ao poder no Afeganistão há uma semana, os líderes Talibãs dizem à comunidade internacional que o novo governo será diferente dos anos de terror entre 1996 e 2001. Os relatos que chegam de Cabul, no entanto, contam história diferente. Em sete dias, a música foi silenciada na capital afegã.
“No momento, os combatentes do Talibã já estão reprimindo violentamente qualquer atividade musical. Eles começaram a impedir as pessoas de escutar música, e as lojas que vendem música ou instrumentos foram destruídas”, conta à RFI Ahmad Naser Sarmast, diretor do Instituto Nacional Afegão de Música.
O instituto está fechado por causa da situação de insegurança nas ruas da cidade, tomadas pelos soldados talibãs armados. “Ninguém está seguro nas ruas de Cabul”, diz Sarmast.
O etnomusicólogo teme pelo futuro da escola e de todos os artistas sob o regime do grupo extremista.
“É de cortar o coração ver todo o trabalho e o sacrifício de tantas pessoas virarem fumaça de um dia para o outro. Traz lembranças de 1996, quando os Talibãs destruíram todos os instrumentos musicais, quando os penduraram nas árvores, quando silenciaram todos os músicos. Ninguém no Afeganistão estava autorizado a tocar instrumentos. Temo que o povo afegão seja novamente amordaçado e privado de seu direito de tocar e ouvir música”, desabafa.
Instrumentos escondidos
O instituto tem 400 alunos, que agora escondem seus instrumentos. “Eles temem por sua segurança. Sabemos que os Talibãs estão indo de casa em casa, e meus alunos têm medo de que se um instrumento for encontrado na casa, eles serão punidos.”
Além de não confiar nos discursos dos líderes talibãs, Sarmast destaca que o exército do grupo é indisciplinado, e segue regras distintas.
“Eles prometeram respeitar os direitos humanos, a diversidade, as culturas. Mas quando se trata de colocar em prática estas promessas, nada acontece. E no terreno, os líderes parecem não ter nenhum controle sobre seus soldados: cada grupo armado parece ter sua própria agenda”, afirma.
Artistas buscam exílio
O receio de perseguição é compartilhado por muitos artistas. Nesta semana, a cantora Aryana Sayeed, uma das maiores estrelas do país, fugiu do Afeganistão para o Qatar.
A cantora de 36 anos era considerada um dos alvos do grupo extremista por cantar músicas sobre a liberdade e o direito das mulheres.
Aryana fazia parte do júri do programa “The Voice Afeganistão”. Ela e o marido vão se refugiar na Turquia.
// RFI