Se há vírus no chão e na água, já seria de se esperar que houvesse também no céu. Cientistas descobriram que centenas de milhões de vírus são depositados por dia em cima da camada mais baixa da atmosfera.
A descoberta pode explicar um fenômeno curioso: como vírus quase idênticos acabam em distâncias geográficas muito grandes e ambientes variados.
De todos os micróbios no planeta, os vírus são os mais abundantes, com aproximadamente 1030 só no oceano. E claro que também já sabemos que os vírus podem estar no ar, que é um dos maiores modos de transmissão.
Anteriormente, o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) concluiu que mais de 1 quadrilhão de vírus por metro quadrado chove sobre nós todos os anos.
“Todos os dias, mais de 800 milhões de vírus são depositados por metro quadrado acima do limite da camada planetária – cerca de 25 vírus por pessoa no Canadá”, disse o virologista Curtis Suttle da Universidade da Columbia Britânica, no Canadá.
Curtis Suttle é um dos autores do estudo, publicado em janeiro na revista ISME, que, pela primeira vez, quantifica o número de vírus “varridos” para a troposfera livre acima da camada mais baixa da atmosfera – a camada de limite planetário, onde ocorre todo o clima, mas abaixo da estratosfera, onde voam os aviões.
“Há pouco mais de 20 anos começamos a encontrar vírus geneticamente semelhantes em ambientes distintos por todo o globo”, disse o virologista. “E a preponderância de vírus de longa residência que viajam pela atmosfera provavelmente explica por quê: é concebível ter um vírus que foi levado para a atmosfera em um continente e depositado em outro”.
Os mecanismos de aerossolização dos vírus – a forma como ficam no ar – não são bem compreendidos, mas estudos sugerem que, pelo menos em alguns casos, são varridos para a atmosfera misturados com poeira. Os cientistas sabem que é assim que as bactérias se dispersam, por isso faz sentido que o mesmo se aplique aos vírus.
Suttle e sua equipe queriam saber exatamente quantos vírus foram transportados para a altitude de 2.500 a 3 mil quilômetros.
Os cientistas instalaram duas plataformas de recolha acima da camada de limite planetário na Espanha, nas montanhas da Serra Nevada, um região sob a influência de um manto de poeira global.
Assim, descobriram que havia milhões de bactérias e trilhões de vírus depositados por metro quadrado a cada dia na troposfera livre. A taxa de depósito de vírus era de 9 a 461 vezes mais alta do que a taxa de depósitos das bactérias.
Isso não significa que a situação seja terrível – obviamente estamos convivendo com isso bem, e o vírus conseguir ou não sobreviver em um novo ecossistema depende do hospedeiro que encontrar.
No entanto, os vírus conseguem sobreviver ao transporte atmosférico, pelo que existe uma possibilidade de representarem algum tipo de efeito no novo ecossistema.
Os vírus não são também apenas agentes patogênicos. Provas recentes sugerem que os vírus têm um papel importante no ciclo do carbono do oceano. Além disso, existem também vírus chamados bacteriófagos que ajudam os humanos ao matar bactérias prejudiciais.
Dispersar-se na atmosfera e ficar lá por algum tempo, escreve a equipe no estudo, fornece um mecanismo de preservação da diversidade dos vírus, como um “banco de sementes”.
“Fluxos descendentes significativos de bactérias e vírus da atmosfera podem ter efeitos sobre a estrutura e função dos ecossistemas receptores. Em vez de ser uma consequência negativa, a deposição fornece um banco de sementes que deve permitir que os ecossistemas se adaptem rapidamente às mudanças ambientais”, concluíram os cientistas.
Ciberia // ZAP