O número de mulheres negras candidatas aumentou em 16% das eleições de 2014 para as de 2018 de acordo com informações do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Algumas delas têm como plataforma de luta os direitos humanos e afirmam ter outras mulheres negras da política como um exemplo e influência.
Uma delas é Mariana Janeiro (PT), candidata a deputada federal por São Paulo. Além de citar a vereadora Marielle Franco, que foi brutalmente assassinada em março deste ano, como uma mulher combativa e que é uma referência, ela também afirma que a filosofa Angela Davis é uma das principais influências em sua vida.
“Ela é um marco na defesa no direito das mulheres e das mulheres negras. Eu acho ela sensacional. Sou devota de Angela Davis”, afirma a candidata, dizendo que também passou a achar que era possível uma mulher negra entrar na política observando a diplomata Condoleezza Rice.
Apesar de estarem em espectros políticos diferentes, Mariana diz que via a ex-secretária dos Estados Unidos como “uma mulher forte” e que viu nela “uma possibilidade” de uma mulher negra estar na política.
A candidata, que é filha adotiva de pais brancos, afirma que sempre estudou muito e que sempre foi socializada como uma menina branca. Mas que ela teve muitos desajustes na escola, principalmente em relação ao seu cabelo.
Na universidade, ela diz que foi se racializando, conhecendo mais sobre feminismo e sobre feminismo negro e que tudo isso foi mostrando para ela que tudo fazia parte de um processo político.
Ela afirma que, então, começou a se interessar mais por política e foi em Jundiaí, interior de São Paulo, que ela começou a frequentar as sessões da Câmara de Vereadores, conheceu movimentos sociais e fundou um coletivo feminista.
Mariana afirma que quer vencer a corrida eleitoral, mas que quer, principalmente, construir um projeto de conscientização política de mulheres. Além disso, ela diz que “todo problema brasileiro é antes um problema de raça” e que suas propostas têm como prioridade as pautas de mulheres, da população LGBT e antirracistas.
A candidata também diz que é preciso lutar por uma lógica antipunitivista e abolicionista. “Ainda tem o estigma de que direitos humanos é pra defender bandido. O brasileiro ainda tem uma lógica muito punitivista, confunde justiça com vingança”, afirma.
Como mulher negra, Mariana diz que tem primeiro uma dificuldade logística em relação aos dois filhos, de 3 anos e meio e 8 meses, e que só com uma rede de apoio de parentes que ela consegue fazer campanha. Além disso, ela também vê as pessoas desconfiando de sua capacidade de ser uma deputada.
Isso sem contar no medo de se expor muito e correr risco de morte, como foi o caso de uma de suas inspirações. “Minhas amigas ficaram com muito medo pelo o que aconteceu com a Marielle”, conclui a candidata que também afirma que existe a dificuldade financeira para fazer com que a campanha caminhe de forma efetiva.
Lia Lopes
Lia Lopes (PSB), candidata a deputada federal por São Paulo, concorda com a colega quando o assunto é ser desacreditada nos ambientes políticos. Segundo ela, sua entrada é dificultada em determinados espaços por ser mulher, jovem e negra. Sendo assim, ela diz que é preciso se afirmar o tempo todo e falar que merece ser respeitada.
“É uma questão de reconhecimento de credibilidade. Às vezes eles acham que a gente não tem conteúdo para apresentar, mas quando a gente começa a falar e mostra que tem, isso também assusta um pouco. Acho que o empoderamento da nossa população faz com que as pessoas repensem a forma como vão agir com a gente, mas nem por isso elas deixam de ser preconceituosas”, diz Lia.
Mesmo sendo formada em Direito e Economia e tendo prestado assessoria técnica para entidades como a Organização dos Estados Americanos (OEA) e a Organização das Nações Unidas (ONU) Mulheres Brasil, ela ainda precisa provar que merece estar onde está.
Quando o assunto são mulheres inspiradoras, Lia lembra de alguns nomes de políticas negras como Benedita da Silva, Janete Pietá, Leci Brandão e Adriana Vasconcellos. “São mulheres incríveis”, diz ela,
Para Lia, o Congresso precisa discutir várias pautas que são importantes para as eleitoras. Alguns desses assuntos, segundo ela, são o Estatuto da Família, a tipificação do feminicídio, equiparação de salários entre homens e mulheres que exercem a mesma função e têm a mesma escolaridade e a questão do aborto.
“As mulheres têm direito de decidir sobre o próprio corpo. A vida delas não pode estar abaixo da lei. A lei tem que garantir o direito dessas mulheres”, afirma a candidata.
Também é importante, segundo Lia, levar a questão do genocídio da juventude negra para o parlamento. “A morte desses jovens desestrutura toda uma família”, constata. Além disso, a candidata afirma que quer falar sobre cultura de paz e buscar por maior treinamento de agentes de segurança do Estado.
Assim como Mariana, Lia também sofre com críticas sobre ela ser defensora dos direitos humanos. “As pessoas falam que é para defender bandido. São distorções por falta de conhecimento. Se as pessoas soubessem o que, de fato, faz um defensor de direitos humanos, elas olhariam de uma outra forma”, conclui.
Ciberia // Revista Fórum