Desembargadora paralisa inquérito sobre esquema de “rachadinha” em gabinete do filho do presidente até parecer da Câmara Criminal. Defesa alega que caso deve correr em Órgão Especial do TJ e não em primeira instância.
A Justiça do Rio de Janeiro suspendeu nesta quarta-feira o inquérito do Ministério Público do Rio (MP-RJ) contra o senador Flávio Bolsonaro. Ele é suspeito de ter cometido a prática conhecida como “rachadinha” – esquema de divisão de salários de funcionários – em seu gabinete à época que ele atuava como deputado na Assembleia Legislativa do estado (Alerj).
A desembargadora Suimei Cavalieri, da 3ª Câmara Criminal, atendeu a um pedido da defesa do filho do presidente Jair Bolsonaro, que alegou que as investigações deveriam ocorrer no Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e não em primeira instância, como é o caso, devido ao fato de que Flávio era deputado estadual na época das irregularidades e teria foro especial.
Com a suspensão, a decisão final sobre o caso cabe ao grupo que compõem a Câmara Criminal, que julgará o mérito da questão. Até lá, o MP-RJ deve parar o inquérito contra Flávio.
A investigação do MP-RJ começou depois de um relatório do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) – atual Unidade de Inteligência Financeira (UIF) – detectar uma movimentação atípica de 1,2 milhão de reais no período de um ano nas contas de Fabrício Queiroz, funcionário do gabinete de Flávio e amigo de Jair Bolsonaro.
A movimentação logo levantou a suspeita de que ele era o administrador de um esquema de “rachadinha”, durante o período no qual Flávio foi deputado estadual, entre 2007 e 2018. O senador é suspeito de ter cometido os crimes de peculato, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e organização criminosa.
O MP-RJ encontrou suspeitas de que o senador tenha usado recursos em espécie na compra de apartamentos com o objetivo de lavar dinheiro proveniente da “rachadinha” da Assembleia Legislativa e desconfia que os valores dos imóveis registrados por Flávio em cartórios não sejam verdadeiros.
Uma das suspeitas é que o senador tenha lavado mais de 800 mil reais com a compra de dois imóveis em Copacabana a preços abaixo do mercado. Os apartamentos foram comprados por 310 mil reais e revendidos meses depois com um lucro de 262%. Sobre o caso, Flávio disse: “Ué, eu consigo comprar mais barato e estou sendo julgado por isso?”.
O MP-RJ ainda detectou discrepâncias nas contas de uma franquia de chocolates de Flávio num shopping do Rio, apontando a suspeita que o local foi usado para lavar até 1,6 milhão de reais. A loja, segundo os promotores, também operava com volume atípico de transações em dinheiro vivo. Contas do miliciano Adriano da Nóbrega, que foi morto na Bahia, também teriam sido usadas na operação. O gabinete de Flávio empregou a mulher e a mãe do ex-PM.
Histórico
Em dezembro de 2018, Fabrício Queiroz, que trabalhou por mais de uma década como assessor e motorista do senador, se tornou publicamente o centro de uma investigação sobre Flavio, e outras 101 pessoas físicas e jurídicas.
A investigação foi iniciada em julho de 2018. Meses antes, o Coaf alertara o MP sobre movimentações atípicas na conta de Queiroz.
O compartilhamento das informações foi questionado como ilegal, e o caso ficou parado até novembro de 2019, quando o Supremo Tribunal Federal decidiu que o compartilhamento ocorreu dentro da lei. Queiroz e Jair Bolsonaro se conheceram em 1984, e ele trabalhou para Flávio entre 2007 e 2018.
O MP-RJ estima que Queiroz recebeu pelo menos 2 milhões de reais através de depósitos feitos por assessores de Flávio. Segundo o MP-RJ, os valores foram transferidos por 13 servidores do gabinete do parlamentar.
Flávio nega as acusações e afirma que está sendo vítima de perseguição.