Um grupo de juristas liderados pelo ex-ministro da Justiça Miguel Reale Júnior entregou nesta terça-feira (14/09) à CPI da Pandemia um relatório de 226 páginas com possíveis crimes cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro durante a crise sanitária.
O documento deverá ser utilizado pelo senador Renan Calheiros, que é o relator da comissão, para elaborar o relatório final da CPI, no qual deverão constar sugestões à Procuradoria-Geral da República e à Câmara dos Deputados de medidas a serem adotadas contra Bolsonaro.
O relatório dos juristas, que vazou para a imprensa brasileira, acusa Bolsonaro de cometer crimes de responsabilidade (pré-requisito para um processo de impeachment), crimes comuns e também crimes contra a humanidade.
Na conclusão, os especialistas afirmam que há “fartos elementos probatórios” para demonstrar a existência de crime de responsabilidade, de crimes contra saúde pública, como os crimes de epidemia e de infração de medida sanitária preventiva, além de charlatanismo; de crime contra a paz pública, na modalidade de incitação ao crime; e de crimes contra a administração pública, neles incluídos, entre outros, estelionato e prevaricação.
O documento lista possíveis crimes contra a administração pública nas tratativas de compras de vacinas por meio de empresas intermediárias, como a Precisa Medicamentos e a Davati, e sugere aprofundar as investigações.
Os juristas também destacam possíveis crimes contra a humanidade, previstos no Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional, mencionando a falta de oxigênio hospitalar em Manaus e a falta de assistência a povos indígenas durante a pandemia.
“O comportamento do sr. presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, ao longo da pandemia constitui clara afronta aos direitos à vida e à saúde”, afirmam.
Economia acima da vida
Os especialistas afirmam que a política de Bolsonaro para o combate à pandemia se baseou na ideia da imunidade de rebanho, “colocando a preservação da economia acima da preservação da vida”, teve a assessoria de “um ministério sombra” e resultou num “desastre na saúde pública brasileira”, feito de “forma coerente e estruturada”.
O texto destaca que o presidente da República manifestou “insensível indiferença às mortes que ocorreriam, ‘pois todos vamos mesmo morrer um dia'”, e tomou “decisões planejadas de minimizar a prevenção obstaculizando o uso de máscaras; ampliando o rol de atividades essenciais não sujeitas à limitação de trabalho; participando de aglomeração em espaços fechados ou abertos e autorizando atividades em templos e escolas; propagando todos os dias a adoção de tratamento precoce não cientificamente constatado e, por vezes, prejudicial à saúde. Por fim, conspirando contra as vacinas, seja ao não adquiri-las, seja instalando no espírito da população desconfiança acerca de sua eficácia e mesmo sugerindo serem prejudiciais”.
Os juristas listam várias declarações públicas do presidente, em que ele defende o uso de cloroquina e hidroxicloroquina e o chamado “tratamento precoce”. A crise da falta de oxigênio hospitalar em Manaus, no início de 2021, é apontada como um “caso exemplar de desprezo pela vida”.
Afirmam ainda que Bolsonaro conspirou contra as medidas sanitárias adotadas pelo Ministério da Saúde, já na gestão do ministro Luiz Henrique Mandetta.
Ciberia // DW